ARIANE (3)

169 22 2
                                    

[ 10 de setembro, quarta-feira ] 








  Depois do jantar minha família se reúne na sala. Ariana mexe no celular e eu faço o dever de casa enquanto nossos pais assistem televisão. Momentos como esse são muito agradáveis para mim; me sinto bem em aproveitar a companhia deles dessa forma, ainda que estejamos todos em silêncio. De repente, mamãe se levanta da poltrona e corre escada acima com a mão na boca. Ela tem estado enjoada desde o primeiro mês de gravidez, já estamos acostumados em vê-la correndo para o banheiro depois das refeições ou em momentos aleatórios do dia. Não costumo pensar muito no novo bebê, no entanto. Fomos somente Ariana e eu durante dezessete anos e iremos para a faculdade alguns meses depois que ele nascer, então sequer moraremos juntos. Não que eu seja indiferente ao feto. Imagino que será no mínimo divertido ser irmã mais velha, principalmente porque não estarei aqui para escutar os choros noturnos. 

  Levo um susto quando, de repente, um acorde agudo de guitarra elétrica corta o ar. Ariana desvia a atenção do celular, olhando na direção da casa à esquerda. Papai respira fundo. 

  — Lá vem esse moleque outra vez — resmunga. — São oito da noite de uma quarta-feira, não podemos nem aproveitar um momento tranquilo em família. 

  — Não seja chato, papai — Ana estala a língua. — Ele é músico, precisa ensaiar. Não é nada de mais. 

  — Depois de um longo dia de trabalho, a última coisa que quero é ouvir essa algazarra — papai retruca. — E tenho certeza de que não sou o único incomodado. 

  — Estou contigo nessa — declaro. — Castiel não tem escrúpulos, só liga para ele mesmo. 

  — Vocês são dois implicantes. Pelo menos ele toca bem. 

  — Ele poderia ser o Slash. Isso não são horas de fazer tanto barulho. Uma das duas poderia ir até lá e pedir para que ele diminua o volume? 

  — Eu vou! — minha irmã se prontifica rapidamente. 

  Reviro os olhos enquanto ela vai em direção a porta com seu micro pijama, sumindo no exterior. Tudo fica em silêncio por um tempo. Ariana retorna, sorridente. 

  — Prontinho. Viu? Não precisam reclamar tanto. 

  Então, o som da guitarra volta a ecoar pelo ambiente, alto como se Castiel estivesse na nossa cozinha. Bufo, largando o lápis sobre o caderno de matemática. É impossível me concentrar dessa forma e já não sou boa nessa matéria. Me levanto do sofá, decidida a resolver o problema por conta própria. Atravesso o nosso gramado e o gramado dos Chase, e toco a campainha. Aguardo de braços cruzados e cara fechada. Castiel sustenta um sorrisinho malandro ao abrir a porta, a guitarra vermelha pendurada nas costas pela larga alça preta. 

  — Me perguntei quanto tempo demoraria para aparecer, garotinha. Até que foi bem rápido. 

  — Tem noção de que horas são? — questiono com irritação. 

  — Oito e quinze, e o som é permitido até às dez. Estou dentro da lei. 

  — Está incomodando minha família. 

  — Mesmo? Sua irmã não parecia incomodada.

  — Está incomodando a mim e ao meu pai. 

  — Não diga! — ele leva uma mão ao peito, fingindo espanto. — É uma pena que o mundo não gire ao redor dos Greene. Estou na minha casa e dentro do horário permitido, não podem me impedir de tocar. Se estão tão incomodados arranjem uns tampões de ouvido, você e seu velho. 

  Cerro os punhos ao lado do corpo, ainda mais irritada. Esse garoto me faz soltar fogo pelas ventas. 

  — Deveria botar isolamento acústico na casa, assim não torturaria nenhum vizinho com seus showzinhos indesejados. 

YOU ( ALT. VERSION ) Onde as histórias ganham vida. Descobre agora