- O réu poderia se levantar, por favor?
Não se tratava de uma pergunta de verdade, embora soasse como tal. Eu tinha percebido isso desde a primeira vez que nos reunimos lá, nas mesmas circunstâncias. Era um comando, uma ordem. O "por favor" era só uma formalidade.
Meu irmão levantou. Ao meu lado, minha mãe ficou tensa e prendeu a respiração. Do jeito que pedem para você inspirar antes de um raio X, para que consigam ver mais, captar tudo. Meu pai olhava para a frente, como sempre, com uma expressão indecifrável.
O juiz voltou a falar, mas eu não conseguia prestar atenção. Em vez disso,olhei para as janelas altas, as árvores balançando com o vento lá fora. Era começo de agosto; as aulas começariam em três semanas. Tinha a sensação de ter passado o verão inteiro exatamente naquela sala, talvez naquela mesma cadeira, mas sabia que não era o caso. O tempo simplesmente parecia parar ali. Mas, no caso de pessoas como Jay, talvez o objetivo.fosse justamente esse.
Foi só quando minha mãe soltou um gemido e se inclinou para agarrar o banco da frente que percebi que a sentença havia sido dada. Olhei para o meu irmão. Ele era conhecido por sua coragem. Isso no passado, quando éramos crianças que brincavam no bosque atrás de casa. Mas um dia os garotos mais velhos o desafiaram a atravessar aquele tronco fino que passa sobre um buraco enorme e profundo. Ele atravessou, mas suas orelhas queimavam, vermelhas. Ele teve medo. Naquele dia e no tribunal.A batida do martelo soou. Estávamos dispensados. Os advogados se voltaram para o meu irmão: um deles se inclinava para dizer algo enquanto o outro punha a mão nas costas dele. As pessoas levantaram e começaram a sair em fila. Dava para sentir os olhares sobre nós enquanto eu engolia o nó na garganta e mantinha os olhos fixos nas mãos sobre o colo. Ao meu lado, minha mãe soluçava.
- Jennie? - chamou Gray. - Você está bem?
Não consegui responder. Só fiz que sim com a cabeça.
- Vamos - meu pai disse, pondo-se de pé.
Ele tomou o braço da minha mãe e gesticulou para que eu caminhasse à frente deles até onde estavam os advogados e Jay.
- Preciso ir ao banheiro - eu disse.
Minha mãe, com os olhos vermelhos, só me encarou. Como se aquilo,depois de tudo o que tinha acontecido, fosse a única coisa que ela não pudesse suportar.
- Tudo bem - Gray disse. - Eu vou com ela.
Meu pai assentiu e deu um tapinha no ombro dele quando passamos. No saguão do tribunal, vi pessoas abrindo as portas e saindo para a luz do dia do lado de fora. Desejei mais do que tudo ser uma delas. Gray me envolveu em seu braço enquanto caminhávamos.
- Espero você aqui - disse quando chegamos ao banheiro feminino. - Certo?
Lá dentro, a luz era brilhante, impiedosa. Caminhei até a pia e me olhei no espelho. Rosto pálido, olhos escuros, vazios e sem vida.
A porta de uma das cabines abriu atrás de mim e uma menina saiu. Era mais ou menos da minha altura, um pouco menor e mais magra. Quando parou ao meu lado, pude ver seu cabelo loiro enrolado numa trança bagunçada que pendia sobre um dos ombros, com alguns fios soltos emoldurando o rosto. Ela usava um vestido de verão, botas de caubói e uma jaqueta jeans. Senti que me observava quando lavei a mão uma vez, depois duas, peguei uma toalha e virei para a porta.
Ao abrir, logo vi Gray encostado na parede oposta do corredor de braços cruzados. Quando me viu, ele endireitou o corpo e deu um passo à frente. Hesitei, parei e a garota, que também saía, trombou comigo.
- Ah! Perdão! - ela disse.
- Não - respondi, virando. - Foi... culpa minha.
Ela olhou para mim por um segundo e depois, por cima do meu ombro, para Gray. Observei seus olhos verdes contemplarem aquele estranho por um longo momento antes de voltarem a atenção a mim. Eu nunca a tinha visto antes. Mas uma única expressão em seu rosto bastou para que eu soubesse exatamente o que ela estava pensando.
Você está bem?
Estava acostumada a ser invisível. As pessoas raramente me viam e, se viam, nunca me olhavam de perto. Eu não era radiante e encantadora como meu irmão, linda e graciosa como a minha mãe, ou inteligente e dinâmica como minhas amigas. Mas essa é a questão. Você sempre acha que quer ser notada. Até ser notada.
A garota continuou a me observar, à espera de uma resposta à pergunta que nem fizera em voz alta. E talvez eu tivesse respondido. Mas então senti uma mão no meu cotovelo. Gray.
- Jennie? Está pronta?
Também não respondi essa pergunta. E de repente estávamos a caminho do saguão, onde meus pais conversavam com os advogados. Enquanto andávamos, continuei a olhar para trás, tentando ver aquela garota, mas não consegui encontrá-la no meio da multidão agitada que se enfiava dentro do tribunal. Assim que nos desvencilhamos das pessoas, porém, olhei para trás uma última vez e fiquei surpresa ao ver a garota bem onde eu a tinha deixado. Seu olhar ainda estava fixo em mim, como se ela não tivesse me perdido de vista um momento sequer.
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Os Bons Segredos (JenKook )
RomanceJennie sempre se sentiu invisível, já que Jay, seu irmão mais velho, era o foco da atenção da família. Até que ele causa um acidente por dirigir bêbado, deixando um garoto paralítico, e vai para a prisão. Jennie parece ser a única a responsabilizá...