‧₊˚ onze.

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Henrique.

Eu não sei dizer com exatidão o que aconteceu logo após. A partir do momento em que eu ouvi meu irmão mencionar que Gabrieli havia sofrido um acidente de carro, a minha mente se desligou por completo daquele ambiente; de qualquer resquício de som ou de movimento, afinal minha única preocupação era minha namorada.

Eu não sei se eu cheguei a mencionar algo a ele, ou a moça que me acompanhava; apenas sei que em um minuto eu estava desabafando sobre o meu relacionamento para uma completa estranha, e no momento seguinte eu estava a caminho do aeroporto, tentando desesperadamente comprar uma passagem de última hora para Palmas, ainda que parecesse impossível.

Durante o início do trajeto, Junim se manteve quieto. Ele não precisava de ter nada para que eu soubesse exatamente onde ele pretendia chegar; aquele era um tratamento de silêncio que eu havia feito por merecer, porém, não saber sobre o estado de saúde de Gabrieli naquele momento começou a me perturbar e, inquieto, eu comecei a questionar o meu irmão:

一 Você sabe alguma coisa dela?

Junim, ao meu lado no banco do táxi, manteve sua vista voltada para o exterior enquanto suspirava. Meu irmão não estava nada contente.

Agora você se preocupa com ela? 一 ele deduziu.

Eu comecei a me sentir mal pelo seu tratamento. Eu podia não estar sendo melhor namorado do mundo para Gabrieli, mas eu também não merecia ser tratado como se eu não me importasse como bem-estar da minha namorada. Junim, ao contrário, parecia não sentir remorso pelo tom usado para falar comigo.

一 É claro que eu me preocupo com ela, 'Nim'.

一 É engraçado que hoje mais cedo eu 'tava' te falando sobre você respeitar as inseguranças da sua namorada e você não deu a mínima, não é mesmo?

Me flagrei observando o motorista. Eu não sabia se ele estava atento a conversa, mas suspeitava que não era possível não ouvir, e que ele certamente deveria ter julgamentos sobre mim naquele momento.

一 São circunstâncias diferentes. 一 tentei argumentar, mas é óbvio que eu não estava certo e que Junim jamais me daria razão. Nós havíamos discutido no telefone horas antes por um motivo idiota. Será mesmo que a diferença era grande como eu supunha?

一 Olha, 'véi'... 一 Junim se virou para o meu lado, a contragosto, e se viu na obrigação de me dizer: 一 A última coisa que eu vou fazer nesse momento é discutir com um bêbado. Se você quer saber como a sua namorada tá, você vai pegar a porra daquele avião ir para Palmas no primeiro voo que você achar.

一 Você acha que eu 'tô' fazendo o quê? 一 questionei, levemente incomodado com a sua postura, enquanto erguia os ombros, em um reflexo.

一 Eu não sei de mais nada sobre você, Henrique. Tudo o que eu achava que eu sabia sobre o meu próprio irmão parece ter virado uma mentira, de uma hora 'pra' outra.

Me encolhi contra o banco. Eu não tinha nenhum argumento altura para refutar as palavras do meu irmão. Talvez, porque não houvesse, de fato. Aquela não era a primeira vez que eu ouvia de alguém próximo a mim que eu estava me tornando uma pessoa irreconhecível, mas ouvir isso da pessoa que mais me conhecia no mundo fez com que eu me questionasse se ele estava sendo sincero ou apenas aumentando a situação por estar bravo.

Eu nunca quis mudar de uma forma repentina. Eu só acho que, aquela mudança para Goiânia, somada a agenda de shows lotados todo final de semana, estava criando em mim uma percepção de mundo diferente da que eu tinha na época em que eu era apenas um cara que nunca havia conhecido nada além do Tocantins. Se a minha percepção de mundo estava errada? Na minha cabeça, até aquele momento, não, mas foi aquele choque de realidade proporcionado pelo meu irmão que começou a me fazer entender que talvez eu estivesse, sim, errado 一 e talvez eu precisasse urgentemente baixar a guardar e mudar a postura.

(Im)perfeitos | Ricelly HenriqueOnde histórias criam vida. Descubra agora