o. prólogo

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OS ALTA, RAVKA

Era final da primavera, o ar estava doce e quente ao mesmo tempo. O Grande Palácio havia sido decorado com flores e mais flores em todos os cantos: nas mesas, nos quartos e ao redor de todas as portas. Enquanto videiras externas estavam crescendo sob as paredes de pedra, com flores coloridas florescendo brilhantemente delas. Era belo e celebrativo, apesar de que naquele dia eles não estivessem celebrando nada.

Pelo contrário, na verdade, era o dia do enterro de Vossa Majestade. Caíra num lindo final de semana. O rei Aleksander III vinha governando Ravka por pouco mais de cinquenta e oito anos, mas havia recentemente contraído uma doença misteriosa que o levou à óbito.

Os médicos, detetives e alguns grishas ainda estavam investigando a possível causa do falecimento súbito do rei — verificando suas roupas, os utensílios do seu quarto, cada membro do palácio assim como cada pedaço do corpo morto do mesmo.  Talvez fosse um assassinato muito bem acobertado, talvez ele estivesse escondendo que estava doente há tempos. Eles não sabiam. Todas as pessoas que trabalhavam ou viviam no Grande Palácio estavam tendo que responder perguntas, mesmo a família real.

Para Daron Lantsov, contudo, as perguntas eram um pouquinho diferentes. Dentre os irmãos, Daron era o mais próximo do pai — apesar de que, ainda assim, Daron não poderia ser considerado alguém íntimo do rei. Não, ninguém nunca fora próximo do rei em vida, nem mesmo seus filhos. Ele era alguém um tanto difícil, só tendia a abrir mais exceções com o seu filho herdeiro.

As perguntas de Daron giravam em torno da coroa, não do rei em si. Se tratavam mais de perguntas como quando ele assumiria o trono? Ou se haveria alguma celebração? A principal delas, no entanto, era se Daron pretendia arrumar uma esposa, uma nova rainha. O povo estava há mais de dezessete anos sem uma rainha, não se lembrava mais do que era possuir uma, e agora estava sedento por outra.

Daron, verdade seja dita, não tinha uma resposta concreta para nenhuma dessas perguntas. Não era ele quem estava cuidando disso — nem da coroação, nem do seu casamento —, embora talvez ele devesse.

— Vossa Alteza? — O corpo de Daron se virou quando o general Landon fez menção de pigarrear assim que entrou no cômodo. A varanda de seu quarto era um dos poucos lugares que Daron se sentia imperturbado ultimamente, e ainda assim ele não tinha a menor privacidade. Todo e qualquer canto do Grande Palácio era assim.

— Fala Krastan — Daron sorriu, um sorriso falso que não lhe chegava aos olhos. Seu pai tinha acabado de morrer, o enterro fora naquela manhã e Daron mal tinha tido um tempo para raciocinar tudo isso.

Ele deveria ter esperado, seu pai já estava num estado crítico há semanas, mas Daron nunca achou que seu pai fosse morrer assim. Quem imaginaria? Ele faleceu engasgando com sua própria saliva enquanto se debatia no meio da noite, foi o que Olena gentilmente lhe disse. Parecia um jeito muito doloroso de definhar até a morte, e Daron não sabia dizer se ele merecia isso.

Ele abandonou a varanda, deixando o sol quente sob a pele e a visão parcial do lado de fora dos muros do palácio para trás. Não havia mais tempo para suas fantasias de garoto, nem para descansar.

— Vossa Alteza — Krastan Landon repetiu, o repreendeu, porque ele não gostava que Daron o chamasse pelo nome. Ele estava assim desde que recebera uma promoção do rei, há um mês. Krastan era informal demais. Daron só podia chamá-lo de Landon agora, o que era, no mínimo, patético.

Agora que o rei não estava mais ali, Daron estava quase usando o seu poder hierárquico para obrigá-lo a ser chamado só pelo primeiro nome novamente.

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