Capítulo 16

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E quando chega a noite e eu não consigo dormir

Meu coração acelera e eu sozinha aqui

Eu mudo o lado da cama, eu ligo a televisão

Olhos nos olhos no espelho e o telefone na mão

A Noite –Tiê

Capítulo 16

Fred

Saio tão sem rumo que quase esbarro em Ceci na porta, ela me olha segurando duas xícaras de café e um sorriso no rosto.

-Vem cá, menino. Preciso te contar uma coisa. -Senta em uma das cadeiras de balanço da varanda e me estende uma das xícaras. Não falo nada. Tomo um gole do café observando ainda que distante Ane brincando com as meninas. -Sabe, Fred, o tempo passa e as pessoas pensam que o dinheiro pode apagar as memórias dos outros. Quando eu era somente uma criança com poucos anos a mais que Gabi, sua mãe e eu brincávamos nessa imensidão verde aqui da fazenda. -Fala me surpreendendo. -Eu achava engraçado aquela menina ficar vermelha igual tomate. -Sorri com a lembrança. -A família dela chegou aqui pedindo trabalho e ainda lembro que mal tinham a roupa do corpo. Nós não tínhamos muito, mas mesmo assim lembro da minha mãe doou algumas coisas para amenizar um pouco aquele sofrimento. -Limpa algumas lágrimas e apenas ouço absorvendo tudo. -O tempo passou e nos tornamos melhores amigas. Éramos inseparáveis. Até que a sua avó a levou para morar na cidade. Foi aí que tudo mudou. Cada vez que

Morgana vinha para nos visitar ficava ainda mais diferente, estava arrogante e não me tratava mais como igual, passei a ser a empregada pra ela. Quando casou com o seu pai nunca mais vi vestígios da minha amiga naqueles olhos. A arrogância e soberba tiraram tudo de bom que havia nela. O dinheiro a fez esquecer quem era e de onde veio. Vocês nasceram e tudo ficou pior. Ela não perdia a oportunidade de desfazer da minha filha, tratando-a como um ser insignificante. Sentia prazer em me humilhar e nos machucar. Eu podia ir embola com o Cláudio, mas para onde iríamos? Vivemos a vida toda aqui e tínhamos uma filha pequena para criar. Então tentamos protegê-la dos ataques verbais da sua mãe. Só então descobri que Morgana se sentia atormentada quando colocava os olhos em Ane porque a minha filha era o retrato dela quando criança, ela mentiu para si mesma, criou uma ilusão e acreditou nela a ponto de querer separá-los. Mesmo assim vocês se apaixonaram, desde crianças eu via os olhinhos brilhando quando olhavam um para o outro. Pedia tanto a Deus que eu estivesse errada, porque sabia que apesar de lindo, esse amor traria muito sofrimento. E estava certa!

-Eu não fazia idéia, Ceci. -Falo realmente espantado. -Meus pais nunca me falaram sobre isso. -Passo a mão pelo meu rosto. -Mas me fez enxergar com clareza o quanto minha mãe é hipócrita e egoísta. Não consigo acreditar que ela fez tudo isso somente soberba.

-Te contei isso para que soubesse que não é só você tem motivos para estar amargo e magoado. Ela era a minha melhor amiga, Fred. Morgana era a irmã que eu nunca tive e traição de irmãos marca a gente pelo resto da vida. Acha que não dói muito saber que ela causou tudo isso? Que fez a minha filha comer o pão que o diabo amassou? Pois vou te falar: Dói! Dói muito! Às vezes me culpo por não ter ido para bem longe! Até cogitamos quando Ane era adolescente, mas na época não tivemos coragem. Ela já te amava, meu filho. -Fala com os olhos nublados por lágrimas fazendo-me sentir um aperto no peito. -Eu sei que está doendo, não desmereço a sua dor. Mas às vezes, a única saída é parar de pensar no " e se " e seguir em frente, mesmo que isso não seja a coisa mais fácil a fazer... mesmo doendo devemos erguer a cabeça e enfrentar tudo.

-Olhar para Lise é como ser apunhalado e a dor não parar nunca. -Desvio o olhar dela. - Penso em tudo que perdi, tudo que podíamos ter vivido juntos Se... não consigo aceitar! -Brado dando um soco no braço da cadeira.

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