Ramo

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Honestamente não sei dizer estar mais surpresa pela quantidade de comida servida, ou por ela ser realmente deliciosa apesar de estar no dito mundo dos mortos.

Nem o olhar intenso de Hades em cima de mim tirava a vontade de continuar comendo, enquanto isso ele mal parecia ter tocado em seu prato.

O único som era o dos meus talheres, de resto o que nos rodeava era silêncio. Tão constrangedor que eventualmente precisei me forçar a iniciar uma conversa, mesmo quando não é uma ação do meu feitio.

— Seu palácio é muito bonito — limpei a boca e apoiei as mãos sobre o colo.

Hades olhou para mim, feição séria e completamente livre de sentimentos — Eu sei.

Então minha pequena chance de levantar o constrangimento se foi, lavada por um grande balde de água fria. Desiludida por não conseguir criar uma boa atmosfera, apesar do meu esforço, deixei escapar outros sentimentos, aqueles que deviam ficar selados na boca.

— Você não tem muitos amigos não é?

Imediatamente levantei as mãos para o rosto, tapando os mesmos lábios descontrolados que cuspiram as palavras antes de eu pensar seu significado. O medo que subiu a espinha foi descomunal, congelei no mesmo instante com os olhos arregalados, não apenas pelo absurdo cometido, mas pela emoção que enfim vestiu o rosto do deus.

Indiferença. Depois disso, algo que pareceu um suspiro.

— Sou um deus, não preciso de amigos, preciso de adoradores e fazer bem o trabalho me incumbido.

— Parece uma vida solitária — comentei um pouco mais segura por não ter sido repreendida.

— Depende do ponto de vista — sua mão ficou apoiada na mesa, a haste da taça de vinho entre os dedos —, existe diferença entre isolamento, infelicidade e o simples gosto por ficar sozinho. Além disso, com todos os espectros e almas por aqui, dificilmente posso dizer estar só.

Não pude deixar que um riso escapasse. Todo aquele momento foi agradável, Hades tinhas respostas sinceras e bruscas. Porém, não o tornava essencialmente ruim, apenas alguém sem filtro e facilmente mal-interpretado. Quando perguntei sobre o submundo no geral, se propôs a responder todas as minhas perguntas.

Independente das respostas atravessadas, certo momento ou outro me peguei olhando para Hades, sua presença era confortante e conhecida. Algo, no fundo da minha mente, pulsa acusando boas lembranças esquecidas.

— Me desculpe — parei o assunto repentinamente —, mas existe a chance de termos nos conhecido antes? Em outra vida?

Hades me acompanhou por parte do caminho, com a explicação de que eu poderia me perder novamente. Ele parou os passos e se virou para mim, os olhos intensos fixos nos meus, as pequenas curvas de seu cabelo pendendo para frente quando se inclinou.

— Provavelmente eu me lembraria, então penso ser pouco provável — seu rosto de aproximou ainda mais. Seus dedos frios se levantaram para colocar alguns cabelos atrás da minha orelha e em seguida escorregaram pela lateral do meu rosto segurando meu queixo em seguida.

— Se tivesse, nunca a teria deixado partir. Tenho a impressão que faria da minha vida eterna muito mais agradável — ele se afastou —, os espectros vão a acompanhar a partir daqui.

Os dois estiveram na minha companhia durante o dia voltaram a se aproximar, guiando o resto dos passos de volta para os aposentos e então se foram. No centro do submundo, a bola que se fazia de sol pareceu trocar sua luz, de radiante para um azul pálido de reflexo prateado, indicando a noite que começa.

Kishi Kaisei - (Sakusa!Hades x Leitora)Onde histórias criam vida. Descubra agora