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Durante os dois dias seguintes daquela terça-feira de caça, eles se dedicaram completamente um ao outro. Amanda evitou qualquer companhia para não perder um segundo a companhia dele. Eles construíram uma bolha na qual só eles existiam e cultivaram o relacionamento deles da mesma forma que se cuida de um recém-nascido. Amanda mergulhou numa nova rotina que foi modelando sua vida. Mesmo que não havia completado uma semana que Callum entrara na sua vida, ela não conseguia lembrar-se de como era antes dele. Ou talvez não quisesse se lembrar. Antes do rapaz tudo tinha sido monótono, tedioso; como a dieta sem sal de uma pessoa doente. Agora sua vida estava cheia de cor, sabor, e seu corpo vibrava em cada momento com uma emoção contida.

Pelas manhãs, refugiavam-se no lago. Ele ensinou-a a nadar ou espirrar água para todos os lados. Quando não estavam na água, jogavam cartas e falavam do mundo. Callum queria sempre modificar a realidade das coisas que ela lhe contava e conseguia que a mente dela girasse como um peão. Quanto mais tempo levava acordado, e sua mente se exercitava com as suas conversas, quanto mais a conhecia, mais ele a fazia rir, mais a fazia tremer com suas palavras e corar com a sua mirada. O jovem estava se tornando um homem com uma velocidade trovejante, e a experiência de viver uma vida plena o tornou ainda mais atraente, emagnético. Com Callum, o tempo voava e, ao mesmo tempo, cinco minutos ao seu lado eram mais intensos do que os dezoito anos da sua vida, antes de conhecê-lo.

Na sexta-feira a tarde estava chovendo e isso os obrigou a se esconderem na biblioteca, onde as outras não os incomodariam.

A luz que filtrava pelas vitrinas era muito mais escassa do normal naquele momento. O céu nublado com nuvens acinzentadas era o culpado de que eles tivessem acendido o fogo da lareira e de que seus livros precisarem descansar sob a luz de dois abajures da mesa grande da biblioteca.

Callum estava descansando em uma cadeira na frente dela, com a testa apoiada na mão cujo cotovelo descansava na superfície da mesa, ao lado do livro que ele estava lendo com interesse. Amanda tentou, por sua vez, concentrar-se em seu próprio romance. Mas sua mente não era mais livre, era escrava viciada na substância que estava a poucos centímetros dela. Apesar da sua determinação em manter os olhos na linha do livro que tinha relido cinco vezes, eles insistiam em viajar para o rosto do rapaz, sua bela mão masculina dobrada sobre a mesa e os fios macios de cabelo que ela ainda lembrava-se da textura.

Callum a surpreendeu olhando-o em várias ocasiões, e Amanda só pode ficar corada e voltou a fingir que estava lendo. O fogo em suas bochechas, quando seus olhos se encontravam no silêncio da sala, era pesado demais para poder manter seu olhar. Seus olhos azuis ficavam dolorosamente mais lindos quando a luz do fogo ou o próprio sol os atingiam.

— O que você está lendo? Ela perguntou, fingindo curiosidade na terceira vez que ele a descobriu observando-o. Na verdade, sua curiosidade era genuína. O jovem era uma fonte constante de novidades para ela. Apesar de pertencer à mesma espécie, pôde perceber as diferenças no seu comportamento, suas preferências de conversação e sua forma de resolver à vida. Não era melhor nem pior que a companhia de uma jovem, mas certamente era diferente; e depois de dezoito anos em Crawley, tudo o que ela desejava era ter algo diferente.

Callum estava sempre disposto a analisar e comentar sobre os mecanismos de tudo o que ele encontrava, mas não parava muito tempo para se aprofundar em questões abstratas como ela e suas amigas faziam.

Ele não podia evitar distinguir que, quando estava conversando, pendia a desarticular e simplificar a realidade, ficando com o mais simples e essencial para seus argumentos. Conversar com uma mulher, ao contrário, significava incluir pequenos detalhes na realidade que a distorciam e a complicavam pelo simples prazer de fazê-lo.

— Esta ilustração sobre métodos antigos de tortura. —Ele respondeu com entusiasmo, levantando o livro pela ponta.

As páginas amarelas mostravam grotescos desenhos medievais de pessoas que sofriam com diferentes tipos de castigos, às vezes com dispositivos estranhos, em outros, com objetos do cotidiano que poderiam ter sido encontrados naquela mesma sala.

Um anjo na CasaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora