O Tempo

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 Dizem que o tempo cura tudo. O tempo não cura nada, ele adormece. Tira do centro aquilo que dói por um curto espaço de tempo, nada mais e se for para curar, já é uma boa hora, pensou Tina desolada, lembrando da velha citação que em um dia lera no livro de um dos filhos.

Desde a última vez que vira as meninas, Betina havia se ausentado. Precisava desse tempo para reordenar os pensamentos, as decisões que viriam a serem tomadas. Ela se escondeu. Evitava falar com Valéria, Rita, Amélia e em especial D. Menina, que descobrira se chamar Maria.

Mas mesmo escondida, as pessoas a procuravam. O que queriam com ela? Porque não me deixam em paz? O que ouvira sobre sua mãe desde criança fora por água abaixo naquela noite. Não houve doença nenhuma, ela foi levada. Por quem e por que? Ela não sabia responder a uma dessas perguntas. Por quem, ela ouvira na noite; pela VERDADE. Me poupe!

Estava difícil. As coisas estavam se complicando. Ela precisava de dinheiro, o marido a abandonara dias antes, por outra moça da cidade. Além da cabeça cheia de coisas medonhas, ainda tinha que aguentar os pesares e olhares de pena das pessoas. Eu tenho que ir embora desse lugar. Os filhos precisam dela e ela precisa de trabalho. Definitivamente, estava em um impasse.


Era 21h quando bateram à porta. Lúcia Valéria costurava um saia de cores variadas sob a luz da sala. O vento que adentrava pela janela trazia o aroma cítrico do pé de limão plantado ao lado da casa. D. Menina já dormia e afim de não ver a mãe acordar, largou o tecido e foi atender a porta.

— Val? — A voz chamou. Lúcia reconheceu ser Rita.

Valéria retirou o ferrolho e a porta rangeu. Rita trazia nas mãos um depósito.

— Rita, aconteceu alguma coisa?

— Não. Só trouxe isso para você. — Ergueu a vasilha e, retirando a tampa, mostrou duas tapiocas.

— Oxe! Bateu aqui a essa hora para me trazer tapioca? — Lúcia sorriu ao ato da amiga.

— Vai me deixar aqui no tempo, ou vou poder entrar?

— É claro, entre, entre.

As duas seguiram para a sala. Rita se postou ao lado da cadeira da amiga, fitando o trabalho inacabado da costura.

— Vou trazer café pra nós. Não vou comer essas tapiocas sozinha.

— Quero uma xícara bem cheia.

O tempo parecia não passar na casa de Valéria. Duas lavadeira que há dias não se viam tiraram um momento para conversarem sobre tudo. É incrível como tanta coisa pode ser acumulada em tão pouco espaço de tempo.

O café da xícara já havia acabado e a tapioca também. Rita ajudava Valéria em um conserto, aguardando o momento propício para revelar o que de fato fora fazer naquela casa.

— Tem notícias da Tina? — Lúcia indagou, enfiando a agulha no buraco para fechar o nó.

— Tenho ido ao rio sozinha. Ás vezes passo pela casa dela, mas sempre vejo as portas fechadas. Os meninos tem saído pouco para brincar na rua. Sendo sincera, Val, estou preocupada com ela.

Valéria relaxou as mãos, colocando o trabalho sobre as pernas.

— Ainda está sendo difícil para eu entender toda essa maluquice, Rita. Mamãe tem tentado me explicar, mas toda vez que paro para ouvi-la minha cabeça vagueia, como se eu a colocasse em um banco de réu.

AS LAVADEIRASWhere stories live. Discover now