Capítulo 28

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  As dores que invadem o corpo causam uma dor que não é de fato física, é uma dor do coração, são as palavras que não foram ditas, as lágrimas que não foram derramadas, são os amores mau resolvidos, são as coisas que se evitam confrontar, até que evitar se torna fugir, até que todas as coisas estejam o mais fora do controle possível, até que esteja sentada no chão frio do cômodo chorando sozinha. 

 Palavras, são as armas mais crueis no qual não se tem munição suficiente para revidar. E quem afinal consegue devolver palavras tristes quando sua dor está em primeiro patamar.

  Esquecer é o que todos anseiam, uma ansiedade cálida e sufocante que não é atendida no momento que se quer, esquecer nem sempre é a solução, não é solução agora. È uma válvula de escape que está fora do alcance de quem o quer.

  È isso a dor, um conflito triste de sentimentos, um desesperador e incessante confrontar de coisas que não quer enfrentar.

  Poeticamente a dor é poesia, é palavras rimando, é sincronia de autor e dor, está ali muito mais do que se vê, mas quem não poetiza, apenas vive a dor com a mesma intensidade de sentimento, porém sem o mesmo talento de rimar.

  Ainda á coisas para se desvendar...

  Enquanto Ana apenas deixava suas lágrimas lavarem o rosto pálido, as pessoas queridas que a acolheram tentavam de maneiras duvidosas e frustrantes anima-la. Ela chorava por tudo, por todos, talvez por nada.

 Coisas que estão fora do alcance de qualquer um, fora do alcance dela. E situações que não serão resolvidos, é a vida dela em jogo, seu futuro duvidoso é um fantasma que a acompanha em tempo integral. Sua vida mal resolvida, seu amor não enterrado, seus pais que não voltaram.

 Medo, qual é a definição no dicionário não sabia dizer, porém poderia afirmar certamente que era algo que conhecia como um velho amigo. Um amigo de quem ela não gostaria de ser tão íntima.

 Se encarar tudo isso, incluindo a confusão causada pelos olhos escuros de Tom, e pelas palavras que não conseguia de jeito nenhum distinguir do velho casal a rodeando. Ela certamente poderia considerar um desmaio forjado uma ótima escapada.

  Se ela considerar quem vai socorre-la (leia-se Tom) ela com certeza saberia que a melhor alternativa não era essa.

  De todas as confusões em que foi protagonista nenhuma poderia ser tão patética quanto seu papel digno de Oscar de atriz coadjuvante, de olhos enormes vermelhos e com um rosto tão vermelho que não é de se admirar Tom não ser apaixonado por ela.  

  Quantas vezes aquele homem a viu chorar? Uma ? Duas? Cinco? Já estava se tornando uma cena tão normal para Tom, que na visão de Ana nem se ela desfilasse com seu melhor sorriso, nem assim, faria aquele homem esquecer a vida patética de Ana Júlia.

  Ah claro, deve-se levar em conta que além de todas as cenas catastróficas em que ela era a incrível protagonista, tinha seus momentos onde deixava a dignidade e delicadeza de lado para comer como se não houvesse amanhã, ou para ser mais clara, como se não houvesse outra oportunidade de comer algo diferente de lanche e macarrão instantâneo no dia de amanhã. Esclarecido esse fato de grande relevância para sua defesa, Ana então se viu frágil e pequena.

Os olhos escuros que a fitavam de forma quase discreta pareciam uma câmera registrando cada passo em falso, e isso era pior do que pisar em ovos. Uma frase literária, porque pensando bem, Ana certamente concluiria que não conseguiria pisar em ovos, nem em grama ela consegue pisar, quanto dirá em ovos.

 Reanalisando seus devaneios, a dor que outrora começou com pensamentos triste e sensação de vazio, deu lugar a um sentimento diferente, a um rubor exasperado que mostrava claramente para todos que sua dor agora estava em outro nível, estava na vergonha.  Sim, vergonha, porque com tantos olhares a encarando a única pessoa que parecia ler claramente cada pensamento confuso estava ali sorrindo bem á sua frente. Um sorriso debochado e diferente dos sorrisos gentis que estava acostumada. Ela nada mais parecia do que uma parede transparente em que tudo que estava em si era mostrado sem pudor.

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