Mais frio que ontem

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Chico'

Adormeci no sofá, junto de Caetano. Acordei de madrugada, o sol nem havia nascido. Meu Amor dormia em posição claramente desconfortável, assim eu o carreguei até a cama. Na cozinha havia algumas louças, logo as lavei e fui até uma pequena salinha que tem em minha casa. Nela há uma mesa e muitos papéis, que ou são muito importantes, ou apenas lixo acumulado.

Em meio disso há uma caixa que guardo os poemas e cartas que escrevi para Caetano. Talvez eu entregue a ele, talvez eu guarde para sempre.
As cartas estão organizadas por tempo. Peguei um papel, nele havia um pequeno pensamento que escrevi em 1968, um dia depois do festival.

Caetano, a noite em que passei com você se mantém fixa em minha cabeça, não se passa um minuto em que eu não pense em nós dois juntos.

O resto estava riscado.

Peguei outro papel, porém esse é de 1969, após o exílio.

Como viverei longe de ti? As noites são frias, mesmo que eu esteja coberto. As ruas de Roma, para mim, estão vazias, falta você para preenchê-las com teu sorriso de orelha a orelha. O álcool se tornou apenas mais uma bebida, os beijos não são os mesmos que os seus. Não há homem como você, não há ninguém como você.
Não sinto o mesmo perto de outras pessoas, não sinto minhas bochechas arderem e nem aquele frio na barriga.

Agora eu tinha na mão uma carta de Caetano, de 1970.

Meu amor, sinto saudades de teus carinhos, mesmo que fossem poucos por conta de tua timidez. Sente falta de mim? Quem dera eu pudesse lhe beijar, quem dera.
Recebi suas cartas, quando me bate saudades eu as leio uma, duas, cinco vezes.

Eu amo Caetano... Bom, não o mesmo de antes, mas finjo que continua sendo.

Acendi um cigarro e me sentei na cadeira, me pus a continuar lendo. Alguns papéis mancharam, ou rasgaram. Outros estão inteiros, parece que foram escritos agora.
Logo paro de ler, pois, Caetano parou na porta, ficou me olhando por alguns segundos.

- Bom dia.

- Bom dia, meu bem. - Levantei-me e fui até ele para abraçá-lo.

- O sol nem nasceu ainda, que horas são?

- Ah, deve ser seis horas, por aí. Ei, você quer ir à praia?

- Agora?

- Sim.

Caetano deu de ombros e pegou em minha mão. Fomos até lá, sentamos na areia, frente ao mar. O vento suave batia em nossos rostos, e mexia os cabelos de Caê.
Não demorou para a manhã vir, o sol nasceu, refletindo sua luz em nossos olhos.
Não havia ninguém na praia, apenas nós dois.

- Chico. Tem algo que eu tenho que te falar. - Caê disse baixinho.

- O que aconteceu? - perguntei.

- Sabe... Eu gosto muito de você, sei que cê gosta de mim também, mas eu tô' bem inseguro com a nossa relação.

- Inseguro? Por quê? Eu fiz algo?

- Calma, Chico, calma. Você não fez nada, é eu. Eu tenho medo de que você esteja se enganando, afinal, você achava que Marieta era a pessoa certa, não é?

piaceri Where stories live. Discover now