Capítulo 02

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Decidi interromper qualquer tentativa de resposta àquela mensagem intrigante. Refleti sobre a infinidade de histórias que assisti ao longo do tempo, todas elas narrando casos de indivíduos que, habilidosamente, rastreavam informações pessoais na internet, com a intenção de importunar ou amedrontar incautos. Contudo, um sentimento persistente de inquietação me assolou, alimentando minha curiosidade. Quem poderia ser o remetente, e que propósito oculto o movia?

Julguei, a princípio, que fosse apenas um jovem desocupado, alguém que desperdiçava suas horas diante das telas, procurando diversão à custa dos outros. Porém, tal pensamento não afugentou a ansiedade que me dominava naquele instante.

Com o desejo de retomar a tranquilidade, retornei à cama, ansiando por uma boa noite de sono, embora a rotina escolar já pairasse sobre o amanhecer. O sono, no entanto, teimava em fugir de meus olhos, pois a cada despertar noturno, minha mente voltava àquela pergunta não respondida: "Quem é você?".

Cada vez que conferia o celular, minhas esperanças se renovavam, apesar do medo que a incerteza me causava. A mensagem permanecia apenas visualizada, como um enigma intocado, cuja solução permanecia inalcançável, deixando-me em um estado de crescente expectativa e apreensão.

Os raios solares me acolheu com um corpo estranhamente exausto, uma fadiga que me envolvia como o tremor deixado após a passagem incessante de inúmeras locomotivas. Eu amaldiçoava a mensagem, pois raramente experimentara noites inquietas. Minha vida, até então, tinha sido marcada por uma monotonia entediante; dezesseis anos de existência sem nada notável que me causasse inquietação.

Na verdade, a única salvação da minha inércia emocional residia nos meus domingos mensais, quando eu me aventurava na feira de livros. A ausência de um romance cativante, de páginas que me transportassem para mundos inexplorados, era a única causa de ansiedade que realmente me afetava.


Acomodei-me na beira da cama, atraindo o celular mais uma vez para minhas mãos inquietas, ansiando por um sinal de resposta daquela pessoa enigmática. Mas, como era de se esperar, apenas minha última mensagem permanecia visível. Um suspiro resignado escapou de meus lábios, e eu sussurrei para mim mesma: "Esqueça essa tolice, Melissa. Concentre-se na escola, afinal, é o caminho para uma carreira promissora como médica."

Com essa determinação em mente, dispensei o celular de lado e iniciei minha rotina de preparação para o colégio. Vesti o uniforme de sempre, agradecendo silenciosamente por o colégio ser equipado com ar-condicionado, o que evitava um desconforto adicional no clima quente da manhã.

Após me arrumar, desci para tomar o café da manhã com meus pais e meu irmão Jack, um garotinho de seis anos que parecia inesgotável em sua tagarelice. Ele narrava com entusiasmo as peripécias do dia anterior na escola, inclusive o incidente um tanto desagradável de uma menina que vomitara na sala de aula. Minha mãe o repreendeu, lembrando-o de que a hora das refeições não era o momento apropriado para falar de "coisas nojentas". Sorri, apreciando a espontaneidade dele, mesmo tão jovem. Jack irradiava uma liberdade que eu, com minha ansiedade crônica, raramente conseguia alcançar. Ele fazia amigos com facilidade, enquanto eu, reclusa, enfrentava o tormento de interações sociais. Eu destacava-me nas matérias acadêmicas, desde matemática e física até literatura e química, até mesmo o francês, mas a oratória era meu ponto fraco. Sempre que se tratava de apresentações em público, eu orquestrava manobras para evitar a exposição direta, justificando-me perante os professores. Minha nota nessa matéria era a mais baixa, embora não tivesse consequências significativas. Essa era a faceta silenciosa e introvertida da minha vida, onde as palavras eram mais confiáveis no papel do que nos lábios.

Seguindo meu costume diário, entrei no carro e dirigi até a escola. Ao chegar, estacionei o veículo no mesmo lugar de sempre e adentrei o edifício, com meus fones de ouvido trazendo o aconchego do silêncio, isolando-me do burburinho dos colegas pelos corredores. Com a cabeça baixa, atravessava o corredor, absorta na melodia da canção "Let Her Go" do Passenger.

Do Desprezo ao EncantoOnde histórias criam vida. Descubra agora