Capítulo 11

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Ele tenta claramente mudar de assunto. Por um momento, penso em insistir para que ele me conte mais de seu romance literalmente impossível nos termos que me foram apresentados, mas a minha vida e a oportunidade que eu tenho para escapar daqui o quanto antes é imensamente mais importante do que seus namoros frustrados.

A claridade do dispositivo me cega um pouco, mas posso ver que há notificações de curtidas nas fotos de minhas redes sociais, e que me marcaram no maldito vídeo de Lucy e Louis mais uma vez. Só recebi duas mensagens. Uma da operadora, oferecendo o seu mais novo plano, e outra da vendedora do meu sapato dos sonhos. Uma boa e uma má notícia.

A boa é que o meu sapato chegou sim na loja, e a má é que ela não conseguiu guardar o meu par, já que a venda foi um sucesso. Ela se desculpou, e disse que não sabe se conseguirá um par para mim, já que está muito concorrido. Já havia pedido que guardasse um par para mim logo quando a marca anunciou a coleção. Não vou responder agora.

Não sei o que fez com que meu celular recebesse sinal. Sinal divino ou apenas ação do satélite, não vou perder essa oportunidade. Também não sei se Louis está apenas brincando, mas já passou dos limites.

Não quero mais ficar aqui. Nunca quis, na verdade. Quero minha cama, quero minha casa, quero comer, e comer algo que não faça parte de alguma dieta que vi nas revistas. Talvez seja alguma peça do destino para fazer com que eu dê mais valor às minhas coisas, e se for isso mesmo, pode ter certeza de que já aprendi esta lição nesta noite. Já fiquei muito tempo neste local. Vou ligar para meu pai.

Já passou da meia noite, mas hoje é quarta-feira e ele está de plantão no trabalho. Está acordado, alerta a qualquer problema e possui uma viatura a seu dispor. Em meia hora, posso estar deitada em minha cama, de estômago cheio e coberta pelo meu edredom favorito.

Disco o número. Ouço um barulho atrás de minha pessoa e me viro minimamente, vendo Harry por entre os fios do meu cabelo avermelhado. O telefone começa a chamar e meu coração bate mais forte.

— Ele não vai te atender — o rapaz fala, como se isso fosse uma coisa óbvia.

Sua voz soou tão segura de sua afirmação que seria mentira caso eu dissesse que não me abalou. Sei que tem essa possibilidade, mas não é possível que ela ocorra justamente agora, quando mais preciso.

— É claro que ele vai — respondo, com o celular no ouvido. — É quarta-feira, ele tem que atender.

— Por quê?

— Ele trabalha. Nunca faltou e não é agora que ele faltaria. — minhas mãos começam a suar, com esperança.

Mas essa expectativa não é correspondida. Minha ligação é recebida por uma voz robótica e é direcionada para a caixa de mensagens.

Verifico a informação na tela do celular para ter certeza. Olho para trás, e me viro, sentando de um jeito que possa observá-lo enquanto faço a ligação. Disco novamente o número de meu pai.

— E se ele não tiver plantão algum nas quartas? — Harry joga a hipótese para mim.

— É claro que ele trabalha, todas as quartas ele vai até a delegacia e volta só pela manhã seguinte.

Ponho meu celular no ouvido novamente, mas o destino da chamada é o mesmo que o da anterior. O celular dele não atende às minhas ligações.

— Ele... Ele não me atende.

Ele recebeu minha ligação, ignorou. Será que fez o mesmo com a segunda ligação? Sua falta de vontade em falar comigo é tanta assim? Não é possível, deve ter sido outra pessoa. Devo ter discado para o número errado, apenas.

Mas também não era possível que Louis me trancasse aqui, dentro de um lugar totalmente escuro e desconhecido, mas aqui estou eu.

— Quando disse que ele poderia transar com a sua amiguinha babá, não falei aquilo aleatoriamente.

Seus braços estão jogados ao longo de seu corpo, e na mão direita dele estão os papeis que ele encontrou por acaso na caixa rosa-bebê e o deixou sem resposta.

Já estou ficando psicologicamente exausta. Meu corpo já não aguenta mais depois daquela queda.

— Você vai querer ofender meu pai e ela de novo? — pergunto, sem animação alguma. Não quero ter mais uma discussão fervorosa esta noite, minha cabeça de certo explodiria.

— Ele não trabalha hoje à noite. A não ser que ele esteja se prostituindo e vá fazer seu trabalho na casa de uma mulher quarentona que nem ele.

— Ele não conhece nenhuma mulher da idade dele. — afirmo. Conheço muito bem o círculo quase nulo de amizades dele. Há apenas os colegas de seu trabalho, e alguns pais dos amigos escolares do meu irmão.

— Ah, claro. Na semana passada foi uma mulher com metade da idade dele — provoca.

Não. Meu pai não é capaz de mentir para mim a respeito de seu trabalho. Ele não pagaria uma babá a toa e muito menos abriria mão de ver minha peça na escola apenas para transar.

Lembrar-me daquele dia ainda dói um pouco. Dobrei minha carga horária na escola e treinei durante meses, me lembro das falas até hoje. Julieta, de Shakespeare. Fui a personagem principal, disputei com algumas colegas que já faziam teatro há anos. Peça clichê em escolas, sim, meu pai até poderia ter encenado-a em algum momento enquanto frequentava o ensino médio, mas não deixa de ser interessante. Principalmente porque é a sua filha que estará lá no palco e será aplaudida por todos os que estão na plateia.

A professora me parabenizou pela atuação, disse que atuo muito bem e poderia ter futuro nesta área, mas não foi o que me pareceu quando eu não consegui esconder do meu pai os traços de tristeza em meu rosto.

Esperei, mas ele nunca chegou ao teatro de minha escola. Quando chegou em casa, pediu desculpas. Aceitei, e disse que estava tudo bem. Não é como se tivesse outro modo de agir, e mesmo se tivesse alternativa, essa permaneceria sendo a minha escolha.

— Ele não faz isso — nego. Preciso descartar essa hipótese, e não deixar que ela crie raízes em minha cabeça.

Ele fez uma promessa à minha mãe. Meu pai prometeu que aproveitaria tudo em nossas vidas, já que ela não teria a oportunidade para fazê-lo. Meu irmão ficaria tão decepcionado caso tal promessa fosse quebrada...

Meu pai tem bom senso de sobra, e não trocaria por nada, além de seu trabalho, o orgulho de ver o filho mais novo recebendo o prêmio de primeiro lugar com um projeto genial na disputada feira de ciências de sua escola.

Posso não ser a melhor irmã do mundo, mas estava lá, de pé e aplaudindo-o, sem me importar com quem Louis poderia estar me traindo naquele mesmo instante.

Eu apoio Tom do mesmo jeito que eu queria ser apoiada, mesmo que eu não consiga fazer isso exatamente como sonhei. Tenho pena dele às vezes. Talvez ele nem se lembre do rosto da nossa mãe, e com certeza não se reconhecerá nas fotos que temos dela. Nem eu me reconheço nelas.

Meu corpo não é mais o mesmo. Meu estilo também não. Meu cabelo aparenta ter se tornado um pouco mais escuro com o tempo, e minha personalidade foi o que mais mudou. Eu não era tão indiferente assim. Tão muda e sem opinião.

Ela não teria orgulho de mim.

— Lamento, mas é com isso que senhor Jensen ocupa esse horário — conclui o assunto.

Mas não. Esse assunto não vai ser encerrado por aqui. Minha mãe merece a verdade.



EAE MEUS AMORES QUE NÃO DESISTIRAM DE MIM? DORMIRAM BEM? Falei que ia voltar e cá estou. temos mais um capítulo depois deste e, enfim, o epílogo. Estão preparades???? O que acham que está por vir?

com todo o carinho do mundo
gbs

Prisão |H.S.|Where stories live. Discover now