Capítulo 15

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Cheguei na loja, me passei por um cliente, fui relativamente bem atendida, vi alguns defeitos pontuais como cliente, mas nada que não possa ser esclarecido com um bom treinamento, venho pensando nisso há algum tempo, fazer uma reciclagem de vendedores e caixas, os números desta loja estavam em ordem, minhas únicas queixas foram pelo atendimento mesmo, após o almoço do segundo dia eu já estava me arrumando pra ir a rodoviária pegar o ônibus, mas São Pedro não quis colaborar, choveu muito, mas tanto que alagou boa parte da cidade, estava impossível ir pra qualquer lugar desta maneira, com sorte consegui enviar uma mensagem de voz pro Rodrigo antes da energia acabar e a bateria do meu celular ir pro buraco.

Ficar no quarto sem ter absolutamente nada pra fazer com todo aquele som de chuva me deixava paranoica, fui pro saguão do hotel pra tentar ficar mais uma noite, já que não teria como ir embora, dei sorte e pude ficar, tinha algumas janelas enormes e portas de vidro no saguão que davam pra uma avenida movimentada, por sorte aquela região não tinha sido alagada, mas chovia muito, a agua escorria pelos vidros como cachoeiras, tinha alguns jornais e revistas velhos em uma pilha ao lado da poltrona, vi que no meio tinha um gibi da turma da Monica, quem nunca leu um desses? Fui pegá-lo e junto caiu um jornal da região de uns dois meses atrás, na capa falando sobre a tentativa de estupro de uma menina da cidade, entrei em choque mas precisava ler, de certa forma depois que comecei o tratamento me ajuda ver que não fui a única, e principalmente que posso estender a mão a mais alguém, ajudar contando minha historia, mas ainda não fui tão longe, comecei a ler, uma menina de quinze anos iniciais........ Relata que um vizinho a raptou no meio da tarde, a prendeu no banheiro, arrancou suas roupas, mas ela conseguiu fugir assim que pode, saiu correndo na rua gritando por socorro e acusando o homem, este o acusado – espera esse nome... e abaixo a foto, ele está visivelmente mais velho, beira os sessenta anos, mas é ele mesmo, ele nunca parou então? Continuo lendo, ele foi morto pelos familiares da menina. Pego o jornal e levo pro meu quarto, preciso ficar sozinha. Ele não parou, quantas vítimas esse maníaco fez? Antes e depois de mim também. Choro por todas essas meninas que assim como eu ele violentou da pior forma possível, mas apesar da dor me sinto livre ao saber que o meu algoz está morto, ele morreu enquanto eu renascia pra vida, uma coincidência do destino. Assim que a energia elétrica volta, busco no meu celular mais informações, no jornal não falava nada a respeito da mulher, mas em outros descobri que ele já era viúvo, será que ela soube? Se era cúmplice? A essa hora não me importa mais, guardo o jornal na mala, ligo pro Rodrigo avisando que apenas pela manhã vou poder ir embora, ainda está chovendo muito e é perigoso, dormi apenas duas noites com ele e agora estando sem dormir está me matando, ele me acostumou mal, estou ficando mimada agora.

Estou no ônibus de volta pra casa, agora sim posso dizer casa com todas as letras, é pra lá que quero voltar todos os dias, avisei o Rodrigo que estaria chegando, mas alguma coisa aconteceu, ele não pode ir me buscar, voltei de taxi mesmo, ao entrar em casa em plena quarta feira dou de cara com os meus quatro homens, quero dizer, o meu homem, meus dois amigos, e pra minha maior surpresa, meu irmão, ele morava muito longe, trabalhava em uma companhia aérea em outro estado, era quase impossível ele vir pra cá, matei a saudade de todos, apertei meu irmão em um abraço que não sentia a quase dois anos, o do Rodrigo foi especial, pois começamos um beijo, paramos pra nos abraçar, beijei seu pescoço e voltei com um selinho lento, esqueci completamente que tinham outras três pessoas em volta e uma delas sendo a purpurina

- Que casal mais lindo, sou madrinha na igreja, no cartório e até dos filhos – Me escondi de vergonha nessa hora mas tudo bem, fomos almoçar e os meninos aproveitaram pra fazer o pedido, eles iriam se casar, mas como a família do Dê era contra qualquer relacionamento gay que ele tinha então ele nem se deu o trabalho de convidar alguém, o Edu já não tinha mais os pais, então como o cartório exige apenas duas testemunhas para o casamento seriam apenas nós quatro, depois iríamos pra qualquer lugar comemorar e os meninos iriam para a lua de mel em um cruzeiro aqui pela costa brasileira, uruguaia e argentina, fiquei muito feliz por eles e aceitamos logo, na hora nem pensei que eu ficaria tanto tempo sem meu chefe, o chumbo seria dobrado na empresa mas eu daria um jeito, não iria estragar a felicidade dele por tão pouco.

Eles foram embora e ficamos apenas nós três, o Guto meu irmão tinha chego ontem, mas com meu atraso ficou mais um dia, o Rodrigo disse tudo a ele, do meu surto, do tratamento, de que eu havia contado a ele quem era o meu agressor, nesta hora ele ligou os pontos, mesmo morando fora ele sempre soube o que estava acontecendo pelo bairro, a namorada dele era nossa vizinha e havia comentado que esse cara era estranho, me pediu desculpas pois depois do acidente dele ele nunca mais teve coragem de falar disso comigo, mesmo sabendo que eu precisava de ajuda, mas a cada dia que eu "parecia mais forte" ele tinha menos coragem, até que o tempo passou e ele se calou pra sempre, nessa hora me lembrei de um peso que estava em minha mala, entreguei o jornal pros dois, disse que era ele apenas, vi a raiva emanando dos dois homens, não tive medo pois sabia que era o lado protetor deles falando mais alto, mas eu disse que agora eu estava bem, que esse passado está superado e enterrado, não que tenha sido fácil, mas sinto que praticamente me curei ao entender que não tive culpa, não que eu tenha perdoado esse monstro, mas me perdoei e foi libertador.

O Guto jantou conosco e foi pra casa dos meus pais, ele conseguiu apenas uma semana de folga e por isso queria aproveitar ao máximo e ver a todos, prometeu contar aos nossos pais que agora estou namorando – embora até este momento eu não esteja, mas não questionei nada – e que assim que possível iriamos pra lá.

Imprevisível destinoWhere stories live. Discover now