Capítulo XX | A bengala e a cartola

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Depois de uma longa salva de palmas e do fechamento das cortinas, Emmeline deixou o seu assento e preparou-se para sair do teatro. Acompanhada de quatro outras mulheres – a quem havia conhecido na fila de espera– seguiu pelo corredor principal rumo à saída, emocionada e abalada por Otelo e por seu trágico desfecho. Dezenas de pessoas, todas muito bem arrumadas e com ares de burguesia, seguiam na mesma direção, produzindo um vozerio discreto enquanto alguma peça clássica já tocava no ambiente como música de fundo.

Do lado de fora, navegando entre os outros passantes que esperavam por seus coches e veículos mecânicos para levá-los para casa, as cinco mulheres caminhavam tranquilamente na direção da rua. Notando que a temperatura havia caído, calçaram suas luvas e cumprimentaram-se em despedida, apenas para descobrir que todas elas, coincidentemente, no primeiro trecho do caminho precisariam seguir pela mesma direção.

—Estão indo para o centro? – perguntou Emmeline, curiosa.

—Estamos, sim – uma das mulheres, a mais jovem, respondeu rapidamente. – Somos todas primas e estamos na cidade a passeio, viemos visitar um parente.

—Isto é ótimo. Podemos seguir todas juntas, então. Talvez tenham ficado sabendo do que anda acontecendo na cidade, por isto é sempre bom que mulheres evitem andar sem companhia.

—Nós ouvimos algo sobre desaparecimentos de mulheres. Existem rumores de que é um homem de cartola e bengala que está fazendo isto. Ébizarro. Venha, junte-se a nós.

Novamente unindo-se às outras, Emmeline exalou uma expressão de repentina tranquilidade. Perto delas, caminhava de maneira tímida e por vezes interagia com os assuntos que conversavam, mas se mantinha em silêncio durante a maior parte do tempo ao perceber que, com idade mais avançada que a das acompanhantes, pouco entendia dos temas que surgiam de suas vozes animadas. Todas elas habitavam a casa dos vinte e poucos anos, sendo duas delas loiras e duas morenas; bem vestidas e elegantes, mostravam rostos esbranquiçados pelo pó de arroz e lábios tingidos de vermelho vivo, algo que lhes conferia uma aparência vitoriana e um pouco exagerada.

A noite já era tardia e o badalar de um sino, vindo de algum lugar das redondezas, anunciara a chegada da meia-noite. O grupo de mulheres caminhava rapidamente pela calçada, afastando-se do teatro e, consequentemente da parte mais movimentada da cidade. O caminho não era longo, e pouco mais de cinco minutos seria o suficiente para que alcançassem o centro; encontrando com passantes em lapsos cada vez mais longos, as cinco viam-se cada vez mais sozinhas, adentrando em ruas escuras e completamente desprovidas de outros sinais de vida humana. Ao dobrar de mais uma esquina, assim, uma delas parou sem qualquer aviso e fez com que todas as outras se esbarrassem bruscamente.

—O que houve? – perguntou Emmeline, esforçando-se para enxergar adiante.

—Tem um homem parado bem no meio da calçada, a alguns metros de nós.

As outras, curiosas e subitamente assustadas, espiaram adiante e confirmaram a informação: uma figura masculina, usando cartola e bengala, se via parada adiante, parcialmente escondida entre os espaços escuros que separavam um poste de iluminação do outro.

—É o homem da cartola! O que vamos fazer? – perguntou a mulher mais jovem, sussurrando como se buscasse evitar que o homem a ouvisse.

—Pode ser apenas um homem qualquer, mas acho melhor voltarmos – outra respondeu no mesmo tom, os dedos cruzados em aflição.

—Vamos retornar um pouco e tomar outra rota – foi a vez de Emmeline falar. – Conheço outro caminho, um pouco mais longo, mas talvez possamos encontrar mais pessoas indo tambémpara o centro.

In Nomine Patris 3 | Tenebris HibernusOnde histórias criam vida. Descubra agora