II

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(Essa estória contém figuras e elementos religiosos. O propósito não é ofender ou desmerecer sua religião)

Uma fina linha de luz invadia meu quarto e deixava a atmosfera um pouco menos receptiva. Estava embaixo das cobertas, o som da discussão me deixava ainda mais nervoso do que os ursos de pelúcia que me encaravam, ou até mesmo do armário aberto. O barulho acabou e não sabia o que aconteceu.

Meu pai entrou no quarto. As suas mãos estavam molhadas. Ele disse que ia ficar tudo bem. A mamãe não  falava nada. Ele me tirou do quarto. Fui colocado no carro. Meu pai disse que não poderíamos voltar. Nunca mias vi a mamãe.

Aquela coisa me segurava, enquanto o homem sorria de um jeito estranho. A mancha de sangue em seu rosto pálido.

- Eu não fiz nada ! 

- Isso é o que todos dizem, - Ele respondeu, pegando um pano preto de seu bolso e limpando a mancha de sangue. - É mas fácil falar desse jeito não é ? Ter que ignorar o que fez e conviver sem a culpa. Faça o que tem que ser feito. - Ele olhou para o monstro e acenou.

Aquela coisa envolveu meu pescoço com duas das suas mãos e devagar foi me estrangulando. Aos poucos eu fui perdendo o ar, as mãos cinzas e descascando com alguns vermes roendo a carne e pondo seus ovos. Peguei a faca e enfiei no braço daquela criatura, ela me soltou e recuou, o homem parecia surpreso.

- Tudo bem. - Ele parou aquela coisa. - Eu recomendo que sobreviva até o dia raiar, mas espero que quando conseguir, venha rastejando e implorando que eu lhe mate. Você vai sofrer por tudo que fez e colocou a culpa em outra pessoa. - Ele se aproximou e segurou meu rosto. - É melhor que reze para passar disso tudo vivo. Agora corra, corra como sempre correu por toda a sua vida.

Ele me soltou, e eu sai daquele lugar. Voltei pela mesma porta que entrei, aquela coisa gritou e fui para a porta que aquela mulher entrou, tudo aquilo me enchia da medo e eu não sabia o que fazer, só correr pelo corredor com paredes enferrujadas. Aquela criatura caiu do teto e me agarrou, jogou na parede do lado oposto, meu corpo inteiro foi tomado pela dor aquela obra prima do mal não tinha acabado ainda, aquilo me arrastou até o fim do corredor e me jogou em um daqueles dutos antigos que ligava qualquer cômodo a lavanderia.

Cai em uma poça cheia de partes humanas e não humanas, haviam pedaços de animais frescos e em decomposição. Tripas estavam penduradas por todo o local, pele humana estavam coladas na paredes e costuradas umas as outras, pedaços extensos cobriam aquele local revestindo as paredes. Meu estomago se embrulhou, aquilo era perturbador de mais, o cheiro, o ambiente perturbador, todo aquele lugar.

Com a queda, machuquei não só a perna mas também meu braço. Usei o resto que tinha da minha camisa para pelo menos manter meu braço suspenso, sai daquela sala com dificuldades. As coisas além da porta só fez piorar, aquilo que eu vi me fez vomitar. Corpos estavam por todos os lados, o lugar era mais baixo que o outro em que cai e o sangue chegava nos tornozelos e que aquele pequeno e sufocante lugar me arrepiava, bem no centro havia um tipo de estatua, vários pedaços de troncos estavam costurados fazendo a criatura parecer ter dois metros de altura. Sua cabeça era uma mistura de engrenagens e resíduo do seu cérebro, os olhos eram dois faróis e além disso usava uma coroa de espinhos, tudo parecia decomposto e cheios de lavas. Pela costura escorria os intestinos dos corpos, por fim, em uma mão segurava uma espada velha e corroída pela ferrugem, na outra segurava um balança. Parecia uma imagem horrorosa das estátuas da justiça. 

Caminhei devagar em meio ao sangue e pedaços de corpos,  era difícil ter que suportar tanto aquela cena de coisas se decompondo, tanto aquela criatura. Algo segurou minha perna machucada, gritei de dor e tentei me soltar, um estalo alto como ossos se quebrando ecoou pela sala. Aquela monstruosidade surreal se mexeu e seus olhos estavam fixados em mim, tudo que eu podia era apenas mancar para outro lugar fora de lá.

- Aqueles que se jugando inocente, mas em seu âmago, no seu mal mais interior. - Aquela coisa dizia, parei e olhei diretamente para ela. - É isso que somos, todos nós somos um mal em potencial desenvolvimento. Todas as partículas, das mais pequenas e simples até as mais complexas tem tendências para o mal, a vida é uma própria representação disso, não pedimos para nascer e custamos a aceitar o fato que isso aqui é só passageiro e as ações feitas nesse terreno hostil serão postas na balança do julgamento. - Mais estalos seguidos de ruídos de engrenagens velhas se movendo ressoaram pelo local. - É um crime nascer, um tormento viver e um alivio desesperador morrer. Os seres humanos são criaturas extremamente diferentes, e a existência não passa de uma mera vontade de um louco solitário e maníaco por controle.

Os estalos pararam e os olhos daquela coisa se apagaram, fiquei ali parado, olhando o monstro parado. O medo de tudo aquilo me fazia chorar, me esconder em qualquer lugar e chorar. A porta que eu estava tentando alcançar foi aberta pela mesma mulher que tinha sumido antes do homem de branco. Ela estava com uma camisa menos rasgada e com a barra de ferro em mãos.

- Meu deus, você está bem ? - Ela correu até mim. Mas parou no primeiro degrau quando ela percebeu o mar de sangue do chão. - Tudo bem, vem logo. 

Manquei até perto dela, me apoiei em seu ombro e fui para a outra sala. Ela me fez sentar em uma cadeira, ela me deu uma camisa suja mas pelo menos estava inteira, pegou alguns algodões, esparadrapo e álcool e começou a fazer um curativo improvisado nos meus pulsos e de um jeito improvisado fez uma tala no meu braço e tornozelo. Eu acho que conhecia ela, seus cabelos meio acinzentado sujos e presos em um rabo de cavalo, sua pela morena suja de sangue seco pelo seu rosto, seus olhos escuros não se vinha nada só minha imagem refletida.

- Eu te conheço ? - Perguntei, tentando me distrair com a dor do álcool ou da torção.

- Desculpa, nunca te vi antes. - Ela sorriu de um jeito educado. - Meu nome é Laine Hoffe e não sei o que eu estou fazendo aqui.

- Tudo bem. - Respondi. - Meu nome é Graham Fairve.

Carne brancaWhere stories live. Discover now