03.

692 46 6
                                    

Sempre escuto as conversas dos médicos e se me concentrar posso ouvir a das pessoas que estão na sala de espera, mas nenhum som será tão ruim do que o dia em que a senhora que dividia o quarto comigo se foi.

Ela devia ter bem menos da metade da minha idade, e claramente estava bem melhor fisicamente do que eu, mas um dia o monitor multiparâmetro, dela que vivia fazendo barulhos e mostrando sua frequência, decidiu somente seguir uma linha reta... Reta e contínua, com um barulhinho chato que era realmente estressante.

Escutei também o som do enfermeiro que era responsavel por ela desesperado chamando o médico geral. Logo depois um som de vozes abafadas como se várias pessoas curiosas estivessem tentando ver se foi seu ente querido que acabou falecendo.

Senti a mão quente de Joyce, que sentava do lado da maca como acompanhante, segurar a minha mão, sabia que ela estava assustada assistindo aquela cena. Então ela começou, como sempre fazia:...pão nosso de cada dia nos dai hoje, perdoa as nossas ofensas, assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido, e não nos deixeis cair em tentação, mas livrai-nos do mal...

Amém... Eu completei mentalmente mesmo que ela não pudesse me ouvir. Joyce sempre foi bem religiosa, eu somente comecei a ir a igreja depois que a conheci, ela me ensinou muitas coisas.

Pela primeira vez em algum tempo eu comecei a pensar realmente na morte. Imaginei a alma da senhora saindo de seu corpo e vindo se despedir de mim na sala. Não, isso não aconteceu. Qual é o sentimento da morte? A sensação de estar morrendo? Será que a gente sabe?

Me senti curioso e com vontade de saber.

CHEESCAKE • jopper (au)Where stories live. Discover now