Décimo capítulo

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Tocando: Half Light - BANNERS

Miranda não saberia precisar, de forma alguma, o quanto aquele "não" doeu. Sabia que Andrea não gostaria de machucá-la lhe entregando de bandeja uma resposta negativa, mas a jovem era orgulhosa demais para dar o braço a torcer e deixar que alguém facilitasse tanto sua vida. Para ela, aquilo não tinha um nome diferente de "aproveitar". Se aproveitar da influência de Miranda, de sua complexidade e do poder de sua voz. Ambas gostariam, sim, de permanecer juntas. Todos os momentos incríveis que compartilharam rondavam suas vidas e as acompanhariam em jantares, recitais, reuniões ou durante o trabalho. Também as visitariam numa noite solitária de vinho, porém Andrea não podia abrir mão das suas tentativas, ainda que falhas, de conquistar seu próprio espaço. E Miranda, no fim, entendeu.

Ela ainda era sua Andrea. Aquela jovem cheia de energia, um sorriso contagiante e grande vontade de viver e se realizar. Apesar da negativa, se falavam praticamente todos os dias. Andrea ainda não tinha descoberto, totalmente, o que o nome "Miranda Priestly" significava, pois não mergulhou em seu mundo nem se moldou àquela vida agitada da moda. Miranda, por outro lado, conhecia muito bem os altos e baixos de Andrea, sua calmaria e sua energia. E sentia falta dela a cada segundo do seu dia.

Cada vez que fechava os olhos e respirava fundo após um dia cansativo no escritório, lembrava-se do cabelo escuro bagunçado cobrindo parte do rosto sorridente. Todas as vezes que resolvia ir almoçar caminhando, atravessando o silencioso Central Park, sentia saudade do calor dos braços de Andrea lhe cobrindo, circundando sua cintura e causando arrepios em partes do seu corpo que sequer se lembrava que existiam. Se recordava da risada que invadia o quarto de hotel que, no imaginário de ambas, era somente delas. E então balançava a cabeça tentando afastar tais lembranças, pois não sabia nem mesmo quando provaria tudo aquilo outra vez.

Ainda que compartilhassem cada acontecimento de suas vidas por telefonema ou mensagens de texto, sentiam uma falta dolorosa que não era preenchida por nada nem ninguém. Era como se não pudessem mais viver sem a presença da outra, por mais possessivo que parecesse. Sentiam-se culpadas por isso, afinal, suas vidas eram normais, na medida do possível, antes de se conhecerem. Eram vidas vazias? Talvez. Procuravam sentido em tudo, sem sucesso em encontrar? Com certeza. Mas viviam. Se poderiam viver novamente daquele jeito? Não! Para ambas, silenciosamente, não.

— Quando vem me ver?

A voz suave do outro lado da linha fazia Miranda querer gemer, não de prazer, mas de dor. Aquela dor incômoda que apertava seu coração e quase o fazia se desfazer e escorrer por seus dedos.

— Prometo que em breve.

— Não acredito mais em suas palavras.

— Andrea... Você sabe o quão complicado está se tornando.

— Você sempre fez o impossível para me ver, Miranda. Agora acontece uma vez a cada seis meses, quando insisto muito.

— Eu sei, meu amor. Eu estou me esforçando aqui, acredite em mim.

Houve silêncio. E por mais que Andrea quisesse gritar e dizer tudo que a magoava, ela não o fez. Ela entendia. Apesar de se amarem, claramente se amarem, suas vidas eram distintas demais. Miranda era importante. Ela tinha duas filhas lindas que lhe tomavam grande parte do seu tempo. Tinha um império para comandar. Não era uma mulher que ficaria horas e horas incansáveis num avião para visitar a namorada do outro lado do país apenas para satisfazer seus caprichos.

— E se você vier?

— Da última vez eu fui. E você ficou trabalhando o tempo todo.

Miranda suspirou e fechou os olhos, massageando as têmporas. Andrea tinha razão. E, mesmo que não colocasse em palavras, devia achar Miranda patética.

Actually, you belong to me. [Mirandy]Onde histórias criam vida. Descubra agora