Capítulo 10 - E con miei occhi ho visto tanta vita

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Uma vez, li um livro no qual o personagem principal resolvia levar a pé uma carta a uma amiga, atravessando toda a Grã-Bretanha. Ele deixava pra trás um bocado de dor e caminhava todos os dias com o objetivo de se conhecer melhor. Na época, achei bobo. Agora, fazia todo sentido.

Do aeroporto de Heathrow, peguei um trem para o centro. Eu não tinha roteiro fixo, mas queria visitar o máximo de lugares que pudesse. Comecei pelos pontos turísticos conhecidos de Londres, como a London Eye, o Big Ben, os palácios, o Tâmisa, o Museu de História Natural e seus jardins. Depois, tirei a foto clássica na Abbey Road e passeei também por lugares mais pitorescos, como pequenas livrarias e cafés, mercados municipais, shows ao ar livre.

No quinto dia, em Cardiff, liguei, mas não ele não atendeu. Segui com o passeio no castelo: uma mistura de ruínas e construções que faziam viajar de volta ao século I. Experimentei um prato indiano e, quando já me preparava para dormir, o telefone tocou.

- Ciao, bambina! Vi agora que você ligou. Como está a viagem?

- Está bem legal. Já tirei muitas fotos do passeio, depois te mostro. E por aí?

- Aqui está tudo tranquilo. Tem alguém que quer dar um oi.

Ele virou o telefone para a gata. Falei com ela um pouco: ela me respondeu com um miado e depois se deitou no sofá.

- Ela está com saudades. Fica boa parte do dia deitada ali.

- Normalmente eu deito naquele lugar à noite e deixo ela ficar na minha barriga. E você? Como está? E a Fran?

- Te mandou um beijo.

- Manda um pra ela também.

- Mi manchi.

- Aposto que só está sentindo falta do vinho.

Ele riu e me mostrou a taça. Eu sorri de volta, com o coração doendo de saudade.

- Preciso desligar, acordo cedo.

- Posso te ligar amanhã?

- Não sei como vai ser o dia. Eu te ligo, pode ser?

- Claro. Beijo, então.

Na manhã seguinte, peguei o trem às 5 da madrugada. Em Cambridge, andei pela universidade onde se formaram Lorde Byron e Sylvia Plath. Em Liverpool, comi o tradicional fish and chips no Cavern Club, passeio obrigatório para uma fã de Beatles, e visitei alguns museus. Também assisti a um jogo de futebol no estádio. Os dias acabavam rápido e eu tinha certeza de que não conheceria nem metade do que gostaria.

Já no meio da segunda semana, liguei de novo. Tomei um susto quando Francesca atendeu. Conversamos animadamente, depois ela passou o telefone para Ignazio. Ele parecia feliz, então tentei ficar feliz por isso. Liguei mais algumas vezes para saber de Ornella, mas sempre dava alguma desculpa e a conversa não se estendia.

Na terceira semana, cheguei à Escócia. De todas as paisagens do Reino Unido, as falésias escocesas eram as mais encantadoras. Obviamente fui visitar o famoso lago Ness, onde me diverti durante uma hora tentando capturar uma foto de Nessie. Visitei também as ruínas do castelo de Edimburgo e andei no Jacobite Steam Train, conhecido por ser o trem de Hogwarts. A última parte da jornada foi a Irlanda, onde experimentei a celebrada cerveja escura. De lá, voltei para Londres e depois para a rotina.

Disse uma amiga uma vez que a gente só conhece de verdade uma cidade quando visita a sorveteria dela. Ampliei um pouquinho essa máxima e conheci realmente as cidades que visitei, através de seus bares e restaurantes. É claro que, com o meu orçamento, não dava pra esbanjar todo dia, mas fiz questão de conhecer alguns lugares famosos, experimentar comidas típicas, tomar as bebidas locais.

Em todos os países, me hospedei nas pensões mais baratas, só pra ter um lugar onde dormir e tomar banho. Isso me possibilitou conhecer pessoas do mundo todo, algumas bem legais, como a Aiko, do Japão, e o Noah, da Suíça alemã. Os nomes, as línguas, os contatos das minhas redes sociais iam aumentando a cada cidade. E a minha alma se sentia aquecida por ter essa oportunidade.

Então, ao fim das três semanas, eu tinha certeza de que tinha deixado pra trás aquele sentimento confuso. Ignazio namorava Francesca e estávamos todos bem com isso.

O VizinhoOnde histórias criam vida. Descubra agora