CAPÍTULO 2

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  - Ah! Bem-vindos, bem-vindos! – um senhor com uma careca lustrosa, tufos de cabelos brancos perto das orelhas e um nariz enrugado abriu os braços à visão da família Vincenzo. – Estávamos esperando por vocês!

O lado de dentro do antigo prédio de tijolos era gelado e cheirava a mofo e lustrador de móveis. A luz solar não era tão forte ali, nem as risadas de reencontro dos amigos do lado de fora. Renata foi obrigada a retirar os óculos escuros, pendurando-os no decote da regata branca e transparente que usava. Com os olhos mais acostumados, pôde reparar na quantidade de freiras que circulavam por ali, conversando baixinho entre si, recepcionando algumas famílias e sorrindo para os garotos e garotas que entravam no colégio; uma delas olhou com bastante restrição para o seu bondoso decote.

- Você irá conhecer a todas pelo nome em breve, tenho certeza – o senhor disse com a voz agradável de um tio brincalhão, percebendo que Renata analisava as casadas com Deus –, mas hoje serei eu que irei mostrar o campus para vocês.

- Sr. Gonçalves, creio eu – Giuseppe ergueu uma das mãos. – Conversamos ao telefone. Agradeço mais uma vez por conseguir essa vaga de última hora.

- Foi uma honra, sr. Vincenzo , uma honra – os dois trocaram um aperto de mão firme e Renata revirou os olhos; ela estava acostumada àquela puxação de saco perto do pai, mas nunca iria perder o asco de ter que presenciá-las. O homem estranho se voltou para ela, sorrindo como se tivesse ganhado na loteria. – Sou o diretor do Colégio Interno Nossa Senhora da Misericórdia, Renata, e você pode sempre recorrer a mim se tiver algum problema.

- Posso começar agora? – Renata ergueu uma das sobrancelhas, em claro sinal de desafio; se os pais não iriam cair em sua manha, talvez a má educação resolvesse aquela situação. – Os meus pais estão querendo me enfiar em um maldito internato de freiras que cheira a mofo e a gente velha. O que você pode fazer quanto a isso?

O diretor do colégio olhou de Renata para os pais sem perder o sorriso.

- Então temos uma espirituosa entre nós!

- Eu diria possuída por um espírito maligno, mas espirituosa é um bom meio termo – o pai respondeu, sem perder a compostura.

- Bom, se estiver tudo certo, podemos começar a visita! Podem deixar as malas por aqui, elas serão levadas para o novo quarto da srta. Vincenzo.

- Eu não vou deixar as minhas coisas aqui, alguém pode me roubar – Renata reclamou, colocando um dos cachos dourados do cabelo na altura dos ombros atrás da orelha com raiva. Ela não acreditava realmente que pudesse ser roubada em um colégio de malditos burgueses endinheirados, mas não poderia perder a oportunidade de provocar os seus pais. – Vocês não podem estar fazendo isso comigo. Isso não pode ser verdade! Ok, eu já entendi, eu fui uma grande idiota, agora podemos acabar com esse teatro e ir embora para casa?

- Essa é a sua nova casa, querida – o sr. Gonçalvez respondeu, já começando a caminhar, sendo acompanhado por Giuseppe e Laura, que não se deram ao trabalho de responder a filha.

Aquela merda era de verdade. Aquilo estava mesmo acontecendo!

Renata ainda lançou um olhar magoado para as suas imensas malas caras, mas as deixou para trás quando os pais já estavam virando a esquina atrás do diretor; pior do que morar naquele lugar seria se perder dentro dele.

- ...esse é o prédio principal, onde a sua filha irá estudar das oito ao meio-dia – ela pegou o senhor risonho dizendo, já acompanhando os passos dos três. – No primeiro andar fica a administração, a papelaria, o xerox e esse tipo de coisa... as salas de aula ficam nos outros quatro andares.

O prédio revestido de tijolos tinha escadas estreitas que levavam aos andares superiores e murais abarrotados de recados da direção, convites para missas, feiras de estudantes e lembretes sobre o vestibular. As janelas pintadas de branco iam do teto ao chão, mas nem assim conseguiam iluminar decentemente aquele lugar, que estava gelado o suficiente para arrepiar os pelos claros nos braços de Renata.

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