Tão Perto, Tão Longe

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- Você soube?

- O quê?

- Ele está namorando.

Essa frase foi mais eficaz do que um tiro. Sorri, dei de ombros. A indiferença cuidadosa e calculada era muito minha amiga.

- A fila anda. - respondi, o choro velado na voz, os olhos arregalados, o riso nos lábios, o gelo no estômago.

- Eu só estou dizendo, porque ele vai estar na festa. Não quero que você chegue lá e fique surpresa ao vê-los juntos.

Ela era uma boa amiga, a melhor, mas o sal na ferida ainda doía. Ela sabia disso, sabia que meu sorriso era uma maquiagem cuidadosa.

- Tudo bem. Isso ia acontecer mais cedo ou mais tarde, é inevitável. 

Conhecerem as mesmas pessoas, resultado de terem estudado juntos e, então, trabalharem juntos, por que se apaixonara por ele? Por que ficara com ele? Sabia que era um erro, sempre soubera, mas se perdera no momento que o abraçara a primeira vez, aquele gesto espontâneo de amizade que fizera seu coração sair pela boca.

- Você acha que ele gosta dela? - Perguntei, o agudo da minha voz subiu uma oitava. 

- Acho que não. - Respondeu, sua vez de dar de ombros. Ela desviou o olhar, a janela logo ali. 

Droga, ele gostava de todas. Mais um erro meu, da imbecilidade do meu coração.

- Você vai?

- Claro que vou! E perder a festa da Alice? Encontro você lá às nove!

Ela me olhou como se eu fosse louca, talvez fosse mesmo, ele merecia insensatez.

Meu vestido era curto e acinturado, completado por um casaco de chuva e meias escuras, por conta do frio. Coloquei o lenço que ele me dera, os cabelos presos em um coque alto e elegante para que ficasse bem visível. Era uma provocação, era inapropriado, mas era também um lembrete, estive aqui, ele dizia, ainda estou, eu completava. 

Tirei o casaco na entrada. O som explodia das caixas de som dispostas por todo o salão, duas torres ao lado do DJ, as luzes estroboscópicas piscando, iluminavam o movimento dos corpos dos convidados. Uma mesa decorada gigante com o número 25 em balões metálicos e os garçons circulando com bebida e comida. Alice não fazia uma festa pela metade. 

- Ah! Você chegou! - A voz esganiçada de Alice denunciou que ele também já estava ali. Merda.

- Lógico! - O sorriso fazia minhas bochechas doerem de tão esticado, sem vacilar. 

- Fique à vontade. Estou um pouco atribulada com os convidados chegando, mas juro que falo com você direito em uns minutinhos.

Ela mal terminara de falar e fora roubada por um casal que chegava. A festa estava repleta de rostos conhecidos. Peguei uma bebida. Passar por aquilo sóbria exigiria um duplo esforço, mas teria que ser comedida, saco! O teatro que vivia, precisava de uma dose injusta de lucidez.

Ele a viu. Estava no meio do grupo de capistas, uma garota morena ao seu lado, menor que ela, o cabelo castanho escuro e curto. Meu coração se partiu em mais um pedaço. Ele sorriu. Aquele sorriso quebrado com um furo do lado esquerdo do rosto, que alcançava seus olhos, sempre alcançara. Aquele sorriso que curou pedaços do meu coração uma vez, aquele sorriso filho da mãe que me dissera que ia ficar tudo bem. Aquele sorriso do melhor amigo de todos os tempos. 

Estela ainda não chegara, aquela vaca. Nove horas para ela sempre seriam onze. Ignorá-lo seria pior. Respirei o mais fundo que podia sem dar na cara que estava respirando fundo e dei aqueles dez passos no meu salto de doze centímetros, desviando-me de um punhado de convidados em suas roupas extravagantes. Segura como sempre, embora minha mente estivesse ainda pegando os cacos do meu coração e da minha auto estima, deixados dez passos para trás.

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⏰ Last updated: Dec 25, 2017 ⏰

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