01. coisa mais linda

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vanessa's point of view

copacabana, 1994.

Passo meus dedos pelas cordas novamente e suspiro de raiva ao não conseguir criar nada de diferente. Faço algum barulho a partir dos acordes ré e sol mas não ouço nada além do som que está me atormentando desde que eu peguei esse violão. Faz algum tempo desde que eu consegui compor uma música sem dificuldade ou sem passar horas batendo a cabeça na parede atrás da melodia perfeita.
Largo o instrumento na cama e vou pra varanda. afinal, eu estou no Rio, não é? esses 36°C não vão ser aproveitados devidamente se eu passar mais um dia trancada no quarto. Mal sento na cadeira com o assento de palha e ouço o telefone tocar

- Alô? Senhorita Vanessa? - Reviro os olhos ao reconhecer a voz que está do outro lado da linha.

- Eu já disse que não tenho dinheiro pra pagar o aluguel atrasado, mas logo vou arrumar! Por favor Dantas, você já foi mais compreensivo.

- Tá abusadinha pra quem tá morando de favor, hein? Já te deixei três meses aí de graça, tu é minha amiga mas se não arrumar logo a grana vai pra rua.

- Que grosseria é essa, meu bom? Você conhece o meu pai, sabe que eu sou uma pessoa de bem, caraca o que custa esperar mais um pouco? - respondo já sabendo que a reação não vai ser das boas, Rafael Dantas é meu amigo faz anos mas quando se trata de dinheiro, não tem conversa.

- Se liga, vou te dar mais duas semanas pra me pagar, e chega. Tá achando que vai morar em casinha na beira da praia de graça pra sempre?

- Duas semanas. - digo e coloco o telefone de volta no gancho.

Sento novamente na varanda, olho pro mar e desejo que as águas tragam um baú cheio de dinheiro pra pagar as dívidas, é pedir demais? Tranco a casa e pego meu violão, talvez dar uma passadinha na praia me ajude a pensar no que fazer.
O sol já está se pondo, preparando-se para dar lugar a lua e trazer paz a esse litoral que anda sempre tão cheio, cheio de almas e histórias diferentes que se cruzam numa tentativa de trazer felicidade a vida por um dia. Afinal, quem não se sente feliz na beira do mar com esse clima tropical e toda a habilidade do povo brasileiro de transformar tudo em festa? Talvez alguém que esteja prestes a ser despejado de casa? Ou que esteja vendo a própria carreira ir por pro ralo?
Tudo o que eu precisava era de um pouco de inspiração. Minhas músicas não vendem mais, e todas as gravadoras que eu tentei fechar negócio, desistiram de mim. Tocar bossa nova é a minha vida, coloco nas canções tudo o que eu sinto, mas esse amor me cegou tanto que eu acabei largando o emprego pra investir na vida de cantora, mas meu sucesso não durou muito tempo.

Pego o isqueiro que guardo no meu bolso e acendo um cigarro. Fecho os olhos e desejo a Iemanjá que ela me traga junto com as ondas uma oportunidade de fazer minha vida andar pra frente de novo.
Depois de uns tragos e de sentir um pouco água nos meus pés, me sento e coloco as mãos no meu violão novamente. Quem canta seus males espanta, né? Então lá vamos nós

Por falar em saudade, onde anda você?
Onde anda esses olhos, que a gente não vê?
Onde anda esse corpo, que me deixou morto de tanto prazer?

E por falar em paixão, em razão de viver
Você bem que podia me aparecer
Nesses mesmos lugares
Nas noites, nos bares
Onde anda você?

sucessful (madnessa)Where stories live. Discover now