Pós Produção

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Twitter: ISBB5H



Pós Produção

Primeira tomada: "Pior que a total agonia de estar apaixonado?" (Love Actually)

Eu sempre fui assim. Me apaixono nos dias pares e me desapaixono nos ímpares. Vivo, sinto, idealizo e produzo amores. Efêmeros, sazonais, sintéticos, todos eles. E então cometi o maior dos erros, quando como de costume, ao me apaixonar por minha atual obra, inclui nesta equação um outro alguém. Oscar Wilde disse: "podemos passar anos sem realmente viver e de repente toda a nossa vida se concentra em um só instante", e foi o meu instante cristalizado nos olhos de Camila.

Pela primeira vez em toda a minha vida eu pude verdadeiramente compreender a magnitude do apelo que os amores de cinema podem exercer sobre as pessoas. Sim, são carregados de seus exageros, maquiagens e emocionantes trilhas, mas é também verdade o que dizem sobre a arte que imita a vida. Pois amores de cinema são também amores reais. Possíveis. Que nascem de encontros casuais, de conversas fáceis ou daquele curto instante de coragem. Nascem da improbabilidade, da casualidade e do inesperado, como aconteceu entre Camila e eu.

O acaso me fez descobri-la e descobrindo-a me apaixonei.

Sem a intenção de fazê-lo ou ao menos querê-lo, deixei que essa paixão transparecesse em cada olhar trocado, em cada gesto e segundo de atenção que eu lhe dava. Deixei que o nosso sentimento florescesse, ignorante do fato de que tudo, absolutamente tudo em que o dinheiro lança suas garras, torna-se marionete nas mãos das grandes industrias, inclusive talento e amor.

Simon foi um dos primeiros a perceber. Assistiu nossa entrevista e chamou-me para uma longa "conversa". Me convenceu de que o melhor para o filme era deixar que os espectadores e a imprensa sonhassem com a possibilidade de um romance entre os protagonistas, e não de um caso de amor entre uma atriz e sua diretora. Me convenceu de que o melhor para o filme era que eu não me envolvesse sentimentalmente com alguém do elenco, livrando a todos da possibilidade de um conflito de interesses. Me convenceu por fim de que o melhor para o filme era também o melhor para a carreira de Camila.

Ela era jovem. Belíssima. Talentosa. Ainda pura e inocente para este sujo meio, mas poderia descobrir tantas belezas e riquezas se ao menos tivesse as oportunidades certas... E quem seria eu para estragá-las? Se eu me metesse entre os interesses dos produtores e Camila, ela seria, segundo as ameaças, a maior prejudicada.

Simon me convenceu de que o melhor para todos era deixá-la ir e eu deixei.

Foi a mais difícil decisão que já tive que tomar. Senti que um pedaço fora arrancado de mim quando a encontrei adormecida em minha porta no corredor do hotel. Senti meus membros incendiados quando dormimos abraçadas naquela noite. Senti meus órgãos se derreterem quando a ouvi chamar o meu nome enquanto sonhava. Senti meu coração se quebrando quando, na manhã seguinte, eu parti.

Me apaixonar foi definitivamente o pior erro de toda a minha vida.

[...]

Segunda tomada: "Posso te sentir me esquecendo." (Charlie St Cloud)

A cada vez que o sino soava e a porta era aberta, o vento se encarregava de me despertar do estado de torpor provocado pelo excesso de bebida. O frio de Londres era cruel e os canecos de cerveja eram grandes, largos e surgiam sempre cheios a minha frente. – Oh, faça-me o favor! Aquele filme é um verdadeiro clássico.

– Um bruto massacre sem fim. Não entendo como podem chamá-lo de obra prima. – Minha irmã retrucou a afirmação anterior remexendo-se na cadeira. Todos em nossa mesa gritavam como loucos, embora não houvesse um único grupo naquele bar que não estivesse fazendo o mesmo.

GravandoWhere stories live. Discover now