A besta de Gévaudan

532 50 36
                                    


DIAS DE MEDO'

"Percebe o que é?" Leroy perguntou a Noel após alguns minutos de reflexão. As chamas das velas nos castiçais, dançavam pela pele clara do amante, criando sombras e deixando-o com um ar quase lúbrico. Era um convite para que o Guarda Caça voltasse ao leito e o amasse pelo resto da noite.

"É uma missiva." Noel balbuciou. Os olhos perdidos na bela caligrafia. "Do próprio Rei." Ele estava boquiaberto, mal contendo o espanto. "Prometeu-lhe um título de nobreza..."

"Sinto-me importante ao ser contatado para algo de grandiosa magnitude." Ergueu-se do assento, buscando por um cálice de vinho, exibindo a nudez ao caminhar até a adega.

Noel mordeu o lábio inferior, sentindo palpitações ao contemplar o corpo robusto de Leroy. Embora estivesse muito tentado a puxá-lo novamente para os lençóis, a preocupação sobrepunha qualquer desejo carnal naquele momento. E os dedos apertaram o papel com certo temor pelo futuro. Ainda não queria se despedir.

"Não está pensando em aceitar, está?" A voz baixa não foi capaz de esconder a inquietação que carregava no peito. "É perigoso, Leroy. Essa coisa-"

"Um lobo, amado meu, um lobo." O Guarda Caça o corrigiu. "Uma besta que está tirando o sossego de homens e mulheres de bem. Pensas tu que não farei nada a respeito?" Arqueou uma grossa sobrancelha, encarando os olhos verdes como jade do amante.

"Mas colocará tua vida em risco por essa gente que nem conhece!" Noel se levantou, atarantado, em busca de trazer juízo ao homem que amava. "É como disse. É uma besta. Matou crianças de maneira que chego a me arrepiar, pense no que a criatura não fará contigo?" Levou a mão trêmula para tocar o rosto com barba por fazer, contornando o maxilar com os dedos pálidos.

"Acalma-te, coração, não há de acontecer nada comigo." Leroy o confortou, trazendo-o para os braços, aproveitando para inspirar o perfume o qual sentiria falta nos dias que ficassem longe um do outro. "Sou o melhor Guarda Caça, caso tenha se esquecido." E de forma alguma aquilo era presunção ou falta de modéstia. "Voltarei com as glórias de um herói e poderei dar a ti um lugar melhor para viver."

O relacionamento de ambos era sigiloso, com encontros que aconteciam a noite e iam até a madrugada, isso, quando Noel conseguia escapar da casa do pai, o que tornava-se mais raro a cada dia.

"Perdão se pareço duvidar de tuas habilidades de caçador." Pediu baixinho. "Aconteça o que acontecer, eu o amo." Noel ergueu o rosto, buscando o calor daquele olhar apaixonado. "Jamais duvide."

Leroy o beijou de maneira cálida nos lábios, compartilhando o sabor doce do vinho e buscando confortá-lo.

"Não duvide tu que eu o amo também." Apertou o corpo menor nos braços, beijando-lhe os cabelos louros.

"Tenho medo que se machuque." Noel confidenciou, marcando os dígitos nos ombros coloridos por sardas do Guarda Caça. "Que farei eu sem ti?"

"Novamente eu lhe asseguro, não há com o que se preocupar. Voltarei em breve e o levarei comigo." E quando fazia uma promessa, ele sempre cumpria.

* * *

Leroy Belmont tinha fama por toda a Europa. Era um estrategista, um rastreador e um exímio caçador, tendo abatido feras que deixariam qualquer um com as pernas bambas e o coração falho. Ele não temia nenhuma besta selvagem, muito pelo contrário, ele se atraía pelo perigo, e quanto maior a lenda em torno do animal, mais ele se sentia impelido a caçar o monstro.

A pequena província de Gévaudan, vinha sofrendo constantes ataques de uma criatura grotesca e de pelagem avermelhada; um lobo. Um lobo maior que qualquer outro que já se houvesse tido notícia. Os assassinatos violentos, tomaram grande proporção e até mesmo o Rei Luís XV se interessou pelo caso, contratando os serviços do Guarda Caça.

Dias de Medo [COMPLETO]Where stories live. Discover now