Amiga

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Meus pés estão em carne viva.
Depois de uma hora caminhando, estou quase chegando no apartamento de Agnes. Rezo a Deus que ela esteja em casa.

Minha bolsa ficou com ela e nenhum taxista quis me trazer. Todos diziam que eu era uma bêbada e não deixavam entrar no carro pois eu iria sujar de sangue.
A solução foi jogar o salto fora, cortar o vestido longo e caminhar até o apartamento. E cá estou eu. Destruída, mas consegui.

Meu corpo todo dói.
Minha alma dói.

_Meu Deus do céu! - Agnes fica branca ao me ver e vem correndo me ajudar.

_Só preciso tomar um banho e dormir por dois dias.

_Eu mato ele! Vou ligar para Polícia...

_Não! Por favor amiga, só me ajuda no banho. - Não tenho cabeça para explicar nada, só quero dormir. Dormir por longos dois dias, ou até mais.

Agnes chora sem saber o que fazer e me ajuda a entrar no apartamento.
Na sala, minhas coisas estão todas encaixotadas. Não tive tempo de arrumar nada, foi tudo tão rápido. Mas foi tudo o certo a se fazer.
Imagina se eu ainda estivesse naquela casa?
Will teria me jogado no olho da rua, com uma mão na frente e outra atrás.

Com muita dificuldade, Agnes me ajuda a tirar o vestido e entrar no chuveiro.
A água morna cai sob meu corpo, e em vez de me limpar, ela dói. Machuca. Queima. Arde. 
Sento no box, pois meus pés doem demais e minha coxa está toda cortada. Os cortes são superficiais, mas doem como se fossem profundos. Bem profundos.

_Só vou tirar o sangue assim por cima. Se eu passar água direto, vai doer muito. 

Agnes é um anjo. 
Me ajuda no banho, pois não tenho forças pra isso.
Um toque de celular vem da sala, mas não é o meu. Nem sei onde ele está.

_Amiga, é seu celular?

_É sim, mas não deve ser nada.

_Vai lá! Eu fico bem aqui. - Ela vai correndo atender, enquanto isso termino de limpar o sangue. 

Começo a pensar em quem teria feito aquilo.
As fotos eram do dia que sai com Agnes, mas as outras eram montagens. Muito bem feitas, alias.
Eu queria ter dinheiro para colocar um detetive atrás de cada um deles, mas minha situação atual não permite.
Cameron.
Kendra.
Lorenzo.
Qual de vocês, que eu vou comer o figado?

Agnes retorna mais nervosa do que foi.
Ela começa a abrir a portas, procurando algo, mas não me olha para dizer algo.

_Tudo bem? - Sorri nervosa e pega uma toalha para mim.

_Sim, sim! Era só cobrança do cartão.

_Dividas? 

_Nada demais! - Me estende a toalha e me ajuda a sair. 

Agnes troca de assunto e decido não pressionar, mas ela tem dividas? 
Ganha bem no trabalho, o ape é do pai dela e o carro está quitado... Será que... Putz!
O Ezequiel.
Ele deve ter cobrado o carro dela, e como ela não tinha dinheiro, deve ter se metido em dividas.
Coitada da minha amiga.  E eu achando que eu estava na pior... Porra! Mas eu to bem pior.

_Vem. - Seguimos até a sala e um cheiro de comida podre invade minhas narinas. 
_Fiz uma sopinha pra gente.

_Quando você fez?

_Ah tava na geladeira, só esquentei. 

Chego perto do fogão e meu estomago embrulha na hora.
A sopa parece mais uma lavagem de porco. Isso deveria estar a mais de meses na geladeira. Agradeço a boa intenção da Arges, mas vou dormir com fome. Deus me livre ter uma intoxicação alimentar agora.   

Ficamos na cama conversando.
Conto a ela sobre as fotos e a nossa briga. Agnes tem a mesma reação que eu, revolta e indignação.
Ele devia acreditar em mim.
Ele devia me ouvir.
Ele devia me proteger. 

_Amiga, amanhã é sua consulta no ginecologista.

_Acho melhor desmarcar. Não posso gastar com nada agora e preciso achar um emprego fixo. 

_Você não vai gastar nada. - Olho sem entender e Agnes abre um sorriso travesso. 
_Marquei no meu nome e a conta vai para a empresa. Simples assim!

_Ai Agnes!!! - Pulo da cama, abraçando-a forte. 
_O que eu faria sem você?

_Pediria moedas no sinaleiro.

_Ou rodaria a bolsinha na rua. - Rimos e choramos ao mesmo tempo.
_Obrigada por tudo!

_Eu que tenho que te agradecer Fabi! - Choramos feito duas crianças emocionadas e logo adormecemos com os raios de sol, entrando na janela. 

-/-

_Oi! Boa tarde. - Antes de ir no médico, passo no prédio da festa e falo com o porteiro. 

_Sim? - Um senhor de meia idade e com uma barriga de cerveja, me recebe com um sorriso simpático. 

_Eu estive no sábado a noite, na festa da Sin's, e eu perdi minha bolsa. Seria possível e senhor verificar as câmeras? - Tive que inventar uma desculpa, pois se eu falasse o verdadeiro motivo ele não olharia. 

_A senhorita trouxe o boletim?

_Ãnn.. que boletim?

_A ocorrência que a policia entrega sobre o desaparecimento de algo. Só assim, que eu posso lhe mostrar. 

Mas que drooooga!
Nem pra mentir direto eu consigo. O jeito é apelar.
Com os olhos cheios de lágrimas e uma cara de mendiga, conto a ele sobre o que realmente aconteceu.
Ele fica comovido, mas diz que não pode mostrar.
Maaaaas, eu sou brasileira, meu amor! E não desisto nunca. Insisto mais um pouco e finalmente consigo convencê-lo. 

Na gravação é possível ver um homem todo de preto entregando a caixa para Kendra. E logo em seguida, passa Lorenzo desmaiado, sendo carregado por dois seguranças. 
A imagem pegou só as costas do homem e não consegui ver seu rosto, mas amanhã eu volto para ver mais um pouquinho. Preciso correr pro médico.

E depois de dez minutos andando, chego no prédio. O prédio é alto, e cada andar tem várias especialidades medicas. 

_Olá! Qual especialidade?

_Ginecologista, tenho horário para agora. - Com cara de poucos amigos, a secretaria ruiva pede a carteira do plano. 

A entrego e fico rezando mentalmente, para ela não desconfiar de nada. 
Agnes é morena e eu loira, ainda bem que a foto da carteira é quando ela era pequena, se não já era. 
Ela digita algo no computador e me devolve sem dizer nada. 
Uffa!

_Quinto andar, com o doutor Falcon. 

Sudo depressa, antes que a ruiva me pergunte algo. Imagina, se ela me pergunta a data de nascimento da Agnes? Mal e mal sei a minha, muito menos a dela.

A porta do consultório está fechada, fico aguardando na sala de espera e mexendo no celular. 
Hoje eu liguei ele, e veio todas a ligações e mensagens do Will.
No sábado, foram mais de trinta ligações e varias mensagens querendo falar comigo. E no domingo ele não mandou mais nada. Ficou em silêncio e hoje, permanece assim.
A porta se abre e uma voz grossa chama meu nome, ou melhor, o nome de Agnes. 

JSUIIIIS!

Que médico é esse?







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