Onde nascem as manhãs - Final

12 1 0
                                    

Perder a referência de um sonho não faz parte do repertório de sentimentos que uma pessoa sã gostaria de ter. A expectativa de acreditar que tudo o que se quer está em comunhão com o sagrado que existe em nós. O rio da vida nunca faz o mesmo trajeto por mais que possa nos levar ao destino aguardado.

A alvorada de possibilidades se mostrava diariamente, mas eu não estava disposta a despertar. Dentro de mim a urgência de aumentar a velocidade do tempo e, com ela, trazer as soluções mágicas capazes de me resgatar de tudo aquilo que criei.

Quando decidi me privar do contato com a estrela da manhã e abri mão do prelúdio do dia, eu sabia que estava fazendo o mesmo com a anunciação da noite. Despedidas me partem o coração. Transições nunca foram atrativas para mim, pois sempre acreditei que é possível evitar qualquer dor. Caí em minha própria contradição. Toda a minha existência pulsava num ritmo profundo e angustiado que fui capaz de experimentar, de uma só vez, um arsenal de dores.

O vácuo da ausência. O sono incompreendido. O sorriso de desespero. A respiração lúgubre. Sonhos pueris. Tudo perdeu o significado... Assim, instantaneamente.

As manhãs nasciam e morriam todos os dias, enquanto eu apenas existia. Não tive pena de mim, nem tampouco culpei qualquer criatura que fosse. Algumas vezes, deixei rolar um pranto silencioso, entreguei-me a um estado deprimente de luto. Sem querer, eu me despedia de mim. Sem perceber, eu estava sepultando a minha vida, mesmo sabendo que meu corpo continuaria existindo e, a cada minuto, eu era menos eu. Fui aprisionando a dor e aprendendo a conviver com o vazio. Se todas as escolhas feitas até aqui me fizeram retornar à enseada que abriga a estrela da manhã, o que os anjos queriam me mostrar?

#300 PalavrasWhere stories live. Discover now