Dia 0

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Quando abriu seus olhos, estranhou o lugar à sua volta, procurou em sua mente por qualquer evidência de que já estivesse estado ali antes, mas não conseguia se lembrar de como havia ido parar ali, na realidade, não conseguia se lembrar de nada.

Estranhando estar de bruços e com o rosto colado a um lugar desconfortável, ela se levantou devagar do chão gelado, sentindo algumas folhas secas e terra se descolando do seu corpo.

  Agora de pé, ela podia notar uma poça de sangue ao redor da pedra de onde  havia acabado de se levantar. Automaticamente, sua mão lentamente foi até sua cabeça, onde ela tateou a procura da fonte do sangue.

Havia um profundo corte na lateral superior em sua testa, terra e alguma sujeira haviam se pregado ao sangue já seco em torno de um relevo.

Porque em uma floresta?

Bem, mesmo não sendo uma pergunta irrelevante, não era sua maior questão no momento, oque mais a fazia se preocupar atualmente, era o fato de estar despida de qualquer vestimenta.

Aquela situação de vulnerabilidade a deixava muito assustada, então em alguns segundos, a jovem já estava tentando policiar sua respiração, em uma falha tentativa de controlar a ansiedade.

O sol já estava prestes a se pôr, e o clima estava nublado, como se a qualquer momento o céu fosse desabar sobre sua cabeça.

Por algum motivo, ela se atraiu por pegadas no chão, provavelmente, suas próprias pegadas, mas ela não se importava, precisava seguir algo, mesmo que significasse voltar de onde veio.

Não eram bem pegadas, e sim um rastro de galhos e folhas quebrados que indicavam que alguém havia passado por ali, e por algum motivo, ela sabia daquilo, se sentiu aliviada por ter uma única memória que fosse para se agarrar, saber que sabia de algo, que era boa em algo, isso aliviava seu desespero por estar nua e sozinha no meio do mato.

Logo, após umas meia hora andando, encontrou uma casa velha, havia galhos pelo telhado e musgo pelas paredes, provavelmente ninguém ia ali a anos.

Após algum tempo batendo na porta e chamando por alguém, decidiu que era o momento certo para ir embora ou quebrar uma janela, se realmente estivesse abandonada. Não pareciam boas opções, mas estava começando a chuviscar e escurecer, então era melhor do que nada.

Mesmo relutante com a idéia de invadir o casebre, não queria correr o risco de ser atacada durante a noite, então seu sétimo sentido fora ativado, e suas necessidades primitivas a fizeram girar a maçaneta.

Ela se surpreendeu por não estar trancada, e quando entrou, sentiu medo do que veria se acendesse as luzes, na verdade, nem sabia se iriam acender devido a seu estado.

Após tatear a parede e finalmente encontrar o interruptor, mesmo com as mãos ligeiramente molhadas, ela arriscou pressiona-lo, achou que não tinha funcionado, e suspirou, mas após alguns segundos, a fraca luz amarela iluminou o lugar.

A casa não estava tão suja, pelo contrário, mesmo não estando em seu melhor estado, pra uma casa abandonada estava "ok". As paredes tinham um tom amarelo desbotado que já estava descascando e sujando o chão, também haviam manchas verdes de lodo, e a madeira na parte inferior que ia do chão até pouco antes da metade da parede, estava estufada devido a água da chuva que entrava. Mas apesar de tudo, parecia um lugar habitável, estava bem melhor do que o esperado para um casal abandonada.

Conforme andava pelo lugar, ela sentia uma forte e inexplicável sensação de desconforto, como se algo dentro dela gritasse pra correr dali e não olhar pra trás, talvez fosse sua sanidade a lembrando de que havia acordado misteriosamente sem roupas e no meio do nada, mas ela ignorou a sensação e se deu ao luxo de se considerar sortuda por encontrar um lugar como aquele para passar a noite, ela iria embora de manhã afinal, que mal havia em dormir ali?

Ela subiu as escadas lentamente, sentindo a rala camada de poeira das laterais onde ela apoiava as mãos sujando seus dedos e palma, ouvindo seus passos, e se permitindo respirar lentamente.

Ao chegar no segundo andar, sorriu ao ver que havia uma larga banheira de madeira, seria pedir demais desejar um banho quente?

A menina já estava nua, e definitivamente com frio, então não faria diferença um banho gelado, o importante seria se livrar da lama que havia grudado em seus cabelos e corpo.

Nem mesmo se deu o trabalho de procurar por uma toalha antes, assim que notou o vapor que saia da água corrente que escorria da torneira, sorriu.

Enquanto a banheira enchia, voltou até a pia, onde havia um espelho dependurado.

Se sentia encarando uma estranha, não se lembrava dos próprios traços, então tocou com curiosidade seus cabelos volumosos e desgrenhados que formavam pequenos cachos ao longo de sua extensão. Seu nariz era achatado, sua pele; escura. Seus olhos eram puchados e castanhos, e estava horrivelmente suja. Familiar.

Por algum motivo, era engraçado pensar que havia acabado de descobrir que "era negra", não é como se não tivesse visto o próprio corpo antes, mas estava se divertindo com seus próprios pensamentos.

Por um breve instante enquanto sentia a água quente limpar seus poros, ela pôde jurar que havia ouvido passos, lentos e cautelosos que faziam a madeira ranger, mas ignorou e tornou fechar seus olhos.

Relaxar era sua única prioridade no momento.

Suspiros longos e calmos tomaram conta do banheiro, que agora parecia uma sauna.

Quando abriu seus olhos pela segunda vez, pode ver uma silhueta frente a porta semi aberta, parecia estar parado a encarando silenciosamente, mas graças a enorme quantidade de vapor, ela só podia ver um borrão.

— Porra... ?! - Ela gaguejou para si, esfregando os olhos antes de tornar abri-los.

A sombra sumiu antes que ela abrisse os olhos novamente.

"Minha mente está cansada, então é normal que crie coisas"

Ela pensou respirando fundo. Não era possível que alguém realmente estivesse ali, a porta pesada fazia barulho ao ser aberta.

A menina se levantou, e pegou o único tecido que viu disponível ali no banheiro, e saiu enrolada na toalha de rosto.

Saiu do banheiro assim como entrou, mas dessa vez, sentindo seu corpo se arrepiar, conforme seus pés descalços tocavam o chão de madeira bem polido, ela sentia o frio lhe abraçar.

Haviam uns 5 quartos, mas o do final do corredor era o único limpo o suficiente, então ela entrou.

Satisfeita com a própria sorte, pegou uma camiseta suja jogada ao chão e vestiu com uma cueca larga.

Sem muito analisar o quarto, ela se jogou na cama e adormeceu por ali, estava exausta.

Talvez, se ela não estivesse tão cansada, teria ligado alguns pontos.

A casa não estava suja, haviam roupas de cama e toalha de rosto, uma blusa jogada no chão, água quente, energia elétrica, com apenas um pouco de raciocínio lógico, ficaria óbvia a realidade; alguém morava ali.

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