Chemins Tracés

202 24 22
                                    

Àquela altura, o barulho das vozes, dos passos apressados das pessoas e das palmilhas das sapatilhas batendo com força no chão de madeira não incomodava Anahi. Ela aprendera a submergir em seu mundo quando tudo ao redor parecia um caos. No Bolshói, ela dividia o camarim com outras bailarinas, que iam e vinham como um flash dentro do quadrado não tão minúsculo assim - perto de outros camarins que Anahi já havia visto -. Ela incrivelmente já estava pronta e, mais incrível ainda, havia conseguido um lugar para se sentar em frente ao espelho cheio de luzes que ocupava quase a parede toda. Estava de olhos fechados, inspirando e expirando calmamente enquanto suas colegas se perdiam e se encontravam entre meias, maquiagens, acessórios e penteados. De tão concentrada, não ouviu a porta abrir e bater. Só se deu conta que alguém havia entrado quando a voz que fazia seu coração acelerar a trouxe de volta à realidade.

- Meu reino por seus pensamentos.

Anahi soube que Alfonso estava parado atrás dela quando o cheiro de rosas vermelhas a atingiu. Ela abriu os olhos, se deparando com o verde encantador do olhar dele perfurando-a. Em uma das mãos, ele carregava o já tradicional buquê que dava a ela antes de toda estreia.

- Estava pensando na massagem em meus pés que meu namorado certamente dará quando eu tirar essas sapatilhas apertadas. - Ela fez um biquinho, o olhar implorando como o de um bebê querendo o colo de sua mãe.

- Não seja injusta. Não serão apenas seus pés. - Alfonso abaixou atrás dela, a boca bem próxima ao ouvido - Todo seu corpo terá atenção especial, querida. - Depositou um beijo molhado abaixo da orelha dela, assistindo-a se arrepiar com suas palavras. Ele se ergueu, oferecendo o buquê a ela.

- São pra você.

Se alguém se sentia constrangido com aquela interação romântica em pleno camarim, ninguém demonstrou. As bailarinas estavam preocupadas demais em terminar de se arrumar.

Anahi ergueu as sobrancelhas para ele, o rosto sério antes de apanhar o buquê.

- Se não fosse, você estaria em problemas - Ele riu enquanto levou as rosas ao nariz, inspirando o perfume agradável - Obrigada. - Ela sorriu para ele. Aquele sorriso que mostrava não somente boa parte dos seus dentes, mas também um pouco da gengiva. Aquele sorriso que fazia Alfonso achar que o mundo era, afinal, um bom lugar.

Ela estava linda. Toda de branco em uma maquiagem leve, que ressaltava a intensidade do seu olhar. Os cabelos, já grandes o suficiente para serem domados em um coque, estavam perfeitamente alinhados com uma tiara decorada com padras. Alfonso não resistiu, se inclinou novamente e ergueu o rosto dela delicadamente pelo queixo. O beijo comportado selava a promessa de que, mais tarde, eles realmente teriam mais. Anahi confirmou a promessa através do brilho travesso nos olhos dele.

- Boa sorte, amor. Brilhe.

- Eu sempre brilho. - Se fez.

O sorriso brincalhão foi morrendo aos poucos ao notar que Alfonso segurava ainda uma rosa solitária. Era cor de rosa, aquela. Diferente das dela.

- O que é isso?

Alfonso acompanhou o olhar dela.

- Ah, é para Azul. Para desejar sorte também.

- Alfonso...- Ela suspirou.

- Ei, não se preocupe, é apenas um gesto de carinho. Só isso.

Ela negou com o rosto.

- Eu sei, conheço você. Mas você sabe, isso pode dar margem para outras interpretações. E não é dela que estou falando. Pode metê-la em problemas, Alfonso.

A voz dela era baixa o suficiente para somente ele escutar. O maxilar de Alfonso endureceu, ele sabia que ela tinha razão.

- Não se preocupe. Vou ao camarim dela de qualquer forma para averiguar se ela já está pronta. Se ela estiver sozinha, eu entrego. Se não, deixo pra lá.

You've reached the end of published parts.

⏰ Last updated: Jul 14, 2023 ⏰

Add this story to your Library to get notified about new parts!

Le Vol Du PapillonWhere stories live. Discover now