XVII

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Anjo ou demônio?

  FOI PRECISO BUSCAR O PADRE na sacristia. Mas, com a quantia que Isabella trazia como ofertório, o homem não viu problemas em atendê-la fora de hora.

— Não vim confessar meus pecados — a jovem foi direta ao se ajoelhar no confessionário. — Vim suplicar vossa ajuda. Soube que realiza exorcismos, que possui conhecimento sobre o demônio.

— Que mal a assola, minha senhora? — ele perguntou com a voz gentil.

— Tenho uma suspeita, padre Lorenzo. Não se trata de um exorcismo, não preciso que expulse o demônio de ninguém.

— Vá em frente — ele a incentivou.

— Preciso saber se existe apenas um ou se é verdade que ele tem discípulos.

— Sim, é verdade.

— Padre, é possível que um desses discípulos... São anjos caídos, estou certa?

— Correta. Todos eles já foram anjos e serviram ao Pai Celestial.

— É possível também que algum deles ande pela Terra, usando a face de um homem bonito, contando mentiras e se passando por uma pessoa bondosa.

— Minha querida — o padre sussurrou curioso —, me diga como se chama esse indivíduo do qual você suspeita.

— Rafael.

— Rafael é o nome de um dos sete arcanjos — padre Lorenzo explicou. — Em hebraico significa Deus cura. Ele é o arcanjo enviado por Deus para ajudar a humanidade com todo tipo de cura.

— Então Rafael não caiu? — Isabella sussurrou decepcionada.

— Não, querida. Os sete arcanjos são mensageiros de Deus. Nenhum deles se rebelou contra o Criador.

Isabella ponderou por alguns instantes. Duvidava que Rafael fosse mesmo um arcanjo, porque um arcanjo jamais dedicaria seus dias a incentivar uma pessoa a fazer o mal. O problema é que ela não precisava descobrir somente sobre Rafael, também teria que desvendar quem era o demônio com o qual John havia feito o pacto, e se teria algum jeito de livrar o marido disso.

— Esse indivíduo está mostrando o caminho errado, padre, incentivando alguém a fazer o mal.

— O Arcanjo Rafael mostra o caminho correto para humanidade. Como tem tanta certeza que se trata de um ser sobrenatural, invés de um humano malicioso?

— Eu sei, padre. Tudo que posso dizer é que tenho certeza disso. Ele não é humano, mas caminha e interage como se fosse um, induzindo alguém a cometer os piores crimes com falsas garantias.

— Um anjo caído — o padre murmurou. — Quando Lúcifer se rebelou contra Deus, cobiçando ter maior poder, vários anjos o seguiram e o ajudaram na rebelião. Depois se instalaram entre os humanos, já que tinham livre acesso ao inferno e a Terra, e procriaram...

— Anjos podem se deitar com humanos? — Isabella perguntou ainda mais assustada, interrompendo o padre.

— Segundo as escrituras sagradas, vários deles procriaram com humanos. Essa é a origem dos nefilins. Dizem que o Grande Dilúvio tinha como fim extinguir essa raça, porém, por causa do acesso direto entre o inferno e a terra, eles se salvaram e continuam aqui.

— Sempre pensei que entre anjos não houvesse distinções, que não existia isso de homem ou mulher. Nunca imaginei que pudessem ter filhos.

— Eles aprenderam como fazer isso — o padre explicou a surdina, como se revelasse um segredo muito pesado. — Dois anjos caídos foram expulsos do céu por se apaixonar. Assim como os homens, anjos também possuem o livre arbítrio para escolher que caminho seguir.

— Padre, como saber se esse anjo é mesmo um anjo mau, se ele segue Satã ou só vaga pela terra?

— Querida, já ouviu a frase "Quem não é comigo é contra mim" de Mateus (12:30)? Quem não está com Deus e não segue seus caminhos, está a favor de satã.

— Até mesmo o anjo que caiu por amor? — ela questionou. Estava pensando se Rafael não era um desses... Não! Não poderia se deixar iludir por ele. Que tipo de anjo induziria John a tantas maldades? Rafael não era do bem. Se algum dia tinha sido, isso ficou no passado.

— Os anjos que foram expulsos por se apaixonar estavam caindo na tentação da luxúria, um dos sete pecados capitais. Os conhece, não é mesmo?

Isabella respondeu que sim. Havia uma pergunta que ela precisava fazer. E valeria tanto para Rafael quanto para o demônio que fez o pacto com John.

— Como matar esse anjo caído? — ela quis saber, arriscando tudo. O amigo de John poderia estar ouvindo a conversa de algum lugar. Se essa suposição fosse verdade, ele faria com que John a matasse antes que Isabella pudesse dizer ao marido que Rafael não era de confiança.

— Minha jovem, anjos caídos, demônios, como queira chamar, são criaturas imortais. Não há como matar um imortal.

— Então ele ficará pela terra conforme sua vontade? — ela perguntou sentindo o peito apertado. Não podia ser verdade. — E tudo que dizem sobre exorcismo?

— O exorcismo é realizado para afastar o demônio, é preciso muito estudo para fazer isso. É um rito perigoso. E é feito para expulsar o mal de uma pessoa que está em estado de . Entende? A esconjuração não mata o inimigo, apenas o afugenta de perto da pessoa possuída.

— O senhor poderia fazer um exorcismo?

— Eu precisaria de provas para apresentar ao Vaticano. Um feito desse tipo requer autorização e bênção.

Isabella soltou o ar pesadamente dos pulmões. Não teria tempo nem meios para recolher evidências de que Rafael estava manipulando John. Ele a mataria antes que ela pudesse voltar à igreja, caso tentasse algo ousado. Ela teria que arranjar outro jeito.

— Padre, tem algum conselho para me dar sobre como proceder com esse ser? Não quero piorar as coisas?

— Me leve até ele...

— Não posso! Ele me mataria se suspeitasse. Terei que dominar o pensamento na sua presença.

— Pode ser um engano — padre Lorenzo sugeriu com o tom de voz amistoso.

— Não é!

— Tente água benta — o padre sugeriu.

— Água benta... — ela sussurrou. Aquilo só levantaria suspeitas.

— Não precisa jogar água benta contra o indivíduo. Pode fazer com que ele beba ou toque por acidente. E, outra coisa muito importante: nunca tente agredi-lo com punhais, facas, adagas ou espadas, jamais levante-as para ele. Foram dois demônios que ensinaram a humanidade como fazer e usar espadas.

— Entendi — Isabella murmurou ainda mais apavorada.

— Mas existem dois demônios que são imunes à água benta. Lembre-se disso.

Ela levaria o padre agora mesmo com ela se Rafael não fosse capaz de matá-lo num instante. Tudo estaria arruinado — suas vidas e a chance de salvar John.

Tentando disfarçar e camuflar todos os pensamentos sobre a conversa com padre Lorenzo, e com as garantias de que o procuraria em breve, Isabella acompanhou o marido para a casa de seus pais.

Tentando disfarçar e camuflar todos os pensamentos sobre a conversa com padre Lorenzo, e com as garantias de que o procuraria em breve, Isabella acompanhou o marido para a casa de seus pais

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Azul... TRILOGIA IRRESISTÍVEISOnde histórias criam vida. Descubra agora