Prólogo

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—... Por isso, a miopatia de hellmer é uma rara e perigosa condição genética, lembrem disso. A prova prática de anatomia está marcada pra semana que vem, não faltem! - Eu guardo os meus livros na minha mochila com pressa de sair daquele lugar, ainda sentada na cadeira, eu observo meus colegas de turma saírem em seus pequenos grupos, sorrindo, brincando um com os outros e marcando de saírem pra festas enormes e caras que seus pais pagaram para ele irem. Eu reviro meus olhos pra isso, talvez por tédio de ver tantos futuros médicos se preocupando com futilidades, talvez por inveja por eles não terem problemas o suficiente pra ter que se preocupar com coisas mais importantes, eu não sei. Eu me levanto e saio da sala, mas antes eu ouço o Sr. Martín me chamar.

— Srta. Oliveira?

Eu olho para o professor e caminho até a mesa dele já sabendo o que ele queria de mim.

—Sim?- O homem encosta na cadeira com um suspiro.

— Srta. Oliveira nós dois já sabemos que suas notas são as melhores e que seu futuro como grande médica já está garantido. - Eu espero ele terminar, não deixando de sentir um pouco de orgulho de mim mesma, eu sou fodona mesmo. — O problema são os seus trabalhos. - Claro que são. Eu reviro os olhos mentalmente e solto um suspiro.

— Eu não entendo Sr. Martín, eu já conversei com todos os professores, pensei que tinham entendido minha situação. - Eu digo, meu forte sotaque escorrendo pela boca junto do cansaço e vergonha, eu sabia que não era pela cartolina que ele estava pegando no meu pé.

— Sim, sim, mas eu realmente não posso aceitar que você entregue trabalhos assim. - O homem puxou a cartolina sobre doenças neurológicas que eu entreguei na semana passada.

— Trabalhos em cartolina são ultrapassados, ninguém mais usa isso, muito menos na faculdade, sinto muito mas não posso aceitar isso.

— Professor, eu já disse, não sei fazer slides e não tenho dinheiro pra comprar um computador. - Começo a me exasperar, não queria reprovar na matéria dele, mas não tinha dinheiro pra comprar um computador. Eu olho para o homem, que também me olhava, eu tentei procurar algo em seus olhos que indicasse algum remorso, resquício de mentira ou até mesmo pena, mas não havia nada além do tédio.

—Eu sei, e eu realmente lamento, mas não posso aceitar. - Eu olho para o homem com meus olhos enchendo de lágrimas de ódio, mas eu apenas ignoro isso e pego a cartolina da mesa dele.

— Eu entendo, adeus professor. - Eu digo e saio da sala sem dar tempo dele responder. Eu caminho pelos corredores da faculdade, minhas mãos tremiam de ódio, do professor, da faculdade, dos malditos que tinham dinheiro o suficiente pra limpar a bunda com eles, ódio por ser pobre e não conseguir me manter numa maldita faculdade. Eu ando até o ônibus que me levaria pra casa pensando na injustiça que era ser pobre, não era justo que uns tivessem tanto e uns tão pouco.

Não é justo! Não é justo! Não é justo!

Quando dou por mim já estava na porta de casa, eu ouço os vizinhos do apartamento ao lado brigando e me viro em direção do som e vejo o pequeno garoto chamado Lucas do lado de fora da porta, com um suspiro eu caminho até ele e me agacho na sua frente com um sorriso.

— Eai garoto, tá com fome? - Eu pergunto, não era a primeira vez que isso acontecia, mas era a primeira vez que eu falava com ele.

—Minha mãe disse que não posso aceitar comida de estranhos. - Ele diz baixinho. Eu sorrio para ele
— Sim, ela tem toda razão. - Eu digo e ponho minha mochila pra frente abrindo e pegando uma barrinha de chocolate que eu tinha guardado pra lanchar. — É que eu tenho essa barrinha sobrando e não quero jogar fora, então pensei que você poderia querer, mas já que você não quer... - Eu ameaço guardar, mas ele me impede. Eu olho para ele com um sorriso e entrego para ele, eu vejo ele abrir a barra com excitação e me levanto bagunçando seu cabelo. — Bom proveito. - Eu digo e volto até a porta do meu apartamento, ignorando o aviso de despejo e entro.

Eu caminho pela sala, jogando a maldita cartolina pra um lado e a mochila pro outro e depois me jogando no sofá, eu pego meu telefone e começo a procurar vagas de emprego, como em todas as outras noites. Eu já estava a meia hora enviando currículos e estava prestes a desligar o telefone quando recebo um e-mail.

Resultado processo seletivo Casa da Moeda da Espanha.

Eu imediatamente concerto minha postura e clico na notificação e abro o e-mail com ansiedade.

Prezada Savanna Oliveira

Gostaríamos de agradecer por seu interesse na vaga oferecida e dizer que gostamos bastante do seu currículo­, por isso peço que comparecer para uma entrevista presencial para que possamos analisa-lá com mais clareza e conversar a respeito da vaga, por favor venha até a Casa da Moeda da Espanha no dia 8 de Abril às 8:00 da manhã na sala 32 no segundo andar.

Até lá!

Equipe da Casa da Moeda



Num pico de felicidade eu começo a pular comemorando a mensagem, esse emprego salvaria minha vida, eu estava tão feliz que sentia que nada poderia estragar isso. Eu aproveito o pico de energia e de felicidade e corro para o quarto arrumar minha roupa para a entrevista, mesmo que ainda fosse na semana que vem, e com a ansiedade dominando eu vou pra cama e tento dormir, com a esperança de que poderia me manter na faculdade e pagar todas as minhas dívidas.

Ganância || Berlim/Andrés de Fonollosa  Where stories live. Discover now