Parte 2

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― Vocês, humanos, precisam aprender a expressar as emoções em vez de apenas desmaiar ― o homem loiro acrescentou enquanto ajudava Marisol a se levantar.

Ela, parte em choque e parte descrente, aceitou a ajuda e pôs-se de pé, ajeitando sua roupa e olhando para a amiga, que permanecia adormecida no sofá, alheia à presença de um homem estranho dentro da casa.

Marisol deu alguns passos para trás, estendendo um braço à sua frente como se aquilo fosse barreira o bastante para impedir que o homem a imobilizasse se quisesse. Ela sabia que ele poderia sobrepujá-la sem esforço, dada a diferença de altura entre os dois e, pelo que ela tinha medido nos breves segundos em que se encaravam, peso também.

― Quem é você? ― Marisol perguntou, o medo tomando conta de si. As palavras saíram entrecortadas pela respiração ofegante. Seu coração batia rápido. Um homem estranho em sua casa no meio da noite.

― Ora, você me chamou e não sabe quem sou? ― O homem disse com um sorriso de canto de boca. Sua camisa branca, larga, estava desabotoada até o peito. Seus cabelos loiros e longos refletiam a luz da lua como a própria lua reflete a luz do sol. Como se pedaços da lua estivessem em seus cabelos. Os fios emolduravam um rosto oval que carregava uma expressão de consternação.

― Eu não chamei você, não o conheço ― era verdade. Marisol queria falar com sua mãe. Não com quem quer que esse homem seja. ― Como entrou na minha casa? ― Ela indagou, o desespero crescente não pode ser detido nem pela beleza do homem que Marisol descreveria como paralisante. ― Socorro! ― ela gritou, por fim, para quem quer que a pudesse escutar. O que era ninguém, ela bem sabia. Não tinha mais vizinhos. Mas ele não sabia disso.

― Ei, acalme-se. Claro que você me chamou, eu ouvi e vim, bem simples ― o homem estava calmo. Ele fez menção de dar alguns passos em sua direção e Marisol recuou, andando em direção à cozinha. O medo crescendo, seus instintos à flor da pele. O homem pareceu farejar algo no ar.

― Quem é você? ― Ela perguntou, enquanto afirmava sua postura e puxava para sua guarda uma frigideira de ferro fundido que estava no balcão que separava a cozinha da sala. Ela bufou para tirar o cabelo da frente do seu rosto enquanto posicionava o pé como ela aprendera naquelas aulas de luta que fez na infância.

― Você sabe muito bem que não será uma frigideira que vai me deter ― ele apontou e riu, mordendo a maçã que estava segurando e parando no lugar. Parecia receoso em se mexer e assustar mais ainda Marisol. ― Meu nome é Apolo ― ele declarou, por fim, mordendo mais um pedaço da maçã.

― Seus pais eram fãs de mitologia grega? ― Marisol perguntou, repreendendo a si mesma em pensamento por estar jogando conversa fora com o invasor. Será que ele tinha escalado as treliças até sua sacada? Não parecia possível, mas ele estava descalço, o que decerto facilitaria caso ele quisesse escalar.

― Mitologia? ― Ele fez um gesto afetado, fingindo ofensa. ― Eu pareço um mito para você?

― Ha-ha. Muito engraçado. Está bem, você deve ser um demônio ― assim que Marisol proferiu sua conclusão, ela sabia que estava ficando louca, mas que não era muito longe do círculo de possibilidades que ela e sua amiga tracejaram no chão. Ela com certeza havia atraído algo que gostaria de zombar e machucar sua amiga e a ela. ― É a única explicação lógica ― ela disse, por fim, esticando a mão para pegar um saleiro que estava no balcão sem, contudo, perder território naquele combate que ela havia travado. Ao que parecia, Marisol combatia sozinha. O homem, agora, havia se sentado na chaise que ficava perto da estante de livros, pouco longe de onde estava antes e bem longe do círculo no chão.

― Lógica? Demônio? Você realmente sabe ser uma boa anfitriã ― Marisol ficou com raiva ao perceber que ele estava relaxado. Aquilo era absurdo.

O homem era um invasor. Ele não deveria estar comendo de sua comida, sentando-se em seus móveis, ocupando o seu espaço. Mas ao mesmo tempo em que a raiva lhe concedeu coragem, ela tirou. E se ele fosse, de fato, um psicopata? Ele poderia facilmente dominar sua amiga e a ela, fazer o que quisesse. Em um cenário pior, ou talvez menos ruim, Marisol não sabia dizer, ele poderia ser mesmo um demônio ou um espírito ruim, pronto para zombar delas, de tantas maneiras que sequer poderia imaginar. Caminhando na direção do homem, Marisol decidiu que conversaria com ele e o convenceria de ir embora, deixando as meninas sem alarde.

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⏰ Last updated: Apr 10 ⏰

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APOLO: SILÊNCIO E SÚPLICAWhere stories live. Discover now