Capítulo 1: Parte III - O Dia de Roma

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– Desejo que vá ao paraíso quando o som dos sinos cessar. – o anjo fechou os olhos.

O garoto tornou-se imóvel com uma estranha sensação de anestesia, Cain sofreu a primeira chaga representada pela ausência de dor, o espírito começava a se desprender do recipiente carnal. O menino resmungou palavras que eram quase inaudíveis e que, para o anjo, não faziam nenhum sentido.

Gabriel abriu os olhos e Cain perdeu o dom da fúria, seu ódio cessou, não sentiu raiva mesmo se matassem sua família repetidas vezes em sua presença. O menino ajoelhou-se, mais e mais prostrado.

– Agora, você não consegue nem mesmo sentir ódio por mim, o seu coração não quer mais mostrar isto à você. – o anjo de cabelos dourados adotou um olhar diferente, um olhar penetrante, os olhos levemente abertos além do normal. – Onde está toda aquela força de vontade, querido Cain?

Cain, mesmo um adolescente, sentiu uma estranha calma em seu coração, sabia que tinha uma emoção que não havia sido tirada de sua alma doída: a tristeza. E mais um movimento de mão foi feito. O jovem garoto não era mais capaz de esboçar descontentamento, apenas um vazio que não conseguia explicar permeou em sua mente, pois estava sem motivos para estar feliz.

Gabriel julgou que o menino estva acabado, inerte, e em sua mente, o único pensamento ao agitar seu braço era o de arrebatar o menino com as próprias mãos, levá-lo de vez à morada de Eliom. Contudo, quando o anjo acabara de falar, percebeu que o som do Ângelus continuava a tocar, foi quando este percebeu que o seu poder não conseguiu tirar os sentimentos de Cain totalmente.

Chocado com o que viu, o anjo questionou à si mesmo dizendo que, há alguns segundos atrás, o garoto havia morrido por dentro e que só restou uma casca vazia e morta. Gabriel sentiu a sua respiração acelerar.

– Isso então significa que os sinos do Ângelus não roubaram os seus sentimentos totalmente, ou será que... Não! É IMPOSSÍVEL! – o anjo observou que o garoto se levantava vacilante, mas com um olhar ainda mais vazio e escuro, com uma força de vontade mais que inabalável.

Finalmente a espiritualidade de Cain, a alma do eleito, havia se manifestado, e em nenhuma das outras eras notou-se um despertar tão rápido e poderoso, nem mesmo em eras celestiais quando ainda não havia humanos na terra.

Alguns minutos depois, o anjo encontrou-se em um estado de admiração profunda, pois seria a primeira vez que um ser humano havia adquirido tamanha santidade em tão pouco tempo.

– Eu não sou fraco! – um estrondo estourou toda a paisagem criada pelos sinos de Ângelus. Cain recebeu de volta todos os seus sentimentos.

"O ar se intensificou ao redor dele... Mas então, só pode ser"

Gabriel observava o fenômeno abismado, aquela era a primeira vez que um eleito despertava desta maneira.

– É verdade, então parece que ele não foi tão imprudente em escolhê-lo, certo? Às vezes até nós podemos ser tolos diante do olhar de Deus. – o anjo sorriu, abaixando os braços.

O garoto desmaiou exausto após a manifestação que ocorreu em seu corpo e espírito.

Um novo dia amanheceu na Sicília deixando para trás aquela noite feita de uma estranha mistura entre tragédia e esperança, pois esta significava que as forças de proteção da terra já estavam se armando, começando pelo seu principal eleito, Cain, o garoto que sofreu as provações de um anjo.

Em Roma, o Papa reuniu todos os cidadãos que moravam nos arredores da grande basílica, o templo de Eliom, para discursar sobre os últimos acontecimentos e sobre a grande guerra que ameaçava envolver até aqueles que moravam nos arredores da cidade.

Cain - O Legado Dos SantosWhere stories live. Discover now