Rotina

12 1 0
                                    


  Na cozinha, prepara o café. Quente, forte, servido em uma canecagenerosa com uma boa dose de leite. Não põe açúcar, pra cafeína 'durar mais'.Retira-se para seu quarto, seu escritório, seu universo particular. 

Pousa a caneca sobre a mesa atulhada, uma boa representação decomo sua mente funciona. Por que engavetar e arquivar tudo que ela usa otempo todo? Se sua mente é uma grande bagunça, com ideias jogadas a esmoe criando conexões impossíveis, por que seu ambiente de trabalho tambémnão o seria? 

Liga o computador. Põe os óculos, abre o arquivo. Pensa que só lhe faltaum cigarro queimando num cinzeiro para aumentar o clichê. Mas não fuma,então descarta a ideia. Toma um gole de café e encara a tela, o ponto deinserção piscando, incessante, desafiador. 

Poderia começar com... não, não, como ousa pensar nisso? Argh.Prefere morrer a ser tão repetitiva. Então o quê? 

O branco da tela a cega, como se indiretamente lhe dissesse que elanão tem capacidade de cobrir aquele arquivo com palavras. Mas ela tem, esabe. Já fez isso antes. Então o quê? 

Outro gole de café, a frustração crescente. Onde estavam as ideias, amaldita inspiração que a tinha levado até lá? Procura suas anotações, quemais parecem hieróglifos, feitos no movimento do ônibus durante a volta pracasa, mas elas já não lhe dizem nada. Bufa. O café já gelou, as horaspassaram, as ideias se foram e a paciência já devolveu seu lugar ao sono. 

Desiste. Apaga a tela, deixando o computador ligado por puro descuido,apaga a luz e vai dormir.

 Está quase adormecendo quando elas vem, as palavras. Aos montes,correndo, corroendo. Satisfeita, porém, irritadiça, levanta-se, religa o monitor,bebe seu café frio e, mal olhando pro teclado, deixa os dedos voarem sobre asteclas e as ideias fluírem. Já é manhã quando se deita, mas a batalha contra atela em branco acabou e ela venceu. Pelo menos até o próximo capítulo.  


Caderno de SegredosWhere stories live. Discover now