capítulo 3

4 1 1
                                    

                                            III

  

  Decidi me levantar da cama, ou pelo menos tentar. Não estava mais tão fraca, ainda a dor de cabeça insistia em me incomodar. A manhã estava fria, acho que o inverno havia chegado.

  Quando eu era pequena, amava o inverno. Era como ter a paz em uma estação, adorava ficar em roda dos serviçais na cozinha (o lugar mais aquecido do castelo), era divertido até ir na floresta, era mais quieto. Sempre fui sozinha até os meus 13 anos, quando vi aquele garoto correndo com uma espada de madeira e um tapa olho, cheguei mais perto dele, ele feito bobo se assustou. Foi engraçado. 

 -Tudo bem com você? se machucou?- perguntei para o menino. Ele me olhou meio tímido e respondeu.

-Isso não foi nada, eu já caí em alto-mar quando viajei com meu pai 

-Você não tem medo? - perguntei

-Um pirata não pode ter medo, eu sou muito corajoso, alias meu nome é Lucky Sinclair. E o seu? 

-Você é um pirata?- falei, completamente surpresa com aquela informação

-Sou sim, você tem medo? Não precisa, eu sou do bem . Qual seu nome? - insistiu na pergunta

-Meu nome é Helena Queiroga a prin..

-Princesa! você é a princesa, nossa. Como é viver no castelo? É legal?

-Pra mim é normal, nasci ali e vou morrer ali. Às vezes é tedioso, daí venho pra cá .

-Bom, eu moro no navio, viajamos muito, mas sempre paramos nessas terras. Quantos anos você tem, Helena?

-Tenho treze, e você?

-Também.

 Nesse momento ouvi a voz de um dos guardas me chamando, me despedi de Lucky. Prometemos nos encontrar outras vezes. E assim foi feito. Até que amizade se tornou mais do que apenas amizade.

 Quando desci para o café, August já estava lá.

-Chegou cartas para você- Ele disse sem erguer seus olhos em minha direção. Não entendi o porquê de tal tratamento. Talvez uma noite mal dormida.

-Onde elas estão - Perguntei sem me esforçar em olhar para ele 

-Aqui…-E me jogou três envelopes abertos.

-As cartas são de Lucky , acho que ele não te esqueceu 

 Nós ficamos lá, nos olhando quando ele simplesmente pegou e saiu sem dizer mais nada, e eu, eu estava paralisada e em choque

 Não sei o que estava escrito nas cartas, nem o que se passava na cabeça de August

 

                                         º º º º

 Logo após o café subi para o meu quarto, fiquei encarando aquelas três cartas, não sabia se devia ler… óbvio que devia, mas e se isso mudar o que sinto por August? E se eu tomei a decisão errada em me casar com August?

 Pensei em queimar as cartas… uma ideia estúpida. Passei um tempo só olhando aquelas cartas, imaginando e pensando sobre tudo… Tudo que aconteceu antes dele ir viajar, antes de eu ficar noiva. As promessas.

 Tudo era passado e repassado em minha mente, eu ainda o amava… Eu estava confusa, não sei o que faço. Será que depois que eu ler devo enviar alguma resposta?

 Enfim, peguei uma de suas cartas em minha mão, só de ver o traço de sua letra me dava vontade de chorar, me fez lembrar o tempo em que eu saia escondido do castelo  para encontrá-lo.

 Decidi então ler as cartas, iria ler tudo de uma vez, pra acabar com o sofrimento e a angústia logo.


                               

                       º º º º

 A primeira carta dizia:

 Querida Helena, sei que faz algum tempo desde a última vez, só quero que você saiba que ainda te amo e nada ou ninguém vai me fazer esquecer de você. Sei que  essas horas você já deve estar casada, mas  sinceramente isso não importa. Não muda nada o que eu sinto… Você foi e é a minha bússola. Enquanto você existir, saberei o caminho de casa. Por que você, Helena, é meu lar.

                           Com carinho Lucky

 

                     º º º º

   Minha querida Helena, estou escrevendo essa carta para falar que o azul do mar me lembra constantemente  os azuis dos seus olhos, e confesso que é torturante  lembrar deles. Lembrar de todas as vezes que me lançava aquele olhar de apaixonada. Olhar o azul do mar, do céu ao amanhecer, é lembrar de você. Estive por muito tempo lutando contra a saudade que sentia, mas você está em tudo que vejo, no azul do mar, no azul do céu, e o anoitecer me lembra de seus cabelos negros. Tudo por onde ando me lembra de você. Digo sem medo, é impossível para mim te esquecer, Helena.

                                    Com carinho Lucky



                       º º º º

 Querida Helena, nunca pensei em dizer muita coisa, meias palavras me bastavam. Até perceber que meias palavras não eram o suficiente  pra descrever você. Mas tudo que consigo dizer até então são apenas meias palavras, tão objetivas quanto um sol quente no verão. Todas cheias de sentimentos.

 Nunca pensei que seríamos para sempre, sempre  soube que nosso relacionamento poderia  ter fim. Mas  o amor nunca terá.

 Meias  palavras nunca foram o suficiente para você, você merece todas as palavras sobre amor por inteiro, e todas que escrevo são sobre você.

                                    Com carinho Lucky.

 Li todas as três cartas, não pude conter as lágrimas  tudo que eu sentia por Lucky ainda está aqui, sempre esteve. O que sinto por Lucky é amor, diferente da paixão e do desejo carnal que sinto por August. Lendo todas as cartas penso que joguei o verdadeiro amor fora. Mas onde poderia encontrar Lucky? ele vive viajando seria impossível

Impossível

 Essa palavra sempre nos perseguiu. Nós conseguimos enganar a todos, até meu pai decidir que era hora de me casar, não tive escolha, simplesmente me encurralou e eu não tive saída .

 Ele nunca me contou o motivo pelo qual decidiu me casar cedo, um dia eu teria coragem o suficiente e perguntaria isso a ele. 


                          º º º º

 Desci para o salão principal, e encontrei August, olhando para os jardins através de uma das janelas do castelo, dela podíamos ter uma ótima visão dos terrenos do castelo. A neve era fina mas já cobria boa parte da grama.

 Senti vergonha ao passar por August, eu não o encarei mas podia sentir que me observava e de novo mais uma situação me fazia lembrar da minha infância

  Eu tinha oito anos e interrompi meu pai em uma de suas importantes reuniões com outros reinos, isso era o bastante para causar discussões em casa, ele brigava comigo por ter interrompido ele e brigava com minha mãe por ser o único dever dela cuidar de mim, sendo que não era. Ele berrava e xingava, no fim eu só me sentia envergonhada e não conseguia olhar para o meu pai do mesmo jeito que não consigo olhar para August agora.

Amor entre Guerras Where stories live. Discover now