Vivo como as chamas

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      O corpo de Alicent permanece rígido na mesma posição, seus joelhos há muito tempo doíam pelo contato rude com o chão de pedras do Septo. Suas mãos estavam firmemente cruzadas em oração, quase enraizadas pela posição que ela se obrigou a estar. Seus olhos se abriram pela primeira vez em minutos, tudo ao seu redor estava levemente embaçado, a luz fraca das velas machucava seus olhos. A vela que acendeu já estava pela metade, a cera derretida desce lentamente ao redor do objeto cilíndrico de cor creme em pequenas gotas.

         Seus olhos se erguem para a figura diante de si, a estátua da mãe se mostrava esbeltamente para os seus fiéis, com a beleza e virtude que somente uma mãe poderia ter. Se a mãe a visse agora, rezando pelo filho enfermo pelos  inúmeros ferimentos que cobriam seu torço e rosto, e pelo filho deprimido, não a acharia digna e ignoraria suas súplicas. Mas os deuses não viam sua face, apenas seu coração, e seu coração era virtuoso e digno de ter suas preces ouvidas e realizadas. Porque, assim como as rochas encontradas na margem dos marés, ela suportou todas as ondas e tissunames direcionadas a ela com a maior graça que poderia reunir.

         Ela renegou todos seus desejos em nome de algo maior, em nome de boas causas, daquilo que deveria ser feito. O rei, seu falecido marido, que os sete o tenha em sua graça, era fraco. Um homem de bom coração, mas ainda assim um homem fraco. Ela se repreendeu durante alguns anos por tal pensamento venenoso. Mas como poderia evitar esses pensamentos maldosos quando eles retornavam a sua mente a cada decisão do senhor marido? A cada escolha tolo só era prova de sua incapacidade. Ele era um cego que se perdia nas gentilezas da filha e não via suas maldades direcionadas a ela, sua esposa, e a incompetência em reinar.

      Ela mesma havia caído em tenra idade em tais encantos, que ainda lhe atormentava a mente. Poderia ser uma tola, mas não cega como o marido, havia visto a maldade naquele belo ser, e como uma erva daninha, arrancou pela raiz sem dó ou piedade, se recusando a usar aqueles vestidos vermelhos de sangue e Petros de cinzas, esbaldando em toda a glória o verde esmeralda cintilante.

        Sim, ela havia dobrado os joelhos quando mais nova diante da Targaryen, ajudado a amarrar os laços do seu vestido e suas jóias, tudo isso quando não havia um herdeiro legítimo para o trono, quando os sete ainda não haviam abençoando vossa graça com algum filho homem. Era da natureza divina e humana, que as mulheres se submetem à força superior dos homens, elas tinham seus próprios deveres a cumprirem e tinham que exercê-los com a maior das dignidades e excelência.

        Ela havia exercido suas funções, com muita graça, é válido ressaltar, mas nada havia ganho além de um amigável tapinha em suas costas ou um abraço sem calor. Ela quase havia morrido na cama de parto, como muitas mulheres antes dela, como a rainha antes dela, mas o rei nada se esforçou para presenteá-la ou tornar suas próximas gestações mais agradáveis. Doía, ela sangrava, chorava e se debatia, sua pele ser rasgada e esticada para por aquele ser no mundo. E depois de todas essas dores, era recompensada em fazer isso de novo, de novo, de novo e de novo. Seus esforços sempre foram ofuscados pela princesa que nada fez para merecer todas essas gentilezas ou méritos.

      Bastardos, ela havia postos bastardos nesse mundo e mesmo assim sua prole herdaria títulos e pela vontade equivocada do marido, o trono de ferro. E o que seus filhos, legítimos Targaryens sem contradições, ganhavam? Absolutamente nada além de negligência do pai. O direito do seu primogênito havia sido negado, o olho do seu filho arrancado e antes já havia tentado lhe roubar a filha, tudo isso foi ignorado pelo tolo rei que se afogava em seu favoritismo evidente.

       E finalmente, em seu leito de morte, Viserys finalmente reconheceu seus esforços. Sim, Aegon era o herdeiro legítimo desde o dia que pôs os seus pés neste mundo. Nada poderia mudar isso. Mas, que culpa tinha ela se a princesa não tivesse visto o óbvio, se tivesse se enrolado nas ilusões de ir além de sua tarefa? de ser uma aberração para os planos dos sete? Ela estava determinada em dar-lhe o perdão se ela se rendesse, dobrasse os joelhos e jurando lealdade, permitindo que ela permanecesse com seus títulos, tesouros e pedra do dragão. Ela concederia piedade, piedade nunca dada a ela mesma antes.

Nunca morrereiOnde histórias criam vida. Descubra agora