A balada do paradoxo

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A festa do paradoxo continuava em alta, enquanto duas figuras de linguagem se amuavam no canto mais quieto do salão. Nunca funcionaram em multidões e, sendo assim, se satisfaziam em ver suas equivalente rodopiarem descontroladas e sorridentes ao dançarem freneticamente pela plataforma.

A onomatopeia dava tom ao barulho com um ritmo agitado, enquanto hipérbole gritava em alta voz as cancões guturais do passado em linguagem rudimentar. A comparação flutuava como um beija-flor e junto ao seu peito prosopopeia se derretia escutando as batidas do coração proveniente das paredes decoradas com elegantes cortinas.

A Metáfora, um garoto de sorriso torto, semelhante a uma canção quebrada, observava arfante toda aquela agitação. Imediatamente reconheceu em meio ao burburinho os velhos amigos, como a ironia, a elipse, o zeugma, além da saudosa metonímia e a divertida aliteração. Notou outros com quem já fora obrigado a trabalhar para dar sentido a textos que julgava de certa forma medianos ou, até mesmo, pobres em lirismo. Houve outros pares que lhe foram muito mais convidativos, fáceis de se dançar em sentenças breves e outras em pretéritos imperfeitos. De todo modo o garoto Metáfora se deixava cair na cadeira mal iluminada, enquanto observava, tamborilando as mãos no joelho, enquanto a garota Antítese, logo ao seu lado, olhava preguiçosamente toda aquela agitação.

Apesar de toda a prepotência dos julgamentos, a Metáfora sabia que nunca era o bastante. Suas características saltavam aos olhos para quem se dispusesse a realmente estudar tal conflito de lógica. A conclusão de qualquer educador era iminente: A metáfora é uma inquietude sem fim que nunca soubera gostar em segredo.

Apesar da presença constante nos textos, nem todos estavam dispostos a dançar com a Metáfora. As reclamações tendiam a completas oposições. Em ultima entrevista sobre os motivos que levaram a solidão da Metáfora diversas opiniões foram proferidas:

Paradoxo disse que por vezes era pesada como ferro, enquanto zeugma afirmou que era leve como pluma. Polissíndeto, falando a respeito do último contato, disse que por vezes era intenso e sem perspectiva, trazendo a melancolia ao ar.

A garota Antítese devolveu o olhar da metáfora com um sorriso, justamente para destacar a tristeza do momento. Ela, deslocada no tempo e no espaço das festividades, mantinha a luz no olhar e as trevas no peito, juntando em momentos oportunos duas palavras, ou dois pensamentos, para qualquer ocasião. E desta maneira retribuiu o convite de desejo do garoto Metáfora, pois somente deste modo fora ensinada como se comunicar.

- Quer dançar? — lhe perguntou a Metáfora 

- Não há maneira de se lutar contra a lacuna existencial, então não vejo motivos para que não. — lhe dizia enquanto estendia sua mão.

Escolheram um local de menos destaque das idéias e ali se entregaram as confabulações, enquanto manuseavam os corpos conforme o ritmo das partituras que derramavam murmúrios em alta voz.

- Você é um galanteador nato — acusou a Antítese para o seu par.

- Eu sou a designação de um objeto ou qualidade mediante uma palavra que designa outro objeto ou qualidade que tem com o primeiro uma relação de semelhança — riu o garoto Metáfora

- Você é um péssimo par — lhe confidenciou a Antítese com vontade de doar ao garoto algum elogio.

Em meio aos passos davam pausas e repetiam movimentos tais como espelhos em sincronia de histórias. Se uniam e repeliam, de acordo com a dose de expressividade do texto literário.

E quem disse que a Antítese não combina com a Metáfora?

Tudo era um completo desastre, sendo assim a Antítese riu, e a Metáfora beijou com gosto o seu sorriso. Entreolharam-se e o garoto, tal como um gato que se deliciou com o sangue de um canarinho, passou seus lábios sob os dentes vorazmente.

Selando o destino para não estarem juntos, se cumprimentaram formalmente em reverência.

Figuras de linguagem são assim, criaturas de pura de expressão, utilizados por um escritor, com o objetivo de ampliar o significado de um texto ou também para suprir a falta de termos adequados em uma frase, pois o texto sempre deve continuar, mesmo que o significado se perca entre as nuances da Antítese e da Metáfora.

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⏰ Last updated: Jun 29, 2017 ⏰

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A balada do paradoxoWhere stories live. Discover now