I

374 48 39
                                    

Já passa da meia noite quando você termina de organizar a casa após retornar da viagem de férias em sua antiga cidade natal, tendo deixado seu quarto por último, você desce as escadas aos pulos. A animação por conta de toda a faxina ainda vibrando em cada parte do seu corpo. Seu estômago, entretanto, está revirando em nós porque, outra vez, você se distraiu com tarefas simples e esqueceu de comer no horário certo. Mas você voltou de férias e ainda está relaxada o suficiente para apenas ligar pra algum restaurante e pedir comida.

Você dança em seu caminho até a bancada da cozinha e se estica sobre ela para alcançar o telefone quando se dá conta de uma balbúrdia de vozes sussurradas. O som faz com que você se vire para as portas que dão para o quintal e, para sua surpresa, silhuetas disformes aparecem na sombra da luz do jardim, movendo-se devagar. Você não consegue distinguir uma palavra da outra, mas o tom delas parece irritadiço, talvez até um pouco sarcástico.

Não há nada a perder, você pensa, andando até a janela e afastando a cortina apenas o suficiente para que seu rosto ficasse visível. Uma risada quase escapa da sua garganta. Cinco marmanjos vestidos a caráter até demais pra uma partida de Airsoft se esgueiram pelo seu gramado negligenciado, pisoteando as pequenas flores e ervas daninhas que tomavam conta. Só que as armas não são de pressão, e você se dá conta quando enxerga um deles cheio de explosivos presos ao colete, quando seu nariz captura o cheiro de pólvora e sangue. Eles não estão fingindo.

Em um segundo, cinco pares de olhos se voltam para você, surpresos por terem sido pegos no flagra. E você destranca a porta e a desliza, dando um passo para fora da varanda. Os homens estão imóveis, um deles, contudo, ergue a mão para um coldre na cintura. Você espreme os olhos.

— Não engajem contato com a civil, continuem firmes no caminho. Vamos chegar ao ponto de extração pela manhã — um deles sussurra.

— Vocês estão chapados? — Você pergunta, apontando para o que usava uma máscara bizarra de caveira, segurando o riso mas ainda assim um pouco nervosa.

O mesmo te encara, claramente intrigado, talvez por sua falta de medo e até pelo leve tom de deboche em suas palavras. Normalmente não seria essa a pergunta de alguém que flagrou um grupo de homens altamente armados invadindo seu quintal. No mínimo ele esperava que você já estivesse chamando a polícia ou acionando o botão de pânico de algum sistema caro de segurança. Entretanto, lá estava você, de regata, calcinha e meias, sem qualquer vergonha de sua condição.

— Não.

A resposta é curta, seca, e faz surgir um vinco entre suas sobrancelhas. Seu rosto se retorce em confusão e até um leve assombro, se é que ele pode deduzir algo a esse ponto. Um minuto silencioso se passa até você finalmente abrir a boca outra vez.

— Eu estou chapada?

Mais uma vez, o grupo a encara, perplexo.

— Não?

— Certo.... Eu deveria desligar as luzes, voltar pra dentro e fingir que isso tudo foi coisa da minha cabeça?

— Ótima ideia.

Você acena com a cabeça, aceitando a afirmação, pronta para apagar o que acabara de acontecer da sua memória. Mas seus olhos capturam o rastro de sangue manchando as pétalas brancas pontilhando o gramado antes que possa desligar as luzes e deixar que eles sigam seu caminho. Você não sabe exatamente o que se passa na sua cabeça para acatar a impulsividade fazendo seu coração martelar dentro do peito, mas se pega voltando para fora, encarando as costas deles. Todos parecem cansados, e um ou mais definitivamente estão feridos.

— Vocês precisam de uma enfermeira?

Novamente, todos os cinco param e voltam a atenção para você, parecendo tão pequena na soleira da porta, com uma expressão genuinamente preocupada torcendo as feições delicadas. Eles trocam olhares por um momento, cochicham uns com os outros, e o de máscara de caveira se aproxima.

You've reached the end of published parts.

⏰ Last updated: Feb 23, 2023 ⏰

Add this story to your Library to get notified about new parts!

𝐃𝐄𝐕𝐄𝐑𝐄𝐒 𝐂Í𝐕𝐈𝐂𝐎𝐒, Simon Ghost RileyWhere stories live. Discover now