Querida Morita

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Em treze de julho de 2019 eu acordei agitada pouco depois das seis da manhã – o que era incomum para um sábado, ainda mais depois de passar boa parte da madrugada me batendo de um lado para o outro pensando em Carlos. Lembro muito bem de como tudo estava naquele momento: uma luz tímida do dia atravessava a cortina, meu quarto estava em pleno silêncio e existia no ar uma esfera pacífica, contrastando com a forma como eu me sentia. Eu fiquei um tempo sentada na cama observando aquele silêncio, e era esquisita a sensação de que o mundo estava parado, congelado, enquanto tudo dentro de mim era um completo caos, uma turbulência que me batia e fazia meu corpo doer.

Meu celular vibrou na mesinha ao lado da cama e não consegui fazer qualquer menção de pegá-lo, pois tive o pressentimento de que aquela notificação guardava algo que me machucaria. O aparelho vibrou novamente, e então mais uma vez. Cada batida do meu coração dava uma fisgada. Com custo, estiquei o braço e vi na tela de bloqueio que haviam mensagens de Carlos Sainz.

Laurita” – era a primeira delas.

Te escrevi uma carta, mas preciso que você leia em um lugar especial. Por favor, vá até lá nesta manhã e se identifique para Caco, a única pessoa que trabalha lá. Ele te levará um café a meu pedido. Quero que leia o que escrevi sentada na mesa que reservei para você. Por favor, não esqueça do quanto você significou para mim em todos esses dias que conversamos. Um beijo, Morita.”

Abaixo dessas duas mensagens, o endereço de um café. Acho que não preciso descrever como eu desmanchei. Aquilo era uma despedida?

Não respondi Carlos, eu não tinha o que falar. Me levantei devagar com o meu corpo todo pesado e fui até o banheiro tomar um banho; enquanto lavava o cabelo, chorei o que pudesse ser mais do que todos os outros dias. Sua carta era uma despedida, eu sabia, era oficialmente o final de tudo. O cheiro de Carlos parecia estar no ar, mas eu sei que era apenas uma brincadeira sem graça do meu cérebro confuso, afinal, não tinha a menor chance de ele estar ali. Me doía estar passando por aquilo e a saudade me castigava. Eram sentimentos cansativos que nos próximos dias eu entenderia que eles fariam parte da minha vida por um bom tempo até eu conseguir dizer adeus.

Deixei uma mensagem para minha mãe e pedi um carro para me levar até o local indicado por Sainz, e enquanto fazia o caminho para ir até a entrada da minha casa eu me lembrei do início da semana, quando desci as escadas consumida pela alegria de ver Carlos no dia 13 de julho. Que grande coincidência, não?

Estar dentro de um carro também não me trouxe boas lembranças: cinco dias atrás eu estava em outro táxi indo de encontro ao aeroporto para ver Carlos Sainz pela primeira e única vez antes de sua partida. Meu coração estava em pedacinhos, mas minhas lágrimas pareciam ter congelado; àquela altura, parecia que eu já tinha chorado tanto que não tinha mais nada para sair, porém tudo em mim parecia arder o dobro. Olhei meu celular mil vezes e em todas não tinha qualquer sinal dele. Lembro que, dentro daquele táxi, fui invadida por um sentimento muito forte de saudades: eu queria desesperadamente conversar mais uma vez algum assunto banal, dar risada e sentir que eu estava andando sobre um caminho de algodão.

Depois de quase meia hora, o motorista chega ao meu destino, e desço em frente ao estabelecimento indicado na mensagem. Respirei fundo olhando a fachada: um café que já do lado de fora passava uma sensação de aconchego. Do lado de fora, a parede era de tijolinhos alaranjados, a porta de entrada era de um marrom bem escuro e havia janelas de vidro. Ao entrar, o cheiro gostoso de café me fez ter um milésimo de paz. O lugar era pequeno, mas agradável; as mesas também eram marrons e estavam espalhadas nos cantinhos do espaço. O balcão continha estufas que abrigavam comidas aparentemente deliciosas, daquelas que você quer levar tudo pra casa porque tudo ali parece gostoso.

Pelo telefone | Carlos SainzWhere stories live. Discover now