Valsa dos flocos de neve.

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Olá, pessoal!

Ah, essa é a minha primeira fanfic TouyaxYukito e eu tô super animada AHSUAHAUAHUA Ela é presente de amigo secreto para a @guardiangel, do Otaconda, e eu espero que ela goste bastante! Ficou pequenininho mas juro que foi do core, hein? AHSUAHSUAHUAHAUA

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 Neve.

Eu poderia dizer que odeio a neve.

A sensação gostosa de ter visto ontem mesmo flores desabrocharem pela janela de meu quarto fazia-se presente em meu peito desde o momento em que abri meus olhos. Era bom. O cheiro das cerejeiras afaga a pele e o coração, e eu podia jurar que o sentia até ontem, claramente, como perfume em suas narinas quando acaba de ser borrifado contra o corpo. Mas subitamente, em um leve piscar de pálpebras, cada detalhe daquele lugar pareceu mudar mais do que em mil anos e lá estava; a neve tomando conta de cada canto daquela cidade, e por algum motivo, eu não gosto. Sinto-me frio e sem vida. Prefiro mil vezes mais observar as pétalas róseas dançando em meio à brisa amena do que o gelo pintar de branco cada detalhe pouco à pouco. Não há aconchego e eu não vejo sentimento. Tudo se torna tão vago quando o vento gélido invade o peito, e de repente me sinto uma criança de apenas cinco anos de idade imaginando o que de certo eu deveria fazer caso um dia haja a possibilidade desesperadora de toda aquela neve me consumir por completo.

Remexi-me na cama enquanto observava a vista acinzentada afora, sentindo meu corpo tornar-se pedra em cima do colchão como se estivesse a recusar-se em sair dali. Indisposição, é como chamam. Levantar foi-me uma tarefa complicada. Mais difícil ainda me colocar debaixo de um chuveiro com a água queimando minha pele em respingos tão gelados que ardiam como fogo. De maneira súbita, a cama surgira em meio a meus pensamentos bagunçados de uma manhã cansativa, seduzindo-me como em um conto de fadas, onde sereias cantam e homens deixam-se levar pela doce melodia, que não torna-se tão doce assim quando já se veem imersos no oceano. Eu pude ouvir uma canção. Baixinho, lá no fundo de um canto qualquer, quase que sem querer ser ouvida por alguém. Mas eu ouvi. Talvez minha sereia particular ainda estivesse insistindo em me levar para aquele mar de lençóis na cama.

Descer as escadas. Outra tarefa difícil. Uma escadaria quase que sem fim, como se naquela manhã ela houvesse extendido-se de propósito para me dar mais trabalho. O cheiro do café já pairava pelo ar, e quanto mais eu me aproximava, mais o barulho de frigideiras e facas em trabalho tornava-se mais alto. Ao longe, já era possível ter a visão ampla de cada um dos detalhes da sala; os móveis, o retrato de Nadeshiko Kinomoto em sua memória, pois ao menos a sua imagem ali já nos trazia a sensação confortante de tê-la presente. A mesa posta em três lugares. Um deles já estava ocupado por minha irmã mais nova, que acabou por jogar uma colher em minha direção quando decidi cumprimentá-la da forma costumeira: "monstrenga". Ela irritava-se com facilidade e talvez até certo ponto eu agisse como o irmão mais velho insuportável, mas eu a amo. Talvez mamãe não tenha dado o nome dela em vão ou sem um significado plausível. Sakura é definitivamente a flor de cerejeira que decora meus dias mais sombrios, inclusive os de inverno, mesmo que tudo ao meu redor esteja repleto de neve. Da cozinha, meu pai trazia o café da manhã pouco à pouco com um sorriso no rosto. Agaradecemos pela comida, nos acomodamos, comemos. Sakura tinha uma animação sem fim e papai nunca aparentava deixar-se abater por algo. Devo admitir que senti-me extremamente mal com a cena; um pontinho enevoado que, por mais perto que estivesse, sentia-se distante. As risadas dela não me pareciam o suficiente, e nem o sorriso dele. Mamãe na foto ao lado, com os cabelos ondulados e o riso sincero também não parecia melhorar minha confusão interna de pensamentos e emoções. Provavelmente seria o meu mau humor de um inverno insuportável se não fosse a estranha sensação de sentir pesar no peito a ausência de algo que eu não tinha idéia do que fosse. Ainda era frio, ainda era vago. Era branco e sem nada. Não preenchia um milímetro daquele vazio estranho em um peito aparentemente oco.

Sakura saiu junto a mim. Tão animada como um raio de sol em meio à nuvens pesadas, ela afastou-se rodopiando em seus patins coloridos e por um momento, me fez sorrir. Mas não. Um sorriso tão inútil e pequeno que nenhuma diferença me fez, mesmo que eu achasse que para ela havia feito. Sozinho, me vi em meio à uma vasta calçada, tendo de lidar com a ansiedade repentina enchendo meu coração de algo irreconhecível e esvaziando meus pulmões como se eu não necessitasse de fôlego. Era tudo neve, em tons esbraquiçados que me davam incômodo. Frio era como esquecimento, e novamente, me peguei sentindo falta do calor em todos os sentidos possíveis. Era até irônico imaginar o coração estando congelado esperando por uma única fagulha para voltar a bater como o compasso de uma música. Passos. O estatalar distante de sapatos contra a neve rasteira fez ativar quase que instantaneamente o meu radar interno e o rosto voltar-se em sua direção em um aperto ansioso.

Então eu o vi. O andar calmo, leve como uma pluma. O sorriso sereno, assim como seu olhar profundo, que me proporcionava a sensação de que suas orbes claras resguardavam em si um amplo universo, como uma galáxia decorada de estrelas e qualquer coisa que a tornasse consideravelmente bela. Seus fios platinados tornavam-se uma bagunça deslumbrante em meio ao sopro álgido que fazia-se ali, e admirava-me como a cor de seus cabelos entravam em combinosa sintonia com o cenário momentâneo. Ele aproximou-se, carregando em seu semblante a mesma tranquilidade que eu sempre via, mas não possuía como ele. Seus labios desenharam-se em um sorriso sincero, abrindo-se levemente em movimento, em um "bom dia" baixo e calmo, como um sussurro. Talvez eu estivesse prestando atenção demais em seus lábios ou sua face por inteiro, mas era sempre assim.

Quando ele vinha ao longe, meu olhar grudava-se ao dele. Era como o tal canto das sereias em histórias infantis, um canto calado, sem nota alguma, sem nenhuma melodia, mas estava ali. Eu sentia que estava ali. Estava ali junto com a galáxia da cor de seus olhos, estava ali junto com as cores harmoniosas de uma manhã fria, estava ali junto a brisa cortante e os arrepios súbitos de pele, e era tão alta quanto o som de uma guitarra em um show de rock. Ela estava ali, e fez-se mais nítida ainda quando flocos de neve passaram a cair sobre nossas cabeças repentinamente e lentamente, rodopiando ao som de sua sinfonia muda em uma valsa graciosa. Ele ergueu o braço, posicionando ligeiramente a mão acima de meus cabelos negros, em uma tentativa falha - e adorável - de proteger-me do gelo despencando daquele céu cinzento. Seu suspiro fora alto o bastante para que eu o ouvisse com clareza, e seu silêncio demorado, como se estivesse a pensar atenciosamente em suas próximas palavras ou ações. Eu não ousei lhe atrapalhar naquele momento. Aliás, não ousei e muito menos quis desviar os olhos daquelas estrelas imaginárias em suas orbes, tão brilhantes quanto a própria lua em meio ao breu do céu. O concerto sem som de violinos, flautas e pianos ainda estava ali. Senti-me até sortudo em ter a vaga noção de que eu era o único de todo o mundo à poder desfrutar dessa melodia única.

- Eu sinto muito por isso, Touya... - Disse-me em tom ameno. - Eu sei que odeia o inverno.

- E você está certo. Mas...

- Mas...?

Mas agora os flocos de neve parecem dançar como as flores de cerejeira na primavera, Yukito, e eu te juro que vi a invernia decorar-se em pétalas, como a aquarela colore o vazio existente no branco de uma folha de papel.

Waltz of SnowflakesWhere stories live. Discover now