Capítulo 4 - Saudades

79 12 7
                                    



Eu queria ter a quem recorrer neste momento, para afogar todo esse nó que estava sentindo em minha garganta, poder gritar, rir, perguntar sobre a situação em que estava passando. Mas não tinha. Como já disse antes, João é meu melhor amigo, não tenho outros, além de poucas palavras, não tenho amigos. A quem eu poderia recorrer neste momento? Será que esse momento poderia, se ela estivesse viva hoje, ser dividido com minha mãe? Porque até o momento em que ela estava viva, não tinha passado por uma situação destas, muito menos ter sentido algo por alguém para que ela pudesse me dar uma palavra sobre como era essa confusão que hoje está meu estômago e mente.

Sério, parece que estou com uma crise de ansiedade que nunca tive antes. Parece que toda a ansiedade que dizem ter quando numa prova -e que eu nunca tive-, estão vindo à tona. Agora posso dizer como é sentir ansiedade. Mas também uma porrada de confusão.

Eu não estou sabendo lidar com tudo isso.

Sempre me preocupei com coisas que não fazem parte do mundo adolescente: cuidar para que minhas notas fossem sempre exemplares. Enquanto via o restante se preocupar com tendências de moda, com namorados, com sentimentos, com términos. Achava tudo aquilo tão supérfluo. Minha mãe, Anabelle, sempre achou isso em mim muito engraçado, mas nunca disse para fazer o contrário. Eu estava cuidando para que meu futuro não fosse naquela cidade, ou me estagnar. Eu não queria - não quero - ter que ficar aqui ou, não pensar em meu futuro. Eu penso. E talvez isso seja o que hoje me condena.

Estava deitada em minha cama pensando em como isso era estranho, tudo muito confuso. Algumas lágrimas brotaram em meus olhos e eu comecei a sorrir. Me lembrei dos momentos em que eu chorava por algo que, para mim, era algo confuso, amedrontador, na época em que minha mãe era viva: não entender a matéria. Ela me dava todo o carinho, cafuné e dizia que tudo ficaria bem. Talvez eu pudesse assemelhar aquele momento com este?

Eu me lembrei de como ela me apoiava nessas situações em que ficava muito enraivada pelo conteúdo não entrar em minha cabeça, mas que no final, dava realmente tudo certo. Pode parecer um tanto banal para você, mas para mim não é. Eu cuido do meu futuro e do meu ego. Gosto de me preocupar com isso, pois o que serei amanhã será graças ao que sou hoje.

Me recordo dos toques que hoje me faziam tremer as pernas. Os lábios que eu não conseguia parar de pensar.

Eu nunca tive sentimentos por João. Não aqueles que os casais têm um pelo outro, sabe? Eu sempre o vi como um irmão, aquele irmão para quem eu podia compartilhar aquela raiva, aquela angústia, aquela amedrontadora matéria ou professor e tudo o que poderíamos compartilhar como irmãos. Nunca, nunca, em momento algum, eu alimentei qualquer que fosse o sentimento por João. Nunca olhei para ele e pensei: que homão da porra.

João não é feio, longe disso. Algumas garotas no colégio suspiram por ele, mas ele nunca ligou muito para isso. Para ele o que importava sempre eram suas notas, e tudo o que fosse ligado ao seu futuro. Bom, era de aparência que eu estava falando, né? Nunca cheguei a sentir aquelas borboletas no estômago, como costumam dizer nos filmes, nunca. Muito menos por João.

Dá para entender o porquê de eu estar confusa e amedrontada com essa situação? Eu não entendo porque ele fez isso. Não consigo. João sentia algo por mim?

Eu não posso, não consigo sentir nada por ele! Ele não pode fazer isso comigo!

Não consigo me ver com João. Nem de longe, nem daqui a mil anos. Ele é meu amigo, meu melhor amigo, meu confidente, meu irmão.

Ah, como eu queria minha mãe aqui!

Coloquei minhas mãos no rosto e comecei a chorar. Queria respostas para o que estava acontecendo. Queria o cafuné de minha mãe. Queria aquela frase boba, que só com ela dizendo fazia sentido: "Vai ficar tudo bem."

Um dia escrevi...Where stories live. Discover now