Parte IV

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Naqueles últimos dias antes das avaliações, Dora se dedicou aos estudos de forma que não fazia desde o jardim da infância, talvez desde que entrou para a escola no geral. Sentia que havia uma chance de conseguir uma bolsa para faculdade, mesmo que tal chance fosse mínima já era melhor do que qualquer outra oportunidade que a garota já havia tido em vida.

O grupo de reforço e todo apoio que recebia pela parte de Stuart haviam sido um grande incentivo para que Dora não desistisse de seu potencial, mas claro que não foram a única razão para sua dedicação. Tinha orgulho de toda força e iniciativa que havia tido a começar ir por vontade própria naquele grupo de estudo para desajustados como ela, de ser capaz de finalmente pensar que era muito mais que a garota raivosa que todos conheciam. Provavelmente nunca deixaria de ser aquele espírito rebelde, mas almejava por um futuro melhor do que a vida sempre pareceu querer lhe empurrar.

Depois de sair da biblioteca – um sorriso involuntário sempre se formava em seu rosto quando pensava que havia começado a frequentar aquele lugar para ler os livros realmente, não para dormir – Dora esperava que seus amigos a tivessem aguardado enquanto devolvia os livros que havia pegado, mas como uns bastardos filhos da mãe todos haviam dado no pé. Não havia recebido muitas congratulações de sua trupe por sua dedicação nos estudos, no máximo uma que outra piadinha sobre ter se tornado nerd. Ao menos tinha Susan que lhe compreendia, mas naquele dia a garota mais velha havia faltado aula, deixando-a sozinha naquele final de tarde, que deveria ser bem mais animado pela sua folga no trabalho.

Por vezes Dora acreditava gostar mais de sua bicicleta do que das outras pessoas, dias como aquele apenas provavam o seu ponto.

Não queria voltar logo para casa, na realidade sempre tentava ficar o menos tempo possível naquele trailer junto com sua mãe desequilibrada. Sentou-se em um dos bancos do pátio externo, onde geralmente os alunos almoçavam durante o clima quente, acendendo um cigarro enquanto mexia no celular. Provavelmente depois de tragar um, acabaria indo até sua vizinhança e andando sem rumo aos arredores até que se cansasse. Gostava de ficar apenas com a própria companhia às vezes, entrando num estado de introspecção em que refletia sobre si e o mundo ao redor enquanto sentia o vento no rosto e as correias rodando de forma quase rítmica.

– Olá Dora.

A garota praticamente saltou no banco de metal pelo susto, olhando para trás atônita e escondendo de forma inútil o cigarro ainda exalando fumaça atrás de si, assim como fazia ao ser flagrada por um adulto que a levaria a diretoria. Mesmo que fosse somente Stuart.

– Olá menino gênio. – Respondeu meio sem jeito, visto que não esperava encontrar o garoto naquela hora. Mas pelo jaleco dobrado que ele segurava, deduzia que ele havia acabado de sair do clube de química como o belo nerd mané que ele era, e que Dora gostava mesmo assim.

Stuart a encarou com curiosidade nos olhos escuros que pareciam três vezes maiores por causa dos óculos de lente grossa. Tombou a cabeça um pouco para o lado, percebendo a fumaça fina que saía de trás da garota. Dora suspirou levemente irritada, já esperando o mesmo sermão de sempre sobre ser jovem demais pra essas coisas.

– Tem um sobrando? – Ele indagou, fazendo Dora erguer a sobrancelha por surpresa.

– Cigarro?

– É o que você tem, certo? – Stuart disse de forma óbvia, como se referisse aos bolinhos e biscoitos que fazia. Incrédula, Dora riu pela surpresa, pegando um cigarro do maço que tinha no bolso da calça e estendendo ao garoto agora nem tão certinho quanto parecia, sequer precisando oferecer o isqueiro visto que o garoto tinha um próprio (deixando-a ainda mais surpresa). – Obrigado.

Calmaria RebeldeWhere stories live. Discover now