32. Quando as Paredes Caem

88 4 88
                                    

No íntimo da sala, no íntimo terremoto dos sentimentos, Sérgio Mendes via o ex-chefe apunhalando-o com uma afiada espada, que buscava encontrar a armadura de falsidade que o outro ostentava

Oops! This image does not follow our content guidelines. To continue publishing, please remove it or upload a different image.

No íntimo da sala, no íntimo terremoto dos sentimentos, Sérgio Mendes via o ex-chefe apunhalando-o com uma afiada espada, que buscava encontrar a armadura de falsidade que o outro ostentava. Viveram nessa breve luta entre recentes palavras, que ousavam explodir em mil acusações.

Imaginou-se como o rebaixado, levantando-se, pronto para derrubar cada papel, cada evidência da incompetência de Armando espalhada ao redor da mesa. Visualizou-se despejando sobre ele toda a torrente de acusações e verdades guardadas, deixando que sua raiva diluísse a linha entre o profissionalismo e o pessoal. Ah, como desejava. Pena que permaneceu sentado, petrificado, moldado pela fúria que queimava na mais fria e profunda chama da indignação. Com a besta enjaulada. Mendes creia que a luta das lutas não acabaria naquele escritório. Havia um jogo em andamento, e ele acabara de ser colocado em xeque.

— Estou entendendo — ele tremia enquanto falava. — O-olha Armando, verdades aparecem. E quando isso acontecer... eu não serei mais o humilhado nesta mesa.

Dito isso, ergueu-se, encarando o julgador e, sem mais, deixou o recinto. A carreira selando-se como a porta atrás de si. O corredor recebia-o igual um protagonista de uma epopeia trágica. Com colegas do lado externo feitos de estátuas gregas que observavam-no com mera pena.

E por trás dessas estátuas, brilhos solares que moviam sombras invisíveis a essas construções vivas. O sol, culpado pelo fenômeno, seria Paulo, que empurrava quem estivesse em seu caminho para avistar seu amigo perdido em olhares quase malignos. "Dá licença, eu quero passar". E na leveza de um elefante, Paulo o tomou pelo braço, retirando-o daquela arena de espectros, levando-o em silêncio a rua da frente.

— Por que está aqui? — atravessavam o corredor — Estão falando de você.

— Para ver como as pessoas não têm nada melhor para fazer — Mendes respondeu em sarcasmo.

Paulo, contudo, não se levou pela tentativa do desvio. — É sério! O que Armando queria com você?

— O que ele queria? — Mendes deixou a verdade escapar — me despedir, Paulo. É isso que ele queria.

Na hora, o amigo parou, quando estavam a poucos metros da saída, suas pernas recusando-se a continuar. O baque o deixou momentaneamente sem palavras. Ele encarou Mendes, em busca de vestígios de zombaria ou mal-entendido.

— Você está falando sério? — Soltou do braço dele. — Isso... isso foi por minha causa? Sérgio, pelo amor de Deus, eu não queria... — Ele passou a mão pelos cabelos. — Eu nem sei o que dizer.

— Paulo, aqui não.

Paulo percebe o volume da própria voz, e Mendes acena para que ambos saíssem do Departamento. Ele não aguentava mais ver nenhum funcionário o fitando em curiosidade. Ao atravessarem a passagem, Mendes certificou-se da privacidade ao redor, antes de mirar o detetive a sua frente.

O relógio de areia VOL. 1Where stories live. Discover now