Degraus d'água

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Peguei-me sobre degraus

Sobre os quais a água passa.

Eu ainda sobre a ponte

Ouvindo aquele caos

De que a vida me tornou escassa.


Tão caótica soa

A correnteza d'água barrada

Que, pelas rachaduras, escoa

A lágrima por muito guardada.


Ainda que eu conte

Com a abundância desta água,

Ainda que eu ande

Sobre todos os sobres,

Sobrarei à mágoa

Cujo córrego abundante

Se deve à força das dores

Por tantos lamentos acumulada.


E eu agora sob a escassez

Das coisas agora por outras ocupadas,

Enxergo o quão é abundante

A corrente que me alaga,

Mas alago-me ainda mais pela insensatez

Da fútil braçada

Contra tudo que carrega a fluidez

Do tudo ao nada.

Minha experiência é de andante

E nadador não se faz de caminhada.


Fluida.

Se fui amada,

Agora eu amo

E o que mantive dentro

Transbordou para fora.

Minha vaidade antes aclamada

Agora eu chamo

E, se num círculo fui centro,

Tênue é o raio até a borda.


Onde retas se cruzavam

Eu era ponto de encontro dos que vinham,

Dos que iam, mas voltavam,

E os perdidos que haviam

Finalmente, em mim, se encontravam.

Hoje apenas passam.


Não me restava os que sobravam.

De sobras é feito somente meu passado

E tão somente

Que só me resta agora meu presente

E nada do meu todo acumulado.


As coisas que existiam,

Que outrora acumularam-se,

Os fardos que persistiram,

Forçaram e pesaram-me,

Agora morrem afogados

E, junto a eles, arrastam-me

Pelos córregos dos meus olhos alagados.


É tudo que se sente

Quando transborda a mágoa.

Meu fluxo é a corrente.

Minha fluidez é a água.

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⏰ Last updated: Nov 29, 2023 ⏰

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Degraus d'águaWhere stories live. Discover now