Montevidéu, outubro de 1972
- Qual é o seu lugar, Mabel? - me segurei pra não rosnar pro idiota. Me fodeu no banheiro e não estava satisfeito de mim? Chato!
- Não te interessa! - respondi fussando na minha bolsa por um chiclete. Eu sempre fui louca por chicletes, hidratantes labiais e palavras cruzadas.
- Relaxa, Flor - começou Esteban - Eu troco com você caso esse idiota esteja do seu lado - eu sorri e coloquei uma goma sabor menta na boca e logo retoquei meu batom.
- Para de defender ela, hermano! - resmungou o moreno rindo e empurrando o peito do loiro.
Ciúmes? Dúvido muito. Enzo era seguro demais de si.
Ele mostrou no último jogo de rugby que tiveram, jogo esse que é o motivo para estarmos todos viajando para o Chile.Desde que os garotos começaram a competir, quase que profissionalmente, eu sempre viajei com eles. Desde a escola. Pela diversão. Crescemos juntos, somos praticamente uma família, então os garotos sempre fizeram questão que eu estivesse junto, pra torcer e pra jogar nas horas vagas. Com todo mundo entrando na faculdade, ficou cada vez mais difícil se reunir, por isso os jogos e campeonatos eram tão importantes. Com o passar dos anos, mais meninos se juntaram ao time, Pipe, Blás, os primos de Kuku, outros... e era sempre uma alegria estar entre eles.
Ele não parava de me observar na minha difícil tarefa de contornar os lábios com o tom avermelhado.
- Da pra você olhar pra outro lugar? - sussurrei enquanto os outros estavam distraídos.
- Você fica provocando. - sussurrou de volta.
- Eu?
- Sim, fica bem assim, com essa boquinha, quando ta chupando meu pa- - foi cortado pela irmã de Guto.
- FLOR!
- Susie! - Susane Pardella, minha amigassa do coração. Abracei ela.
- Animada?
- Sim e você? - E ficamos naquele papinho sem graça até dar o horário do embarque.
- AQUI, FLOR - começou Matías Recalt chamando atenção de meio aeroporto, me virei para aquele bando de bobões - O Enzo nem ia vir, tinha prova de direito... só confirmou depois que você confirmou.
- Claro - o moreno sorriu - Não posso perder a chance de irritar ela.
Revirei os olhos.
- E ele não muda, Meu Deus! - resmungou minha amiga, sentamos - Faz tempo que eu não via a maioria do pessoal aqui, foi bom rolar esse reencontro.
Concordei, cada minuto que se passava eu ficava mais tensa. Respirei fundo.
Ta tudo bem, Maria Flor del Castillo. Não é porque seus pais morreram em um acidente aéreo, que você vai morrer também.
- VAMOS TURMA - gritou Diego - Hora do embarque!