PRÓLOGO

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Salem, Massachusetts, 1692.

Gritos. Era isso que eu ouvia. Pela pequena casa, tentava inutilmente correr o mais rápido que podia. Minha respiração soava aguda em meus ouvidos a cada passo, mas não parava. No único quarto da casa, Nancy dormia tão profundamente que me partia o coração.

—Querida acorde! —tentei soar baixo.

—Mamãe, me deixe está cedo ainda. —se mexeu e voltou a dormir.

—Querida, levante não temos muito tempo!

Sem êxito em tentar acordá-la, a puxei derrubando seu corpo no chão.

—Mamãe, me machucou...

—Ande logo criança, eles estão vindo! —falei a interrompendo.

Nancy, me olhou assustada, não entendendo a gravidade da situação.

—Quem?

—Os homens a mando do juiz, vieram nos buscar!

Sem hesitar mais um momento, Nancy, levantou sem se importar com os pés descalços no chão frio. Havíamos, criado a alguns dias um alçapão para emergências como essas, que ficava no fundo da casa perto da lareira. Descemos com cuidado, trazendo somente uma vela junto de nós. Dentro dele a situação não era das melhores, mas possuía uma passagem que ligava nossa casa até o porto de Andover, o vilarejo onde vivíamos.

O medo era ensurdecedor. Eu fingia estar confiante, mas sabia que isso estava começando a transparecer em meu rosto. Havia escutado os homens dizer na vila, perto da casa de Mary Bethanys, que mais tarde naquele dia uma família seria julgada por seus feitos ruins, e que não só seriam punidas com a fogueira, como também haveria esmagamentos por grandes pedras, para absorver melhor seus pecados que os levariam direto ao inferno. Não seria logo eu, que negaria minha natureza. Aprendi com meus antepassados, a me orgulhar de quem sou e aceitar o presente dado pela Deusa.

Quando chegamos ao porto, havia algo errado. Estava completamente calmo e vazio. Está época em especial, além dos pescadores, homens de terras distantes vendiam suas mercadorias sem descansar dia e noite. O lugar parecia surreal.

Ajudei Nancy a sair de dentro da passagem e a abracei com força temendo o que viria a seguir.

—Mamãe, onde estão os pescadores? —sua voz saiu falha.

—Não sei, minha filha.

Andando em direção ao barco, que havia negociado com um dos pescadores alguns dias antes, olhava para todos os lados sem parar. Nancy, foi a primeira a subir segurando um dos remos logo em seguida.

Então, um arrepio tomou conta de minha espinha, fazendo minhas pernas fraquejarem e cair de joelhos. Minha visão escureceu rapidamente, me dando certeza do que aconteceria.

—Mamãe? —gritou Nancy.

Mesmo com a visão ainda meio turva, fui até o barco com as pernas tremendo.

—Filha...

—Elas estão fugindo, peguem a bruxa! -um grito ecoou pelo lugar, então muitos homens começaram a surgir.

Desesperada, comecei a empurrar o barco para longe. Precisava tirar Nancy dali.

—Querida, fuja para o mais longe que puder e não olhe para trás!

—Não irei fazer isso, Mamãe!

Olhei uma última vez para seus olhinhos castanhos. Ela apareceu em minhas visões, momentos antes de tudo começar a desabar. Nancy se tornaria uma grande mulher e teria grandes feitos em nome desta causa e isso me deixava imensamente orgulhosa. Minha pequena bruxa seria o futuro de Salem.

—Faça o feitiço que lhe ensinei para fugir, pelo mar irá demorar muito. Saiba que sempre terei orgulho de você, não importa o que aconteça. Eu te amo, Nancy!

Virei-me e comecei a conjurar um de meus melhores feitiços em direção a eles.

—Está usando seus poderes. O Diabo está em seu corpo, andem logo!

Soltei toda minha energia em cada um ali, labaredas de fogo começaram a surgir. Estavam provando de seu próprio veneno, sentindo como era morrer pela fogueira que havia levado muitos embora. Aquele não seria meu fim, não podia ser. Então, como se tivesse vida própria, as chamas envolveram todos os transformando em cinzas. Porém, mais pessoas começam a surgir.

—Peguem-na! —gritou um deles.

Conjurei novamente um feitiço, mas dessa vez usei o mar ao meu favor. Puxei todos os fios de poder que a água me mandava, então uma grande onda começou a surgir. Embora soubesse, que não deveria estar machucando ninguém, tinha de me proteger de alguma forma. Eles matavam pessoas inocentes, muitas que nem mesmo eram filhas da Deusa. Não se importavam, diziam que aquilo era em nome Dele. Mas, ali perdíamos familiares e amigos. Não deixaria isso passar.

Então, quando a onda estava grande o suficiente para tomar metade da cidade, uma voz surgiu em minha cabeça.

Não faça isso, a Deusa não irá lhe perdoar.

Por um momento, fiquei atordoada não entendendo o que estava acontecendo.

—Quem está falando? —sussurrei.

Filha, sabe quem sou.

—Fand? Deusa Fand? —arregalei os olhos. Fand era a protetora do mar, a Deusa que sempre confiei a minha vida.

—Corram, peguem a bruxa!

Você será castigada, pare imediatamente!

Minha mente, vacilava entre o certo e errado. Deveria eu, esquecer tudo e fugir?

—Deusa, eles a mataram. Eu não posso. —agora lágrimas escorriam pelo rosto sem parar.

Se aceitar, ganhará a próxima vida.

—McKenna Witheridge, abaixe suas mãos e pague pelos seus pecados! —aquela era a voz de John Caringten. O Juiz.

O olhei sentindo toda minha fúria aumentar. Aquele homem destruiu minha família, minha felicidade. Meus poderes haviam chegado no auge, fazendo minhas veias saltarem e queimarem por dentro. O gosto era maravilhoso, fazia me sentir invencível.

Será seu último aviso, McKenna!

—Vamos, Senhorita. Não deixe que o diabo tome conta de sua alma. —ele chegava mais perto.

Seus olhos continuavam iguais, os mesmo olhos azuis que trouxe a destruição. Não daria esse gosto a ele.

—Que seu Deus tenha piedade de sua alma, John Caringten. Pois eu não terei! —gritei.

Em um movimento, me virei fazendo a onda se abaixar e bater na costa do porto. Muitos ali esperavam ser engolidos, mas o efeito foi justamente o contrário, ela voltou para o lugar de onde veio, deixando todos atônitos.

Então, fechei os olhos e respirei fundo e em um ato de coragem pulei no mar. O impacto da água batendo em meu corpo era agonizante, mas já não importava mais.

Porém John Caringten, não satisfeito, pulou atrás nadando com dificuldade.

—McKenna... eu irei queimar cada... pedaço de seu corpo! —sua voz saia falha por conta da água.

Ondas furiosas batiam em seu rosto, mas ainda sim, ele não parava de nadar.

—Deusa, por favor! —eu implorava. Não conseguiria mais me salvar a aquela altura. Sentia meus poderes se esgotando.

—Você enganou a todos nós, McKenna!

—Fique longe de mim, John!

Então, atendendo ao meu pedido, uma onda absurdamente forte começou a persegui-lo, com medo tentou fugir, mas ela se jogou contra seu corpo o engolindo, sem chance alguma de se salvar.

Uma pontada de alívio me atravessou, agora precisava somente conjurar um feitiço, com o resto de forças que ainda havia, para sair dali. No entanto, a mesma onda se voltou para cima de mim, vindo cada vez mais rápido. Porém uma luz muito forte surgiu em meio dela, me levando junto. O desespero tomou conta de cada parte de meu corpo, então eu a vi.

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