Capítulo 3

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Terceiro capítulo

Assim serviu Jacó sete anos por Raquel; e estes lhe pareceram como poucos dias, pelo muito que a amava.

GÊNESES 29.20

Um ano havia se passado desde a minha chegada. Celle havia iniciado um tratamento com quimioterapia. Era difícil vê-la passar por todo o desconforto, me trazia um sentimento de impotência. O tipo de quimioterapia não causava queda de cabelo, o que para ela era um grande alívio. Reagia bem ao medicamento, lutava com muita força, jamais reclamava de tudo aquilo. Ela não precisava provar que era forte, mas o fazia com uma naturalidade tremenda.

Jairo, que havia se casado algumas semanas atrás, veio com sua esposa. Queria saber como estava sua irmã. Celle e Louise se davam muito bem. Jairo, Carlos e eu fomos para a varanda, já Celle, Sarah e Louise ficaram no quarto, onde ela descansava. Achei oportuno o momento para anunciar ao pai dela que queria o casamento para o mais rápido possível.

Carlos achava que o momento não era o melhor, a condição em que Celle estava era desconfortável para uma mudança tão grande. Na verdade, também pensava nisso, mas achava que para ela seria uma forma de aliviar as dificuldades. Eu pedi que Sarah fosse chamada, ela também precisava saber. O que nos surpreendeu, foi que Sarah concordava com a decisão, acreditava que era o que a filha mais queria. Talvez também o que mais precisava.

Jairo, que havia casado tão recente, já me dava os parabéns. Ele se tornou um grande irmão, um bom cunhado, era importante para mim. A decisão havia sido aceita. Carlos mesmo com toda preocupação não deixou de mostrar que estava feliz. Decidimos aguardar um dia em que Celle estivesse mais disposta.

Aconteceu em um dia lindo, no velho carvalho, onde eu havia posto um colar preso em uma dos galhos, ficava ali pendendo. Nele, presas duas alianças. Não seria muito difícil para ela poder descobrir o objeto. Celle não desconfiava, creio que apenas desejava aquele momento todas às vezes que estávamos lá. Ela caminhou com um pouco de dificuldade, o medicamento a deixava um pouco debilitada, ainda assim, o seu sorriso era presente.

Quando chegamos, falei sobre minha chegada até ali, como nos vimos pela primeira vez, como ela me fez ficar vermelho, como montei cavalo todo sem jeito, falei de todas às vezes que sorrimos, sobre os momentos difíceis, e como ela me ensinava que sempre posso melhorar, que ela é um referencial.

Seus olhos brilhavam, nada falava, apenas esboçava um sorriso que ia se transformando em um riso que não tinha como não se apaixonar.

O meneio de sua cabeça, a graça com a qual se movia. Em um momento ela abaixou o rosto, havia apenas uma linha de sorriso muito discreta dessa vez. Nunca vi Celle ficar tanto tempo em silêncio. Foi no momento em que ela estava por dizer o que pensava que o brilho daquele objeto curioso, chamou sua atenção. Ela simplesmente me olhava, mudava o olhar para o colar. Levou um tempo para que tocasse o objeto.

Com o olhar sério e sereno, parecia não estar acreditando. Não precisava de palavras, entendeu o que estava acontecendo. Depositou o colar em uma das mãos.

Aquele olhar apertado, a covinha no canto da boca, cabeça levemente inclinada, me fez ter certeza que ela estava mais feliz que imaginei que fosse possível deixa-la.

Celle por um momento parecia ter me esquecido, olhava para o par de alianças preso ao colar. Ela o abriu, retirou-as.

Me abraçou, seu abraço revelava tantas coisas; mostrava admiração, afeto, confiança e, ao mesmo tempo; culpa.

- Você é incrível, sabia? - mostrei minha admiração.

- Sim! Eu sei... Eu sou incrível. -Ela disse sorrindo.

- Marcelle, sou o homem mais sortudo do mundo, mas creio que você pode melhorar isso! Aceita se casar comigo?

- Não sou muito exigentes então claro que eu aceito.

Tudo aconteceu da forma mais perfeita possível. Ficamos noivos naquele dia, não podia ficar melhor.

Os motivos que me levaram a viver essa jornada, aos momentos difíceis, a saudade de casa, o desejo de voltar a caminhar...

Tudo estava congelado. Meus sonhos com a Celle estavam apenas começando, muita coisa ainda precisava acontecer.

Os exames traziam bons resultados. Celle parecia estar reagindo bem ao medicamento. Assim as coisas foram indo, até que um dia enquanto estávamos caminhando.

De repente:

Diante dos seus olhos, tudo se escureceu. O socorro foi muito rápido no atendimento. Celle foi levada para uma unidade de tratamento intensivo. As primeiras horas foram as mais angustiantes. Jairo e sua esposa estavam ao meu lado, e como isso foi importante....

Após algumas horas angustiantes , recebemos uma notícia que nos deixou preocupados: Celle estava em um coma profundo, não havia muitas esperanças. Em um quarto separado, com cuidados intensos, tudo acontecia sem que pudéssemos fazer qualquer coisa, apenas as nossas orações poderiam servir no momento. Uma tarde inteira se passou, até que fui informado que o quadro era estável. Fui permitido a ver a minha noiva, era um tempo muito curto. Aqueles momentos em que estive com ela, vendo-a imóvel, sem cor, sem o sorriso sempre presente, foi o que mais me deixou desesperado. Nada se comparava ao seu sorriso, sua voz empolgada, suas brincadeiras, o jeito tímido de me olhar, sua capacidade nata de me alegrar quando me encarava com o olhar que guardava tanta beleza, que emanava tanto amor....


No caminhoWhere stories live. Discover now