Capítulo 1

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Penelope estava cansada de desencaixotar coisas. Na verdade, ela estava muito cansada. Tinha vinte e sete anos, mas sentia como se tivesse quarenta às vezes. Ela encarou a filha que estava com os cabelos vermelhos brilhantes escapando do rabo de cavalo que ela tinha feito mais cedo. Ela estava investida tirando utensílios de cozinha de uma caixa com uma determinação e um cuidado que uma criança de cinco anos não deveria ter. Penelope suspirou. Sabia que a Agatha estava sofrendo com a sua separação de James. Na verdade, ela também estava. Esperava Agatha dormir para que pudesse chorar, mas desconfiava que sua pequena já tenha escutado uma vez ou outra. Mas essa era a segunda chance delas. Chega de tentar colocar outras pessoas em suas vidas. Penelope já tinha entendido que sua vida seria só as duas e tudo bem. A traição das duas pessoas mais importantes da sua vida ainda doía, mas enquanto tivesse a Agatha, ela ficaria bem. Aubrey Hall era uma cidade pequena e pacata e sua filha poderia brincar na rua. Seu salário em Nova York mal dava para pagar as contas, ela tinha um apartamento minúsculo de um quarto e a creche que Ágatha frequentava estava sob investigação por maus tratos. Aqui, em Aubrey Hall, seu salário como merendeira da escola primária era o suficiente para uma casinha de dois quartos com um pequeno jardim! Um jardim! Poderia tentar instalar um balanço na pequena varanda. Era verdade que a fachada amarela precisava de uma pintura, mas ela daria um jeito naquilo. Agatha estava animada com a ideia de ter um quarto só para ela, e amanhã elas iriam comprar uma tinta.  A filha vinha falando de um quarto azul com margaridas na parede e elas fariam isso. Era um lugar onde Agatha iria crescer. Seu coração apertou diante do sonho bobo que havia construído com James. Que eles seriam uma família. Que ele seria o pai da sua filha, e que no futuro eles teriam mais filhos e poderiam ter vida assim, talvez se mudassem para os subúrbios de Nova York e teriam uma casa com cerca branca. Seu sonho americano. Mas agora ele estaria construindo esse futuro com sua ex-melhor amiga Carie, a madrinha de sua filha.
— Mamãe eu terminei essa caixa. Onde vamos colocar esse tanto de coisa? — Agatha perguntou séria. Sempre resiliente. Sempre pronta para a próxima tarefa.
— A mamãe precisa lavar isso antes de guardar, meu amor.
— Então a senhora lava e eu seco?
— Quer saber… — Penelope se levantou. — Acho que eu e você trabalhamos duro a tarde inteira e merecemos um descanso. E se nos déssemos uma volta pela vizinhança para procurar uma sorveteria? — Agatha levantou de vez e limpou a mão em seu macacão.
— Vamos! Podemos também ir num parquinho?
— Podemos procurar um. Vai calçar seus sapatos, eu vou procurar minha bolsa.
Penelope precisou vender o carro que tinha para arcar com as despesas da mudança então ela deu a mão a sua filha e ambas saíram caminhando. Foram cumprimentadas por uns três vizinhos e ela observou que tudo era tranquilo. Por ser fim do verão, tinha crianças mais velhas brincando na rua, andando de bicicletas e Agatha começou a falar animadamente sobre começar a escola. Em tese, ela deveria esperar mais um ano, as crianças iam para o jardim de infância aos seis, mas sua menina já sabia ler e escrever o básico. Não sabia exatamente quando ela tinha aprendido, um dia James estava lendo para ela antes de dormir e Agatha corrigiu uma palavra que ele leu errado. Pequena gênia, era como ele a chamava.
Vamos lá, Penelope. Já faz mais de três meses. Você precisa seguir em frente. Ela suspirou.
— Mamãe, você acha que eu vou fazer muitos amigos? — ganha perguntou enquanto elas seguiam pela calçada.
— Tenho certeza que sim, meu amor. Quem não ia querer ser seu amigo?
— E você acha que minha professora vai gostar de mim? Eu falo que sei ler? O que eu vou aprender na escola? Lá tem muitos livros?
Penelope sorriu enquanto sua filha fazia cerca de dez perguntas por minuto. Ela iria de ônibus? Elas iriam juntas? Sua mãe passaria o recreio com ela? Penelope parou uma senhora na rua e perguntou se havia alguma sorveteria por perto. Então  a senhora mostrou que havia, de fato, uma sorveteria duas ruas dali, e ficava de frente para um praça cujo parquinho infantil estava repleto de crianças. Penelope sugeriu  a filha que elas tomassem  sorvete e depois fossem para o parque, mas Agatha estava ansiosa, então Penelope comprou duas casquinhas: chocolate para ela e morango para filha. Não entendia de onde vinha a obsessão de Agatha com sorvete de morango, ela particularmente odiava, mas sua filha sempre escolhia esse. Então ela caminhou até um banco e sentou, avisando à esquerda que estaria ali e Agatha foi para os brinquedos, o sorvete escorrendo da mão. Penelope observou que havia poucas mães no lugar para a quantidade de crianças brincando e se perguntou se Aubrey Hall era o tipo de cidade que as crianças corriam soltas. Ela ainda não estava preparada para aquilo. Havia uma moça sentada na ponta do banco que escolheu. Ela era magra e tinha os cabelos presos em um rabo de cavalo, e talvez fosse uma das mulheres mais bonitas que Penelope já tinha visto. Ela mexia no celular mas volta e meia levantava o olhar para algum lugar com um certo suspiro. Penelope deixou de observar a moça pra ver Agatha oferecendo seu sorvete para um menininho de cabelos castanhos e sorriu. Sua filha era uma ótima menina. A melhor de todas. Volto a observar Aubrey Hall. Ela havia vindo aqui apenas uma vez, na palestra da universidade Rokesby, talvez um semestre antes de engravidar. Ela não se lembrava muito bem da cidade. Sabia que estava sempre cheia de jovens, por conta do campus, mas não tinha andado pelo lugar além do lago perto de onde se hospedou. Queria levar Agatha lá, depois que se acomodassem melhor. Ao redor da praça, que tinha um coreto, estavam vários pequenos comércios. Penelope pode ver uma lanchonete, um mercadinho, uma loja de ferramentas e imediatamente ela se sentiu em Stars Hollow. Um episódio de Gilmore Girls. E sorriu. Afinal tinha sido isso que havia feito ela se mudar pra América.
— Todos os comércios da cidade ficam aqui? — Ela falou para si mesma. — Que prático.
— A maioria. — A moça de cabelos castanhos a respondeu. — Tem a fábrica de biscoitos na saída da cidade, e dois restaurantes na rua de trás. Isso se você não considerar as cafeterias perto do campus. Aliás, o único lugar que você irá encontrar um Starbucks.
— É muito longe? — Penelope perguntou.
— Não, uns quinze minutos de carro. — A moça respondeu. — Nova aqui?
— Sim. Acabei de me mudar com minha filha, mas fiz os acordos do trabalho pelo telefone.
— Vocês são britânicas? — A moça se virou para ela.
— Eu sou, minha filha nasceu em Nova York. — Ela ofereceu a mão — Sou Penelope. Penelope Featherington.
— Prazer Penelope. Sou Francesca. Francesca Bridgerton.
— Bridgerton? Como nos biscoitos? — Francesca riu.
— Exatamente. É a fabrica da minha família.
— Agatha ama seus biscoitos. — Ela sorriu.
— Agatha é a sua filha?
— Sim, ela é…— Então elas escutaram crianças gritando e uma pequena comoção no parquinho. Os mais velhos estavam ao redor falando alto e Penelope achou ter escutado a palavra briga. Então Francesca se levantou do banco ao mesmo tempo que ela. As duas foram se onde as crianças estavam, um círculo em volta da confusão e Penelope soltou um espasmo ao ver sua filha brigando com um garoto. Aliás, era mais uma briga generalizada. Agatha estava sentada em um menino, uma garotinha de cabelos cacheados puxava Agatha e batia nela enquanto o menininho que ela havia visto sua filha oferecer um sorvete chorava e tentava afastar a menina de sua filha.
— Agatha Featherington! — Penelope falou e as crianças soltarem um "uuuh". Ela foi até  a filha e a tirou de cima do menino. — O que diabos aconteceu?
— Ela estava batendo no meu irmão! — A garota de cabelos cacheados respondeu, ajudando o menino que sua filha estava brigando a levantar.
— Porque seu irmão é um idiota! — Agatha respondeu e se virou para mãe — Ele estava chamando o Mike de maricas e então empurrou ele e o Mike caiu e ai eu empurrei ele e então ele puxou meu pé e eu caí…
— Não importa quem começou a briga, nós não resolvemos as coisas com os punhos. Não foi isso que eu te ensinei. Agora peça desculpas.
— Mãe, eu não vou…
— Agatha você bateu no menino — Ela se abaixou para falar com a filha. — Não importa quão chateada nós estejamos, não podemos bater nos outros sempre que eles nos irritam.
— Mas ele empurrou o Mike!
— É verdade. — Ela escutou o menino de cabelos castanhos e olhos âmbar falar. E ao lado dele estava Francesca. Ela olhava preocupada para o menino depois encarou feio os dois irmãos.
— Mesmo assim. Vamos filha, você sabe que não é certo brigar. — Agatha revirou os olhos e baixou os ombros.
— Desculpa. — Ela falou. — Mas eu não gosto de vocês. — Penelope suspirou. Era o máximo que arrancaria da filha. Então a pegou pela mão e a levou até o banco, onde sentou a menina. Ela encarou Agatha. Assim como Penelope, a filha era pequena e tinha cabelos ruivos. E uma certa tendência a ter bochechas gordinhas. Mas o restante de seu rosto era diferente. Seus olhos eram acinzentados, seu sorriso travesso. Ela gostaria de lembrar direito do pai da filha. Coisas além do fato dele ter o cabelo escuro e talvez beijasse bem. Algo que a filha pudesse comparar a si mesma quando crescesse. Ela suspirou e abriu a bolsa, pegando lenços umedecidos e começou a limpar a filha. Além de um joelho ralado, ela não tinha machucados aparentes. Uma parte dela se sentiu orgulho pela filha ter ganhado a briga, mas logo repreendeu a si mesma.
— Mamãe, você está muito chateado comigo? — Penelope levantou os olhos e viu que o rostinho dela estava preocupado e seus olhos começavam a marejar. Agatha não estava chorando quando estava brigando com o menino. Mas a perspectiva de que Penelope estivesse se chateado…
— Não meu amor, é claro que não. Você entende que não pode bater nos outros, não entende?
— Mas não é justo o que o Oliver estava fazendo!
— Eu sei, meu amor. Mas na próxima vez você chama um adulto para resolver, e não resolve empurrando seu coleguinha.
As duas se viraram ao ver Francesca se aproximar com o menininho que causou a confusão, Mike.
— Parece que eu te devo um muito obrigada, Agatha. Por ter defendido meu filho. — Francesca falou para sua filha com um sorriso no rosto. — Mike, como se diz?
— Obrigado. Por me ajudar. E por ter decido a porrada no Oliver! Ninguém nunca bateu nele! Você é demais! Quer ver minhas figurinhas de beisebol? — Agatha olhou para mãe que concordou com um aceno e ela pulou do banco e foi até Mike que se sentou no degrau da calçada e tirou figurinhas do bolso. Francesca suspirou e olhou para ela.
— O Mike tem dificuldade de fazer amigos. Eu tento trazer ele aqui há quase um ano, mas ele nunca se deu muito bem com as outras crianças. Ele gostou de sua filha.
— A Agatha parece ter gostado dele também.— Mas Penelope ficou preocupada. Nunca tinha visto a filha apresentar comportamento violento antes. Francesca pareceu ler sua expressão.
— Os gêmeos Crane são encrenqueiros. A mãe deles sofreu um acidente uns dois anos atrás e ficou em estado vegetativo desde então, uma tragédia. O pai deles não os controla. Não sei se por pena ou por não saber o que fazer, mas eles estão sempre se metendo em confusão e brigando com as outras crianças. Não seja muito dura com a Agatha. — Penelope respirou fundo.
— É difícil ser pai solteiro. Eu sei bem disso. Se com uma criança eu já acho que vou enlouquecer e que estou fazendo tudo errado, não posso imaginar como deve ser criar dois. — Francesca olhou para ela com simpatia.
— Eu entendo. Também crio o Mike sozinha. Bem, eu tenho ajuda, é claro. Minha mãe e minhas irmãs estão sempre a um telefonema de distância. — Penelope se perguntou como seria ter isso. O apoio de sua família. — Mas o pai dele foi embora assim que eu engravidei.
— Sinto muito. — Penelope falou verdadeiramente.
— O pai de Agatha é presente? — Ela fez uma careta. Nunca sabia como responder aquele tipo de pergunta. E temia que sua filha começaria a fazer as mesma em breve, ainda mais agora que ela não tinha mais o James.
— Não. Ele… A Aggie é meio que uma produção independente. — Era o melhor que ela conseguiria sem se expor demais ara uma estranha.
— Ah sim, que legal. E corajoso da sua parte.
Então ela viu um homem se aproximando, segurando a mão dos irmãos que estavam envolvidos na confusão. Ele era alto, loiro e não deveria ser muito mais velho que Penelope. Sua feição não era exatamente triste. Mas também era feliz também. Ele parou.
— Francesca, olá. Quanto tempo.
— Oi Phillip. — Ela sorriu. — Essa é Penelope.
— A mãe da garotinha? — Ele deu um passo à frente e estendeu a mão. — Phillip Crane.
— Penelope Featherington.
— Amanda e Oliver gostariam de se desculpar. — Ele cutucou as crianças, que encaravam o chão envergonhadas e murmuram desculpas sem levantarmos olhos.
— Bom, não é para gente que vocês deve desculpas, não é mesmo? — Francesca falou em um tom amigável  que Penelope,particularmente, achou assustador. — Agatha, Mike! — Francesca falou um pouco mais alto para as crianças que estava um ouço a frente, na grama, olhando figurinhas.— Venham aqui por favor.
Os dois vieram, obedientemente e Penelope percebeu que a filha tinha grama no cabelo.
Eles pararam, encarando os gêmeos. Mike abaixou a cabeça e deu um passo para trás. Agatha levantou o queixo e deu um passo para frente. Phillip encarou os filhos.
— Pai… — A garotinha de cabelos cacheados e olhos verdes, iguais aos do pai, começou a protestar mas ele apenas a olhou sério e ela suspirou.
— Desculpa. Não deveria ter chamado você de cabeça de fósforo. Ou ele de maricas. — Phillip cutucou o menino.
— Desculpa. — Então ele olhou pra Agatha. — Eu não devo bater em meninas.
— E? — Agatha respondeu cruzando os braços e Penelope se perguntou quando sua filha havia se transformado numa pequena guerreira. Ela nunca tinha recebido reclamações da creche, mas também, agora sabia que eles não eram lá muito cuidadosos naquele lugar.
— Desculpa ter te chamado de maricas. — Ele olhou para o pai esperado uma afirmação e o pai balançou a cabeça.
— E para selar a paz e o começo de uma nova amizade, que tal sorvete? Por minha conta.
As crianças pularam, mas Penelope respondeu.
— Agatha, você já tomou sorvete hoje.
— Por favor mãe, por favor, so uma bolinha. Uma bolinha bem pequenininha.
E de repente, as quatro crianças que estiveram brigando a menos de vinte minutos atrás se uniram contra ela com olhos pidões e “por favor, por favor!”
— Está bem, está bem. — Penelope se levantou e pegu a bolsa e Francesca a acompanhou. Phillip encarou as crianças e virou para elas.
— Peço que não levem meus filhos a mal. Tem sido… difícil para eles. E boa parte é minha culpa. Não sei substituir a mãe deles. Sinto que não faço nada direito.
Penelope o olhou com simpatia e até mesmo Francesca desfez a armadura.
— Você sabe que pode contar com todos dessa cidade, sempre que precisar. Estamos aqui por vocês. — Ele sorriu e Penelope sorriu de volta.
— Você é nova aqui? — Ele perguntou a ela.
— Sim, acabei de me mudar. Eu e minha filha pugilista ali. — Phillip sorriu.
— Sua filha é linda. Seja bem-vinda a Aubrey Hall. Espero que goste daqui. Somos uma comunidade pequena mais bem unida. Se precisar de algo ligado a plantas, eu sou a pessoa para te ajudar.
— Phillip tem uma Linda fazenda. — Francesca sorriu. — Eu sou a gerente da lanchonete Ledger, bem ali. — Ela apontou.
— Na verdade, eu adoraria algumas informações. — Penelope se sentou numa mesa, acompanhada dos países dos mais novos amigos de sua filha, tirou um bloquinho do bolso e começou a entender como funcionava a cidade e onde poderia obter o que ela precisava.
No fim daquele dia, Phillip deu uma carona para ela e Agatha e ainda Penélope conseguiu o telefone dele e de Francesca que falaram que ela podia ligar ou mandar mensagem caso precisasse de algo. Encarou a pequena sala com cozinha conjugada e levou Agatha para o banho, depois pos a filha para dormir. Ela sorriu ao ver a filha dormindo em um quarto ainda repleto de caixas. Aquele seria um ótimo recomeço para ela. E quem sabe, não seriam mais felizes ali.

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