III | Confissão, Adeus e Descoberta

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Verão de 1912

As irmãs Saidi ainda estavam muitíssimo impactadas e sensíveis

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As irmãs Saidi ainda estavam muitíssimo impactadas e sensíveis. Aparentava não haver melhor instante para revelações e despedidas como aquelas - contudo, também parecia não haver momento mais inesperado para escritos como aqueles.

Elas estavam sentadas na varanda da casa, em frente a porta principal esperando muito ansiosamente duas confidentes virarem a esquina. Porém, passara uma eternidade desde que aguardavam-nas, ao menos era o que acreditavam.

Elas, finalmente, apareceram! A reunião secreta estava para começar.

Malika era melhor amiga de Salete, jovem de 15, muito risonha, com saltitantes cachos ensolarados e olhos noturnos. Já Odete, melhor amiga de Marjorie, 2 anos mais velha, clara como leite, mas de cabelos incendiários.

"Vocês estão bem?", perguntou Mali, preocupada, ao descer da bicicleta.

As Saidi pareciam chorosas, lacrimejantes.

"Hmmm?", foi o murmúrio enfático de Odete.
"Só um pouco surpresas... A reunião de hoje fugiu um tantinho do que esperávamos. Já explico", respondeu Anelise.

As garotas subiram uma escadinha que levava a uma grande casinha da árvore. Lugar que despertava nostalgia e boas lembranças às irmãs, construído pelo pai anos antes. Nada mais conveniente para aquelas conversas haveria.

As mais crescidas, sentadas, roçavam as cabeças no telhado.

"Então?", disse Odete.
"A curiosidade matou o gato", brincou Delf.
"Nosso pai deu-nos esta carta, mamãe a escreveu no ano em que a mataram, meses antes" - Lise ouvi as amigas engolirem em seco, a olhar o amarelado envelope - "Como imaginávamos, ela já sabia."
"Vou ler...", disse Marj, arfando.

Sua voz aveludada era adequada. Mas no meio do texto pegou-se gaguejando. Salete retomou - sua voz assemelhava-se muito a de Chiara.

Soraia, província de Karam, Caelestis*
Flavo Rosis*, rua Raja, bairro Layla Poiret (nossa casa)
7 de julho de 1905

Filhinhas!,

Esta não é uma carta feliz, mas é a única despedida tardia que posso lhes oferecer. Se vocês estão lendo-a é porque, como eu prevejo, fui morta quando vocês ainda eram muito jovens e ingênuas para que pudessem compreender.
Queridas, preciso lhes contar uns segredinhos. No passado, em minha juventude, mas não tantos anos atrás, fiz um curso de Magia, Poções e Feitiços, sempre fui muito interessada em magia, como vocês já sabem. O problema é que um dos meus mentores passou a perseguir-me um tempo após o fim do curso. O segredo é que: eu fiz parte de uma associação secreta contra mau uso de magia, nós localizávamos pessoas que utilizaram magia para cometer crimes e as denunciávamos anonimamente.
Descobrimos que meu antigo professor era um criminoso, meu grupo ficou perplexo, porém não hesitou. Mas ele percebeu que o tínhamos desmascarado e que corria risco de não poder manter sua vida dupla, sendo professor de feitiçaria. Antes que o acusássemos, ele mudou-se de nome e fugiu para o interior, escapando da polícia. Porém, jurou vingar-se de nossa associação, matando cada um dos integrantes - o que ameaça a minha pessoa.
Escrevo esta carta pois pressinto que ele está próximo de vangloriar-se com o meu fim - nada posso fazer que não arrisque também as vidas de vocês e de Romeo - e, somente, posso aceitar minha sina. Pedirei ao pai de vocês que, quando chegar a hora, lhes entregue esta carta.
Após a lerem e descobrirem a verdade, nada contem ao seu pai. Para ele, já deixei uma outra carta, esclarecendo e despedindo-me. No entanto, pedi que ele a lesse ao menos 3 anos depois de entregar esta a vocês. Romeo não sabe que sou perseguida, mesmo sabendo de minha associação secreta. Eu conheço meu marido e, o amo, sei que se eu morrer por essa razão ele não superará brevemente, na verdade, levará uma vida. Creio que ele não superou ainda, contudo atenderá meu pedido para que não leia a carta das filhas nem a própria prematuramente.
Por favor, só digam a ele que eu o amo muitíssimo e que vocês sabem que eu não gostaria de vê-lo triste porque eu cedo parti. Digam também que ele cuidou muito zelosamente de vocês sozinho; Eu sei que ele fez um maravilhoso trabalho.
Bem, aproxima-se o fim de minha carta, de minha verdade, de meu adeus. Primeiramente, minhas meninas, Lise, Marj, Sali e Delf, nunca, jamais, por nada nesse mundo, esqueçam meu eterno e imenso amor por vocês; por favor, não sofram pela minha morte, superem o luto.
Muitíssimo obrigada por serem as bênçãos que são, pelo carinho e amor, por serem minhas filhas. Outra coisa, não esqueçam que para tudo é necessário um pouco de imaginação e perseverança, não desistam de seus sonhos. Não assustem-se por a coragem vir com uma dose de medo e humildade, nunca seremos corajosos se não enfrentarmos nossos temores. Se precisarem, sejam ousadas, sejam fiéis a si mesmas. E, o principal: bondade, gentileza e compaixão são essenciais.
Adeus. Até o dia em que nos encontraremos. Vos amo!

De sua eterna amiga e mãe,
Chiara Leone Saidi.

"Deus!, estou chorando e a mãe nem é minha", falou Odete.
"Eu também!", confessou Malika.
"E nós estamos chorando pela segunda vez!", disse Marj.
"E difícil não chorar!", com seriedade e melancolia, afirmou Delfim.
"É...", foi o coro das garotas.

Depois de discutirem um tanto mais o conteúdo da carta, falaram da grande ajuda que Romeo deu - sem ao menos perceber.

"Papai conseguiu várias edições antigas das colunas policiais d'O Brado para gente, não é...", falou Sali.
"Ele nunca superou a mamãe", afirmou Lise em algum momento, ao olhar angustiadamente o vívido verde pela janela.

Romeo era fundador e diretor de um dos mais notáveis jornais do país naquela época, "O Brado de Soraia", extremamente crítico e militante no âmbito político, mas que tudo noticiava e opinava.

"Há tantos casos misteriosos anteriores e mais recentes em que ele parece estar envolvido. Bizarro!", contou Marjorie.
"Quero mais detalhes depois", disse Malika.
"Além disso, o melhor: acreditamos tê-lo localizado! Ele está morando aqui na cidade", animou-se Lise.
"Sério!? Parabéns!", exclamou Odete.
"Sim, só que afastado, na região sudoeste de Soraia", completou Salete.

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1000 palavras.

Por ElaWhere stories live. Discover now