𝐢𝐢 | 𝐩𝐫𝐨𝐥𝐨𝐠𝐮𝐞

2.9K 124 32
                                    

𝐑𝐄𝐁𝐄𝐂𝐂𝐀 𝐁𝐀𝐂𝐂𝐇𝐈

Branco. Tudo se resumia a essa cor. Branco gelo. Eu evitava olhar para os lados, então admirava o teto de gesso como a obra de arte mais perfeita da terra.

— Você pode começar a falar. – A mulher chamou minha atenção.

Respirei fundo e engoli em seco. Nos últimos meses, as minhas dificuldades se limitavam a expressar-se. Não queria falar sobre mim. Não queria chorar. Não queria sentir. Mas principalmente, não queria amar.

Dizem que nós temos somente 5 pontos de dor no nosso corpo. Por exemplo, depois do quinto tiro ou da quinta facada você não sente mais nada. Eu acho que ele foi meu número 5, depois dele não consegui sentir mais dor, nem amor.

— Meu nome é Rebecca Rizzi Bachi. – Depois de longos minutos finalmente consegui falar. — Eu tenho 19 anos. Sou filha adotiva de Rosmari e Adenor, o Tite da seleção brasileira.

Era incrível como falar dos meus pais me transmitia uma calma inigualável. Toda essa calmaria se dissipou com o próximo questionamento de Maisie.

— E seus pais verdadeiros? Você não pensa em conhecê-los?

Engoli em seco novamente. Eu não tinha rancor da mulher que me colocou no mundo, ela me deu a chance de ter a melhor família que eu poderia.

— Eu vou fazer isso assim que retornar ao Brasil. Vou procurar a minha progenitora, tenho certeza que ela teve seus motivos. – Respirei fundo.

Meus olhos ainda encaravam o teto branco.

— Você não está pronta para voltar ao Brasil. – Ela afirma.

— É claro que estou, Maisie! – Protestei.

— É o que veremos. – Posso identificar o deboche em seu tom de voz. — Qual o motivo que fez você vir para Vancouver?

— Um intercâmbio, eu precisava exercitar meu inglês. – Uma risadinha escapou pelos meus lábios na tentativa de transparecer calma.

— E o motivo emocional? – Não precisei encarar a mulher para saber que ela estava arqueando a sobrancelha.

Fechei os olhos.

Tudo era escuridão. Angústia. Tudo se resumia a cor negra, a cor associada as trevas. Porque afinal, não era isso que ele foi em minha vida?

Respirei fundo pela milésima vez naquele dia, apertei minhas unhas tão forte na palma da mão que senti sangrar. Está tudo bem. Você já superou. Eu repetia essas frases inúmeras vezes, como se o meu subconsciente fosse tomar como verdade.

— Eu me apaixonei... – Fiz longa pausa. — Me apaixonei por um homem casado. Eu fui uma tola por ter me entregado até a alma a ele. Eu odeio o estrago que isso causou, agora as coisas estão mais bagunçadas do que nunca estiveram. Eu já nem choro mais pela ausência dele, em mim agora só existe indignação, raiva, rancor. Coisas que eu sempre me gabei por não me deixar sentir, hoje não consigo evitar. O resultado disso é uma catástrofe emocional, eu não sei quando vou me doar à alguém dessa forma outra vez, se é que isso vá um dia acontecer. E ele, parece que nem percebeu o tamanho do estrago que deixou para trás, o tipo de buraco negro que deixou no meu peito. E tudo isso é culpa dele, eu me tornei um ser humano sem capacidade de sentir porque em nossa relação ele sequer permitiu se deixar sentir e só fingiu. Fingiu o tempo todo. E não foi capaz de notar que eu estava amando-o. Aquele canalha quebrou meu coração, destruiu as coisas boas que ali estavam e não sei se consigo mais achá-las.

𝐈𝐍𝐒𝐄𝐂𝐔𝐑𝐈𝐓𝐘 ★ 𝐏. 𝐂𝐎𝐔𝐓𝐈𝐍𝐇𝐎Onde as histórias ganham vida. Descobre agora