Capítulo 4 - Família

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"Antes de nascer novamente, é preciso morrer..." – Lucy Iordache.




Jasenovac – 1943 – antes do fim


Entrando pela janela do dormitório do Cabo, rastejo até sua cama. Ele acorda, pressentindo minha chegada e estica o braço para pegar a arma na mesa ao lado da cama. É tarde demais, já estou com sua pistola encostada em sua têmpora. No móvel ao lado há uma lamparina, a bola incandescente ilumina parcialmente o ambiente. O querosene velho causa essa coloração em tom amarelo-mostarda, deixando um cheiro peculiar e intragável.

— Por favor, não dê chilique, Cabo Ionan. — Ele vira seus olhos para mim e depois o rosto, devagar. — Agora, me diga onde está Mirian Wazowski? Para que setor vocês a levaram?

Ele me olha inteiramente antes de responder. Minha roupa rosada ainda traz a marca de minha fuga, do sangue de seus homens. Seu rosto fica pálido, muito mais alvo do que minhas vestes, como que não acreditando que estou ali, diante dele.

— Você é aquela da sala 22?

Ele me pergunta quase sem acreditar no que vê. Eu sorrio forçosamente, mostrando minhas presas.

— É realmente impressionante sua regeneração.

— Quero saber de Mirian Wazowski.

— Eu não guardo nomes, terá que ser mais específica.

— Você a levou pelo braço até o dormitório seis e estava lá quando rasparam os cabelos louros encaracolados dela.

— A cigana? — Ele fecha um pouco os olhos e sorri. — Ah sim, agora lembrei quando busquei vocês duas naquela toca. Você é a porca romena.

Eu aperto a pistola.

— Se atirar, vão ouvir, esse lugar terá dezenas de soldados em minutos.

— Se eu atirar, você morre. Acha que me importo com os soldados?

Ele engole seco.

— Ela não tinha tanta serventia, a classe dela vai trabalhar nas roupas e fornalhas.

— Ela não está mais lá, para onde a transferiram?

— Agora? Você não soube? — fala um pouco nervoso.

— Saber do quê?

— Você ficou muito tempo na sala 22, não poderia...

Saber do quê?!

— Dois dias atrás, houve um superaquecimento nas fornalhas, causou uma explosão. Se não está trabalhando, está na vala mais recente.

Uma furtiva lágrima cai em meu rosto. Sinto uma forte dor no peito se misturando ao desprezo pelo homem à minha frente. Fecho os olhos com força e me controlo para ainda questioná-lo.

— Como chegaram até nós?

— A Ustase é ótima para encontrar ratos, mas vocês se multiplicam rápido demais, é difícil fazer a limpeza. Pelo menos as vezes encontramos espécimes úteis para os estudos, nossos soldados serão ainda melhores.

Respiro forte, olho para o lado. Aperto a arma com força sobre a cabeça dele, que afunda no travesseiro.

— Me matar não vai trazê-la de volta. — Ele diz, suando como um animal suplicante, seu cheiro exala me deixando enojada. Quando estou alimentada, todo cheiro fica mais forte, quase intoxicante. Eu o olho em seus lençóis azuis-celestes e pijama de algodão, suas mãos para cima o colocam totalmente entregue.

Sob controle - (Lucy, Livro 1)Where stories live. Discover now