CAPÍTULO 4 - A CARROÇA FANTASMA

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Ofegante, entrou na Vila Velha

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Ofegante, entrou na Vila Velha.  Essa  dormia embalada pela madrugada que seguia seu curso. Todas as construções datavam da época da ferrovia, século 19, e serviram de moradia para os operários, quase todos imigrantes europeus: feitas de madeira,  varandas e paredes  na cor vinho.

Vaga luz mercúrio,  alguns postes seculares, clareava, aqui e acolá. Ruas estreitas, vielas apertadas, becos escuros repletos de  pedras irregulares no calçamento, conhecido como pé-de-moleque. Essas evitavam que as tropas de mulas ou cavalos, carregados de produtos, atolassem nos dias de chuva ou levantassem nuvens de poeira nos dias de sol.

Porém, nada disso a interessava nesse momento.

Único pensamento: chegar à rua central, única levemente larga, que a levaria até o Castelinho. Olhou para o alto, deslumbrando a distância entre ela e a casa do outro século. Reparou que essa mantinha  uma luz acesa. Apenas uma pequena luz acesa indicando que alguém, tal como ela, ainda permanecia acordado.

Inspirou pausadamente. Ganhou  força. Acelerou os passos. - Não tenha medo, Rachel! Não tenha medo! – repetia de si para si, como um mantra, alternando com  respirações pesadas.

Uma sombra rápida entre os troncos de uma árvore. Parou sobressaltada... Minutos depois, aliviada continuou.

Uma rajada de pássaros. Gritou, girando o próprio corpo como se fosse um pião na mão de um menino. Estava confusa, nitidamente, confusa.

Um vago clarão, o coração disparou, porém esse surgiu e desapareceu como o acender e apagar de uma luz.

Seus cabelos, de súbito, se arrepiaram. O medo se instalou e sem perceber  acelerou os passos, deixando sons inconfundíveis ao bater fortemente os sapatos ao chão: Toc-Toc-Toc... Quando se deu conta, estava a correr pela rua em direção à subida que a levaria ao castelinho.

Exaurida, respiração descompassada, chegou ao fim dessa. Olhou a enorme escadaria de pedras rústicas, mal acabadas, mal aparelhadas... Suspirou de forma nervosa. Apertou, novamente, os botões do casaco. Percebeu que da neblina cinzenta, borrões se formavam. Assim, apavorada e sem pensar mais em nada disparou.

A figura fantasmagórica, borrada da neblina, se agigantou, revelando  contornos de uma carroça fantasma puxada por animais deformados; olhos a piscar, narinas flamejantes como bolas de fogo. Soltava uma toada alta, ruidosa como unhas fortes a raspar madeiras. Flutuavam  ao seu lado, pois  não tocavam o chão, mas provocavam um ruído estrondoso como de cascos de cavalos a correr com raiva, disparados, açoitando pedras, o tempo e o vento....

Seu medo era indescritível.

Alguns degraus a separavam do Castelinho,  no alto da colina,  de onde tudo se avistava,  tudo se via.

- Ahhhhhhhhhh!!! – berrou, como que descontrolada, ao sentir um tecido suave, perfumado a roçar-lhe o rosto.

Pés cortados e sangrando. No entanto, não se lembrara de onde perdera os sapatos. De súbito,   voando acima de si:   um ser,  uma figura macabra usando mortalha negra,  enervando-a ainda mais devido a forte respiração que emitia.

Outro barulho, arruaça,  algo se movendo. Que susto! Após, sentiu uma paz interior  ao perceber que era apenas um gato que, distante dali, miava inquieto, seguido de algumas corujas a piar.

- Céus!!! – ciciou, sentindo-se ameaçada.

Ao chegar, passou pelo portão - tão rápida -  como uma rajada de vento - Estava no mais alto ponto da serra. Lá embaixo,  um grande vão, uma grande clareira coberta pela neblina densa, escura. Um acinzentamento confuso de serras e de céu que assombra.

Praticamente, se rastejando, chegou até a porta do Castelinho e a esmurrou

- Dr. Heinz! Dr. Heinz! – berrava - Alguém me ajude! Socorro! Socorro! – em desespero. O chafariz do amplo pátio da entrada, mansamente, jorrava água pelo cântaro de um querubim. O som da água misturou-se com outros toc-toc que não eram mais de seus sapatos. Esses eram  mais lentos, mais secos, mais pesados, mais decididos, mais...

- Oh, meu deus!!! - Dr. Heinz! Dr. Heinz! – esmurrando a porta.

Ao ouvir os sons guturais, unhas,  cascos a arranhar o chão, impregnados com cheiro de corpos em decomposição e pelo fungar raivoso dos animais, soube que, nesse instante, a tal carroça fantasma também chegara ao pátio do Castelinho.

- Meu Deus! – ciciou Rachel. – Meu Deus! – abaixando-se devagarzinho, apoiada na porta, cobrindo o rosto com as mãos.


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O Mistério da NeblinaWhere stories live. Discover now